
O mercado de máquinas agrícolas tem para 2025 um desafio difícil de ser dimensionado: qual fôlego terão os produtores para voltar às compras e recuperar pelo menos parte da queda de 2024? No ano passado, a indústria de máquinas e equipamentos enfrentou uma desaceleração na receita causada, sobretudo, pela alta taxa de juros. O que se vê hoje é um início de ano com leve recuperação nas vendas de tratores — crescimento acima de 10% nos dois primeiros meses —, com um cenário que ainda impõe cautela, segundo Cláudio Esteves, onde vale ter olhos bem abertos para as oportunidades de algumas culturas, como por exemplo o café.
Aos 48 anos – dos quais há cerca de duas décadas no agro –, há sete Esteves faz parte da equipe da Valtra, onde hoje é diretor comercial Brasil da subsidiária local do grupo norte-americano grupo AGCO (Allis-Gleaner Corporation) com sede em Duluth, no estado da Geórgia. Esteves diz que os próximos passos dependerão diretamente da política de crédito, da rentabilidade das culturas e da capacidade das empresas em oferecer alternativas fora do crédito tradicional.
“A taxa Selic elevada é um inibidor natural do investimento em capital. Mesmo com boas safras em algumas regiões, o agricultor pensa duas vezes antes de assumir um financiamento”, afirma ele. “Se o governo repetir no próximo Plano Safra as mesmas condições do ano anterior, já podemos considerar um alívio. Porque não vejo margem para cortes relevantes na taxa de juros.”
Segundo o executivo, o setor de máquinas e implementos está caminhando para que 2025 seja melhor que 2024 — “embora ainda aquém de 2023”. A retomada plena, segundo ele, deve acontecer entre 2026 e 2027, com recuperação das linhas de alta potência, plantio e colheita.
Essa perspectiva molda o posicionamento da Valtra no mercado. A fabricante tem apostado fortemente no consórcio como solução para os produtores que enfrentam restrições no acesso ao crédito bancário ou às linhas subsidiadas. A estratégia já representa uma fatia importante da comercialização da marca. “Lançamos grupos com até 150 meses de prazo, o que não existe no mercado. Com isso, conseguimos reduzir as parcelas e ampliar a base de clientes que conseguem se planejar, mesmo em um ambiente de juros altos”, afirma Esteves.
Mas o executivo aponta que mesmo em meio a um ciclo financeiro travado, algumas culturas impulsionaram a demanda por máquinas — em especial o café. O preço internacional aquecido, por causa de perdas produtivas na Tailândia, tem feito os cafeicultores brasileiros renovarem suas frotas. “Não me lembro de um cenário tão favorável para o café. O produtor está comprando, muitas vezes, com recursos próprios. E quem não tem, está recorrendo a consórcio ou financiamento de longo prazo”, diz ele.
Esse movimento puxou as vendas de tratores de baixa potência — os chamados fruteiros, que operam em cultivos adensados como café, citros e hortifrúti. A linha cresceu 50% em 2024 e segue com tendência de alta. “O nosso trator específico para café é líder na faixa. Ele é robusto, tem cabine confortável, bom desempenho hidráulico e já entrega as tecnologias que o produtor precisa”, diz. Minas Gerais, Espírito Santo e São Paulo concentram a maior parte dessa demanda. Mas há também movimento em outras regiões, como Rondônia, e no nordeste do país, impulsionado pela cana-de-açúcar.
Esteves diz que a percepção de recuperação de pelo menos parte do mercado – ele aposta em algo entre 6% e 12% do mercado perdido em 2024, que teve uma receita de US$ 60,4 milhões, segundo a Abimaq – não está restrita aos grandes polos de grãos. O Nordeste, por exemplo, mostra desempenho positivo em áreas de cana, com destaque para Pernambuco, Alagoas e Sergipe. No Sul, a estiagem prejudicou o desempenho do Rio Grande do Sul, mas o Paraná teve boa performance em grãos. E o Mato Grosso, principal estado produtor do país, colhe agora uma safra volumosa, fator essencial para destravar os investimentos em máquinas.
“Quando o produtor vê que produziu bem, começa a pensar em renovação de frota. Se ele sabe que a curva de manutenção da máquina vai subir, e tem uma boa perspectiva de receita, é nesse momento que ele decide comprar”, diz Esteves. As decisões são, portanto, sensíveis à rentabilidade e ao tempo de uso da frota atual.
Outro viés no qual as empresas têm creditado parte do empenho dos produtores na troca de máquinas é o movimento sem volta da digitalização das operações agrícolas. A conectividade está no portfólio da marca de forma transversal, e até mesmo os tratores mais simples estão embarcando soluções como telemetria, alertas remotos e integração com centrais de controle nos concessionários.
“Temos as concessionárias com salas de operação que monitoram todas as máquinas conectadas. Isso permite alertar o cliente quando é hora de fazer revisão, identificar gargalos e antecipar falhas”, afirma Esteves. “A simplicidade precisa ser parte da operação. Mas simplicidade não é baixa tecnologia. É uma tecnologia fácil de usar, e isso tem aumentado a adesão.” A tecnologia, segundo ele, está “descendo a pirâmide” e já é adotada por produtores médios organizados, ainda que a agricultura familiar continue sendo menos impactada.