Não é a primeira vez que a médica veterinária Lilian Roberta Matimoto, de 46 anos, alcança um cargo nunca antes ocupado por uma mulher – ela também foi a primeira mulher a assumir a diretoria da Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP). Mas encarar o desafio de espalhar o que há de melhor da genética bovina brasileira pelo mundo, em nome da Associação Brasileira de Inseminação Artificial (Asbia), é algo novo para ela.
O Brasil, dono de um rebanho de cerca de 200 milhões de bovinos, em pouco mais de duas décadas, tropicalizou a produção de carnes e se tornou o maior exportador global da proteína – e a genética foi um dos vetores. Em 2023, o mercado movimentou 24,5 milhões de doses de sêmen, das quais 19,4 milhões de doses foram produzidas no Brasil. A nova diretora executiva da Asbia chega à entidade com a missão de levar conhecimento sobre a genética brasileira a diferentes partes do Brasil e outros países e fortalecer esse setor da pecuária melhorada.
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Formada pela Universidade Federal de Santa Maria (RS), a conexão com a genética veio no início da sua carreira, quando trabalhou na BRF, uma das maiores do setor de proteína animal e que faz parte da lista Forbes Agro100. “Foi a partir dessa experiência que me encontrei na genética, porque trabalhava no frigorífico e tinha muito contato com a parte de pesquisa em aves. Hoje, entendo a genética como um pilar do agro”, explica.
O caminho foi sem volta. Em 2017, Lilian ingressou na Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP), onde trabalhou por cinco anos. A ANCP começou a nascer no final dos anos 1960, na Faculdade de Medicina da USP, em Ribeirão Preto (SP), e ganhou escala a partir de meados dos anos 1970 com o professor Raysildo Lobo, considerado um dos maiores geneticistas do mundo.
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Foi nessa entidade que Lilian passou a ter um constante contato com pecuaristas de todo o país, encontrando no melhoramento genético um propósito e uma tentativa de melhorar a criação e, consequentemente, a renda dos associados. O divisor de águas veio em 2019.
“A minha crença na genética veio com força quando fiz um trabalho de melhoramento na propriedade de um pequeno criador no interior do Maranhão. A renda da família dele dependia exclusivamente da criação de gado, e com o trabalho genético ele teve um ganho financeiro que foi transformador. E para mim foi transformador ajudá-lo”.
A experiência foi fundamental para Lilian se dedicar ainda mais a espalhar a importância da genética. O cargo de diretora da ANCP veio em maio de 2023 e um ano depois veio o convite da Asbia.
O que é a Saga do Melhoramento Genético Bovino
Agora, parte de seu trabalho é promover in loco a genética e os feitos da Asbia no mundo. Sua primeira missão, logo que tomou posse, foi Argentina, Paraguai e Colômbia. “É preciso fortalecer o nome da Asbia no mercado interno e externo, mostrando as suas contribuições”, diz Lilian. A entidade criada em 1974 reúne empresas nacionais e multinacionais do porte de Cargill, Biogénesis Bagó, Semex, DSM, Alta, MSD, Seleon, ABS e associações de criadores e entidades.
A Asbia divulga mensalmente um index que reúne dados sobre a coleta, importação e exportação de sêmen e botijões, levantados pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA Esalq/USP).
No primeiro trimestre de 2024, o Brasil exportou cerca de 200 mil doses de sêmen, das quais 102,7 mil doses de raças de corte e o restante de gado leiteiro para países da América Latina e Central, do continente Africano e Asiático. No início do ano, a Índia, maior produtor mundial de leite, importou 40 mil doses de sêmen da raça gir leiteiro do Brasil.
Vale registrar que a raça Gir é de origem indiana e que o Brasil importava esses animais até os anos 1960, assim como a raça Nelore. “Temos visto a abertura de mercados que não havíamos pensado, por exemplo, na Índia, cresceu muito, sendo que o Nelore nós trouxemos de lá. Hoje, somos exportadores para eles, justamente porque o trabalho genético feito no Brasil é difícil de ver em outro lugar do mundo”.
Ela dá o exemplo dos avanços da genética tropical do Brasil e a espécie zebuína Nelore como o ouro dessa ferramenta brasileira. “A velocidade do ciclo reprodutivo que temos hoje não se via lá atrás e esse salto foi graças à genética. Essa velocidade do melhoramento do gado no país é algo que vem chamando atenção”, diz.
Lilian lembra que o Brasil conseguiu atender “de forma rápida” a demanda da China de criar um bovino de ciclo curto, o chamado Boi-China, com máximo de quatro dentes incisivos e menos de 30 meses de idade, o que pode significar um bovino de carne mais macia e suculenta. Isso ajudou a impulsionar as exportações de carne brasileira. “A China foi um mercado que veio com força, exigiu uma adaptação e nós respondemos de forma muito rápida como poucos países conseguem”, diz ela.
No ano passado, o Brasil exportou 1,1 milhão de toneladas de carne bovina para o mercado chinês por US$ 5,7 bilhões. “Os avanços da genética brasileira também permitiram evoluções na nutrição, comportamento, seleção e na qualidade e maciez da carne. Nós temos programas de melhoramento genético com cerca de 36 características medidas, de forma que é possível melhorar muitas delas diretamente, como o temperamento do animal”. E o usar o sêmen desses melhoradores é o caminho mais curto.