Fundada em 2017 por Jean-François Déchant, junto com Olivier Goulay e Aymeric Molin, a biotech Elicit Plant, com sede global em Moulins-sur-Tardoire, na França, tem como missão melhorar a resistência das plantas aos estresses,gou especialmente o hídrico, um fenômeno amplificado pelas mudanças climáticas. No Brasil, a biotech iniciou suas operações em 2021, com um aporte que já chegou aos 5 milhões de euros (R$ 31 milhões na cotação atual) em pesquisas para soluções destinadas ao cultivo de cana-de-açúcar. Em março de 2024, ela fechou uma parceria com a Embrapa, também visando a commodity.
A Elicit Plant desenvolveu um tratamento foliar à base de fitoesteróis que, entre outros benefícios, reduz a transpiração das plantas por meio do fechamento parcial dos estômatos e otimiza seu consumo de água, impactando diretamente na resiliência e no rendimento das culturas. Além de Europa e Brasil, a biotech também está nos Estados Unidos e busca acelerar seu desenvolvimento internacional com uma recente captação de 45 milhões de euros (R$ 278 milhões).
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A Forbes França conversou com Jean-François Déchant, que também é o CEO da Elicit Plant. Confira:
Como surgiu o projeto que resultou na criação da biotech?
Sou engenheiro de telecomunicações e passei oito anos no Vale do Silício, onde criei várias startups no campo da cibersegurança. Em 2015, retornei à França como investidor-anjo e, depois, cofundamos a Elicit Plant. Esse projeto nasceu de uma complementaridade: Olivier Goulay havia trabalhado com fitoesteróis na cosmética e percebeu o potencial de aplicar essa molécula na agricultura.
Tudo se concretizou graças a Aymeric Molin, um agricultor e engenheiro agrônomo especialista em recursos hídricos, que nos permitiu testar e aperfeiçoar nossos produtos em sua fazenda. Sua propriedade é dedicada a grandes culturas como milho, trigo, cevada e girassol, e pudemos trabalhar durante cinco anos no desenvolvimento de produtos adequados.
Quais são os benefícios de sua solução para os agricultores?
Nosso produto é biossourçado e baseado em moléculas naturais extraídas das próprias plantas, ao contrário das moléculas sintéticas tradicionais. Os fitoesteróis, presentes em alimentos como margarina e cremes cosméticos, têm uma capacidade excepcional de penetração. Na agricultura, quando aplicados de forma preventiva, desencadeiam mecanismos de defesa nas plantas, tornando-as mais resistentes ao estresse hídrico e aumentando sua biomassa. O resultado é menor consumo de água, melhores raízes e eficácia comprovada em culturas essenciais como milho, trigo, cevada e girassol.
Derivado de resíduos e sobras agrícolas, nosso produto se integra perfeitamente às práticas agrícolas convencionais ou orgânicas. No momento, não buscamos a certificação orgânica, pois é um processo complexo e oneroso, mas nossa abordagem é ambientalmente responsável. Nosso objetivo é oferecer aos agricultores uma alternativa que combine produtividade e sustentabilidade, sem que essas duas metas entrem em conflito.
Na realidade, os agricultores não utilizam produtos fitossanitários para poluir, mas para sobreviver economicamente. Esse é o principal motivo que os leva, ainda hoje, a protestar nas ruas da França. Esse movimento rural é sentido também em outras partes do mundo, à medida que a emergência climática gera mais incertezas econômicas. Precisamos oferecer soluções eficazes e sustentáveis que os ajudem a inovar.
Vocês obtiveram recentemente autorizações de comercialização (AMC) em vários países. Quais são seus objetivos para 2025?
Em 2021, obtivemos nossa primeira AMC na França, seguida pela Ucrânia em 2022, e pelo Brasil e Europa em 2023. Este ano, recebemos autorização nos Estados Unidos. Em 2025, nosso objetivo é tratar 1 milhão de hectares em mais de 10 países. Também queremos ampliar nossa linha de produtos para culturas como videiras e batatas, além de fortalecer parcerias com grandes players, como Bayer e Basf.
Essas empresas, historicamente especializadas em química, estão genuinamente comprometidas com a transição para soluções mais sustentáveis. Sua expertise, combinada com nossa abordagem inovadora, possibilita o desenvolvimento de soluções híbridas, integrando produtos biossourçados e químicos. Isso atende a um desafio crucial: reduzir os insumos sem comprometer os altos rendimentos, evitando assim uma crise alimentar global.
Elas estão gradualmente substituindo moléculas químicas sintéticas por moléculas biossourçadas, não tóxicas para plantas e seres humanos. Esse processo leva tempo e requer investimentos massivos: nós, por exemplo, levamos mais de cinco anos para oferecer um produto viável.
Por que escolheram um fundo de investimento alemão para sua última rodada de captação?
Essa rodada de financiamento reuniu, de fato, o fundo alemão Carbyne Equity Partners, além de Sofinnova Partners, ECBF e o fundo Ecotechnologies 2, gerido pela Bpifrance. A Carbyne compartilha nossa visão de longo prazo e nos traz uma expertise valiosa para expandirmos na Europa e além. Esses recursos serão usados principalmente na industrialização e diversificação de nossos produtos. Também queremos acelerar nossas pesquisas para adaptar nossas soluções às especificidades dos mercados brasileiro e americano, onde as condições climáticas e práticas agrícolas diferem bastante das da Europa.
Quais são os desafios para uma adoção em larga escala de suas soluções?
O principal desafio é econômico. Os agricultores, especialmente na França e nos países do Leste Europeu, enfrentam forte pressão financeira. Produtos biossourçados ainda são vistos como caros, embora sejam essenciais frente às mudanças climáticas. Defendemos uma regulamentação mais incentivadora e subsídios públicos para apoiar essa transição. Além disso, programas como o Green Deal europeu precisam simplificar seus processos para serem realmente eficazes.
Estamos convencidos de que a tecnologia pode transformar a agricultura, tornando as culturas mais resilientes às adversidades climáticas. Nossos produtos permitem otimizar o uso da água, reduzir emissões de carbono e melhorar os rendimentos, respeitando a saúde dos solos e das pessoas. A Elicit Plant tem orgulho de contribuir para uma agricultura mais sustentável e inovadora, pois isso não é mais uma escolha, mas uma necessidade.