
O arroz, o alimento básico mais consumido no mundo, fornece 20% das calorias diárias globais e está no prato de bilhões de pessoas. No entanto, sua produção está cada vez mais pressionada por pragas e doenças. Uma delas é a Mancha Bacteriana das Folhas (BLB, na sigla em inglês), caracterizada por manchas amarelas ou escuras nas folhas, considerada uma das doenças mais devastadoras para a cultura. A infecção é favorecida por condições climáticas quentes e úmidas, sendo um problema particularmente grave em regiões com esse tipo de clima.
Os agricultores têm poucas soluções verdadeiramente eficazes, acessíveis e sustentáveis para essa doença. Mas a Ascribe Bio, uma agtech com sede em Nova York (EUA), desenvolveu um biopesticida que combate a BLB e outros patógenos, e aumenta a produtividade do arroz em até duas toneladas por hectare, segundo testes de campo recentes.
Jay Farmer, CEO e cofundador da Ascribe Bio, descreve o biopesticida como “um desenvolvimento transformador para agricultores grandes e pequenos.” A solução é derivada de moléculas naturais provenientes do microbioma do solo, tornando-a uma alternativa sustentável para os 144 milhões de produtores de arroz no mundo.
Ao fortalecer o sistema imunológico da planta, o bioinsumo ajuda as lavouras de arroz a se defenderem das infecções, melhorando o rendimento e a sustentabilidade, ao mesmo tempo que garante a segurança dos agricultores, consumidores, organismos do solo e do meio ambiente.
O manejo atual
As estratégias convencionais de manejo da BLB têm apresentado desvantagens. Pesticidas químicos, como sais de cobre, oferecem proteção limitada, enquanto degradam a saúde do solo e apresentam riscos ambientais.
Os antibióticos estreptomicina e tetraciclina, comumente usados nos campos de arroz, contribuem para a resistência a antibióticos — o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a alertar que não são uma solução viável a longo prazo. Enquanto isso, a criação de variedades de arroz resistentes a doenças promete bons resultados, mas o processo leva anos.
“As soluções químicas atuais usadas para manejar essas doenças não atendem às necessidades dos produtores”, afirma Farmer. “Elas podem ser prejudiciais ao meio ambiente, caras e estão perdendo a eficácia à medida que os patógenos desenvolvem resistência.”
O Caso da Índia
Como maior exportador mundial de arroz, embarcando 22 milhões de toneladas a cada ano, e produzindo 27% da oferta global, o arroz indiano é crucial para a segurança alimentar global.
No entanto, a indústria é altamente vulnerável à BLB, que se desenvolve no clima quente e úmido do país, ameaçando reduzir os rendimentos em até 80% em áreas severamente afetadas, e representando um risco sério para os agricultores e os mercados globais de arroz.
“A Índia enfrenta riscos econômicos substanciais se os surtos de BLB não forem controlados”, diz Ramji Singh, doutor e professor do Departamento de Fitopatologia da Universidade de Agricultura e Tecnologia de Meerut, na Índia. “Uma queda na produção prejudica a oferta interna e os mercados de exportação.
Localmente, pode desencadear aumentos nos preços, afetando consumidores e os programas governamentais de segurança alimentar.” Apesar de vários métodos de controle, uma solução eficaz, escalável e ambientalmente segura para a BLB ainda tem sido difícil de encontrar.
Erika Balzarelli, fundadora e CEO da The Sustainable Smallholder, organização que apoia pequenos agricultores por meio de práticas sustentáveis e soluções inovadoras para a agricultura, destaca os desafios crescentes enfrentados pelos pequenos agricultores na Índia e no Sudeste Asiático no manejo da BLB.
Segundo ela, os tratamentos convencionais estão se tornando cada vez menos eficazes, forçando muitos agricultores a recorrer aos antibióticos, muitas vezes em doses excessivas. Isso não só prejudica o meio ambiente e a saúde dos agricultores, como também acelera a resistência das plantas. Enquanto isso, os tratamentos químicos sintéticos continuam caros, colocando os pequenos produtores em um ciclo econômico contínuo de queda na renda.
Ação do Biopesticida
Os testes recentes de campo com o biopesticida, conduzidos pela AgReveal nas principais regiões produtoras de arroz da Índia, marcaram um avanço significativo.
Srinivas Veeranki, diretor executivo da AgReveal, descreve os resultados como “um grande passo à frente para os agricultores e para a segurança alimentar global, oferecendo controle eficaz e duradouro das doenças, além de tornar a produção de arroz mais resiliente aos crescentes desafios ambientais e de mercado.”
Feitos em 17 locais, os testes mostraram uma redução de 83% na severidade da BLB em arroz tratado com o biofungicida, superando os tratamentos tradicionais em mais de 20%, e resultando em aumentos de até 30% nos rendimentos em áreas com alta pressão de BLB.
Em média, o biopesticida aumentou os rendimentos em 13% em todos os locais, incluindo aqueles afetados por outras doenças do arroz, como Mancha da Bainha e Brusone, duas doenças fúngicas que afetam as lavouras de arroz.
O produto também se mostrou totalmente compatível com as práticas agrícolas existentes, tornando-se uma opção promissora tanto para pequenos quanto para grandes produtores de arroz.
“Nosso novo modo de ação é ambientalmente amigável, supera a eficácia das soluções atuais no controle da BLB, e é fácil de usar e escalável, sem exigir a adoção de novas práticas agrícolas ou equipamentos caros”, afirma Farmer.
Esses resultados também estão alinhados com as prioridades estabelecidas pelas Conferências do Clima e da Biodiversidade (COPs) de 2024, conhecidas coletivamente como as Convenções do Rio, que enfatizaram a integração do conhecimento tradicional com soluções modernas.
Uma Oportunidade Crescente
Impulsionada pelos avanços nas práticas agrícolas e pelo aumento da demanda, estima-se que a produção global de arroz aumente 11,12% até 2030, mas escalar a produção de maneira sustentável é fundamental, pois o cultivo de arroz tem uma grande pegada ambiental.
Os campos de arroz, que exigem alagamento contínuo, geram emissões de metano que representam cerca de 8% dos gases de efeito estufa da agricultura. O arroz também é um dos maiores consumidores de água doce, com práticas de irrigação intensivas pressionando recursos vitais. O uso de pesticidas químicos e outros insumos degrada a saúde do solo e polui os cursos d’água, ameaçando ainda mais a produtividade a longo prazo.
Não é surpresa que a demanda por insumos agrícolas naturais e não químicos esteja crescendo rapidamente. O setor de agricultura orgânica, avaliado em US$ 170,8 bilhões (R$ 974 bilhões na cotação atual) em 2022, deverá alcançar US$ 375,8 bilhões (R$ 2,1 bilhões) até 2030.
O mercado de biológicos agrícolas — incluindo biopesticidas, biofertilizantes e biostimulantes — deve crescer de US$ 16,67 bilhões (R$ 95 bilhões) foi avaliado, em 2024, e deve atingir US$ 31,84 bilhões (R$ 181,8 bilhões), até 2029. Esse aumento é impulsionado pela crescente conscientização dos consumidores, preocupações ambientais e regulamentações em evolução, especialmente na América do Norte, Europa e Ásia-Pacífico.
Com a aprovação regulatória pendente no Brasil (nr. país já adiantou sua regulação) e nos EUA, além de planos futuros para aprovação em países-chave produtores de arroz na Ásia, mercados importantes para o Phytalix podem ser desbloqueados. Ao enfrentar desafios de adoção como custo, eficácia e compatibilidade, o caminho está sendo pavimentado para a expansão do uso do biofungicida na produção global de arroz.
Uma Promessa Para o Futuro
Sob o sol escaldante, em um dos 100 países produtores de arroz do mundo, uma agricultora caminha por seus campos, preocupada. As folhas verdejantes de suas plantas de arroz agora estão manchadas com lesões amarelas, enrolando-se nas bordas — sinais clássicos da BLB.
Ela sabe o que está em jogo. Sem um tratamento eficaz, a doença pode devastar sua colheita, deixando-a incapaz de pagar seus empréstimos ou sustentar sua família. Esta é a crise que se desenrola nos campos de arroz ao redor do mundo.
O arroz é um alimento básico para mais da metade da população mundial, com 90% da produção concentrada na Ásia. Em regiões com insegurança alimentar, não é apenas uma fonte de nutrição, mas também um meio de subsistência crucial para milhões de pequenos agricultores.
Como uma mercadoria chave no comércio global e nos programas governamentais de distribuição de alimentos, o arroz desempenha um papel vital na estabilidade econômica, redução da pobreza e segurança alimentar.
As mudanças climáticas — aumento das temperaturas, maior umidade e mais eventos climáticos extremos — estão agravando a disseminação e a severidade da BLB, permitindo que ela se estabeleça em regiões onde antes era incomum. Para os pequenos agricultores, o custo de controlar a BLB aumenta a pressão financeira, tornando mais difícil sustentar suas famílias.
“A BLB é apenas um dos muitos desafios enfrentados pelos agricultores”, diz Farmer, aludindo aos benefícios multifacetados oferecidos pelo biopesticida. “Estamos tentando equipar os agricultores de todo o mundo com uma proteção natural de culturas cientificamente validada que melhore tanto a produtividade quanto a sustentabilidade. Esses testes de campo do Phytalix mostram que, às vezes, a solução biológica pode ser a primeira escolha do agricultor para o desempenho.”
*Daphne Ewing-Chow é colaboradora da Forbes EUA. Jornalista especializada em sistemas alimentares e meio ambiente, já passou pelo The New York Times, The Sunday Times (Londres) e Entrepreneur Magazine, além do Programa Mundial de Alimentos, das Nações Unidas.