Não há nada mais emblemático na paisagem norte-americana do que seus extensos gramados bem aparados. Para quem viaja pelo país, é notável o mar verde sempre no horizonte dos olhos. Nos EUA, os gramados são uma um cultura no sentido literal da palavra e também uma tradição paisagística.
Mas não é somente isso. Grama, nesse país, é um mercado bilionário. Porém, contraditoriamente, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) estuda, neste momento, sobre a criação de um programa nacional para fortalecer a agroindústria de grama natural, um mercado local estimado em US$ 2,2 bilhões (R$ 13,4 bilhões na cotação atual), e ameaçado. Isso porque o mercado de gramados está enfrentando a concorrência da grama sintética e de percepções equivocadas dos consumidores.
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Preocupações Sobre as Percepções Públicas
Cresce a preocupação no governo federal e entre os produtores de grama viva sobre ideias sociais que levam mais pessoas a desvalorizarem os benefícios da grama natural em favor de sua substituição ou da utilização de alternativas plásticas.
“Essas tendências minimizam o valor dos gramados e campos esportivos de grama natural em ambientes urbanos e suburbanos, resultando na redução da área de grama administrada pelos consumidores ou em sua substituição por outros produtos”, declarou o USDA.
“As plantas, incluindo a grama, são frequentemente vistas como exigentes em insumos como água, fertilizantes e produtos químicos, mas com poucos benefícios valiosos. Essa visão frequentemente leva à conclusão incorreta de que gramados naturais consomem muitos recursos.”
Conceitos Equivocados Sobre a Grama Natural
A maioria das pessoas desconhece tecnologias recentes, como variedades de superfícies verdes tolerantes à seca e métodos avançados de irrigação. Além disso, paisagens de grama natural em áreas populosas podem trazer benefícios ao ecossistema, como sequestro de carbono, produção de oxigênio, filtragem de poluentes e redução do escoamento de água.
O governo federal também estima que a cadeia de fornecimento da grama natural ajuda a sustentar economias locais, gerando receita para centros de melhorias residenciais, serviços de paisagismo e gramados, além de equipamentos e produtos relacionados.
Qual a Avaliação do USDA
O Serviço de Marketing Agrícola do USDA está analisando a questão e busca a opinião pública desde 2023, por meio de propostas de regulamentações. Dois avisos recentes, emitidos em 10 de dezembro de 2024 no Federal Register, publicação oficial do governo dos Estados Unidos, tratam de uma “Ordem de Promoção, Pesquisa e Informação sobre Grama Natural” e de um “Procedimento de Referendo”.
O referendo pede que os produtores de grama votem sobre a criação de um programa nacional financiado pela indústria para promover, pesquisar e informar sobre produtos de relva natural.
A Contribuição Econômica da Grama Natural
“O valor de US$ 2,2 bilhões de grama natural produzida em 2022, por fazendas de grama natural nos EUA, entra no mercado e contribui significativamente para indústrias focadas em crescimento sustentável por meio de iniciativas públicas e privadas que apoiam investimentos ambientalmente responsáveis, bem como para aquelas indústrias que a sustentam”, afirmou o USDA em uma visão geral da indústria.
A grama natural é cultivada principalmente em 1.500 fazendas, que abrangem cerca de 152,3 mil hectares em todo o país. Regiões diferentes produzem variedades específicas adaptadas a determinados climas.
Espécies como bentgrass, festuca fina, festuca alta e grama-azul de Kentucky crescem em seis diferentes zonas de resistência de plantas do USDA, enquanto outras variedades, como grama-bermuda, grama-búfalo e grama-paspalo são cultivadas em zonas mais quentes.
“A indústria de sementes, principalmente no Meio-Oeste e no Noroeste do Pacífico, fornece sementes para fazendas de grama que cultivam gramados de estação fria, como ryegrass, festucas, grama-azul e misturas nativas ou adaptadas”, afirma o USDA.
A Ameaça da Grama Sintética
Embora a grama viva esteja sendo substituída por produtos como cobertura morta, tijolos, pavimentos de concreto e superfícies de playground de borracha, sua principal ameaça econômica é a sua forma artificial.
“A grama sintética de plástico é a principal concorrente e a alternativa mais comum à grama natural para campos esportivos em escolas, parques públicos e locais universitários ou profissionais”, afirma o governo.
Um relatório do Synthetic Turf Council, uma organização local que atua como principal associação comercial para a indústria de grama sintética, relatou um crescimento de 15% no mercado de US$ 2,7 bilhões (R$ 16,54 bilhões) de grama artificial na América do Norte, desde 2017, com aumento da demanda em campos esportivos e aplicações de paisagismo.
Apoio de Produtores, Acadêmicos e Pesquisadores
Muitos produtores e organizações que dependem de grama natural apoiaram a proposta do USDA em 2023 para criar o programa financiado pela indústria. Foram recebidos 173 comentários públicos antes do prazo final de dezembro de 2023.
Allen Woerner, sócio-gerente da Woerner Farms, empresa familiar norte-americana especializada na produção de gramados naturais, destacou a necessidade de educar o público para combater percepções negativas.
“Acreditamos que, com esforços adequados de educação e marketing, podemos combater essa percepção com informações baseadas em pesquisa”, disse ele.
Para Kevin Morris, presidente da National Turfgrass Federation, entidade no país que promove e apoia a pesquisa, o desenvolvimento e a inovação na área de gramados naturais, a grama plástica não é ambientalmente sustentável e nem saudável para práticas esportivas, além de não beneficiar a agricultura dos EUA.
Três professores da Universidade do Estado do Mississippi destacaram a importância de pesquisa para melhorar a sustentabilidade e a produtividade de um dos principais sistemas de cultivo do país, abordando questões como uso de água, habitat da vida selvagem, manejo de nutrientes e pesticidas, e sequestro de carbono.
Diana Zuckerman, do National Center for Health Research, organização que promove pesquisas sobre questões relacionadas à saúde pública, alertou sobre os perigos da grama sintética, que pode conter chumbo e produtos químicos que perturbam o sistema endócrino humano, além de reter calor e causar ferimentos.
* Noel Fletcher é colaboradora da Forbes EUA e jornalista especializada em políticas públicas. Escreve conservação ambiental, políticas de energia limpa e iniciativas governamentais relacionadas ao meio ambiente.