Vejo que a gente anda vivendo uma era do “ou”. Ou bem ou mal. Ou preto ou branco. Ou homens ou mulheres. Ou pró ou contra. Isso me lembra muito um poema infantil da poeta Cecília Meireles chamado “Ou isso ou aquilo”. Trazendo alguns exemplos do que vejo e vivencio no dia a dia, temos: ou o empresário é o explorador de recursos, de pessoas, que visa o lucro a qualquer custo, ou é a pessoa empreendedora, visionária, que gera empregos, receita e resiliente, quase um herói.
É o mesmo com o agro: ou é o vilão do clima, que desmata, a pecuária destrói a camada de ozônio com o arroto do boi, ou é o que produz de sol a sol e que segura a balança comercial brasileira. No poema, Cecília dizia: “Quem sobe nos ares não fica no chão, quem fica no chão não sobe nos ares. É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo nos dois lugares!”. Mas por que não?!
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Ouso discordar da Cecília e refletir sobre como podemos transformar isso criando espaço para o “e”. Acredito, vivencio e sou testemunha de que dá para ter um negócio lucrativo e que gere bons resultados para as pessoas e para o planeta, produzindo comida e preservando a natureza.
Existem muitas empresas que realmente se dedicam a gerar soluções que melhorem a vida as pessoas, que geram empregos dignos, distribuem renda e que enxergam muito além do lucro. Digo além porque, sim, o lucro é necessário. É o que viabiliza fazer tudo isso. Não precisa ser ou. Pode ser lucro e impacto sócio-ambiental positivo. Assim como existe um histórico de desmatamento associado à produção agropecuária.
Existe desmatamento ainda hoje e tem boi em área desmatada. Mas não se pode dizer que que se desmata para produzir boi. Isso não é mais a verdade de hoje. Ninguém precisa derrubar floresta para produzir mais, não com as tecnologias que temos hoje. Em 20 anos, o Brasil reduziu em 15% a área de pastagem, enquanto aumentou em mais de 25% a produtividade de arrobas por hectare na pecuária. Esse é um exemplo do “E”. Não é “OU” produzir “OU” preservar.
Nossa comida é feita com mais da metade do território do país preservado e cada vez produzindo mais por hectare, devolvendo para a terra muito do que se usa: em adubo produzido pelo próprio animal, em carbono sequestrado pelos pastos e pelas plantas. Temos também o crescimento de bioinsumos na atividade agrícola, o uso de biodigestores a partir dos resíduos da produção agropecuária – tem quem chame de pré-sal caipira! – entre outros exemplos.
O Brasil tem capacidade e todas as condições para ser a referência para o mundo de agropecuária sustentável, para exportar tecnologias verdes, além do plantio direto e da integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF). De novo, mais um caso de “E”!
Somos todos responsáveis pelo mundo em que vivemos: produtores rurais, empresários e consumidores. É preciso ter consciência de que, em tudo o que fazemos, cada um de nós tem o poder de impactar positiva ou negativamente o mundo e o futuro.
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Escolher a lógica do “ou” e apontar o dedo para o outro – seja uma pessoa, uma empresa, uma categoria, o governo – não vai salvar o planeta e nem fazer uma vida melhor para ninguém. Acredito que, se cada um de nós olhar para o seu próprio dia a dia e entender que sempre podemos fazer diferença do lugar onde estamos, é possível mudar essa lógica para um ganha-ganha.
A começar pelo nosso olhar empático para o outro, de procurar entender e buscar informação real a respeito de um assunto ou um negócio antes de formar uma opinião, sem ficar na superficialidade de (des)informações de mídias sociais, muitas vezes sem fontes confiáveis ou que trazem meias verdades.
As nossas atitudes também contam. Que tal prestar atenção ao que estamos consumindo, com o que nos alimentamos e a que tipo de cadeia produtiva nutrimos com o nosso dinheiro – pois, sim, temos o poder de impactar quando fazemos escolhas mais conscientes no nosso consumo.
Outro exemplo simples e que todos podemos fazer é cuidar do nosso lixo – afinal, produzimos mais de 2 bilhões de toneladas anualmente, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
E uma atitude que é não só importante, mas urgente: reduzir o desperdício de comida – na nossa geladeira, na nossa despensa, na nossa mesa. Porque não faz sentido vivermos em um país que está entre os maiores produtores de alimentos do mundo e ter tanta gente passando fome, enquanto temos um desperdício que poderia cobrir em várias vezes esse déficit.
Isso passa por políticas públicas que demandam atitudes governamentais, por boas práticas na produção e na indústria, e também passa pelo prato de cada um de nós, todos os dias. Fica o convite aqui para que possamos mudar o paradigma do “ou” e colocar mais “e” nas nossas vidas e na nossa atuação no mundo para construirmos, juntos, uma realidade melhor.
* Mariana Soletti Beckheuser é CEO da Beckhauser, indústria de equipamentos para a pecuária. É co-fundadora da Associação Parsifal21 e também conselheira em entidades paranaenses, especialmente as do município de Maringá, voltadas a inovação, desenvolvimento econômico e cidadania empresarial.
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