A relação entre as pessoas e o vidro é antiga. Os primeiros registros arqueológicos desse produto datam de mais de 2 mil anos antes da Era Cristã, e desde então essa matéria-prima tem feito parte do cotidiano. Produzido a partir da fusão entre areia e calcário em temperaturas elevadas, o vidro é 100% reciclável, algo visto como uma oportunidade por Juliana Schunck, CEO da Massfix. A empresa, que faturou R$ 105 milhões em 2022, atua há cerca de 30 anos na economia circular do vidro.
O desafio é provar que a reciclagem compensa. O vidro é um produto muito barato. “A areia é um minério abundante no Brasil, uma tonelada custa R$ 60”, diz Schunck. “Isso faz com que cooperativas e catadores tenham pouco interesse pelo vidro e ele acaba indo parar em aterros sanitários, sendo desperdiçado.” Segundo a executiva, todos os anos cerca de um milhão de toneladas de vidro vai para o lixo no Brasil.
Acompanhe em primeira mão o conteúdo do Forbes Money no Telegram
A razão é a inexistência de um sistema de coleta organizado, a exemplo do que ocorre em países desenvolvidos. Essa ausência dificulta a atuação da Massfix. Por isso, o primeiro passo do trabalho da empresa é fomentar a educação para que os usuários reciclem o vidro, e também inserir o material no radar dos catadores e cooperativas. “Hoje atendemos aproximadamente 700 cooperativas, que reúnem cerca de 10 mil catadores. Com isso, em 2021 nós conseguimos reciclar 200 mil toneladas”, diz Schunck. Ela afirma que a aderência aos princípios ESG tem fomentado a reciclagem.
Logística reversa
Apesar de parecer simples, a reciclagem tem várias especificidades. O primeiro passo é identificar que tipo de vidro está sendo reciclado. Há três tipos principais. O vidro plano, utilizado em móveis, imóveis e veículos, o vidro de embalagens e os vidros especiais, usados para armazenar remédios e em televisores. “O maior desafio é criar uma logística reversa, que faz com que o material saia da casa do consumidor, bares e restaurantes, passe pelas cooperativas e chegue até nossa empresa, para ser reciclado e voltar ao ciclo da economia”, explica Schunck.
A reutilização do vidro começa com retirada de todas as partes que não são utilizáveis, como tampas e rótulos. Em seguida vem a separação por cor. Os tipos mais comuns são o transparente, o verde e o âmbar, cor tradicional das garrafas de cerveja. Em seguida, o material é moído e retorna aos fornos para ser fundido.
Cerca de 85% do material reciclado destina-se à fabricação de um novo vidro. Os 15% restantes vão para outros produtos, como a tinta utilizada para pintar faixas de estradas, que refletem a luz durante a noite. O vidro também pode ser usado como material filtrante, em substituição à areia, e para evitar ferrugem em navios.
Negócio
As margens de lucro da reciclagem são estreitas, o que exige que o processo seja realizado em grande escala. “O impacto na natureza é muito benéfico”, diz Schunck. “A areia é um material finito cuja extração causa danos permanentes ao meio ambiente, e pode ser substituída pelo vidro reciclado em vários processos.”
A CEO afirma também que a cada tonelada de vidro reciclado deixam de ser emitidos 350 quilos de CO2. Para ela, as perspectivas são positivas, pois o país está apostando em novos fornos para que mais produtos sejam embalados em vidro. “Provavelmente veremos a substituição de embalagens de plástico e alumínio nos próximos anos por vidro, já que teremos capacidade de fabricar mais.”
Leia mais: Para maioria dos brasileiros, tecnologia é crucial para sustentabilidade
Ela conta ainda que 50% do vidro de embalagens consumido nas cidades é usado em bares, restaurantes e hotéis. A companhia está apostando em novos processos e parcerias para garantir que esse material seja recolhido da forma correta, já que ele não é coletado pelos serviços municipais, como ocorre com os resíduos oriundos das residências. “Estamos fechando parcerias com startups que apoiam essa logística reversa e com empresas que estão colocando postos de coleta em várias cidades do país”, diz Schunck.
A empresa está ampliando sua infraestrutura. Vai inaugurar um novo ponto de coleta no Espírito Santo e deve inaugurar mais duas unidades, nas regiões Sul e Nordeste. E está investindo em uma nova planta no estado de Minas Gerais, onde já possui um ponto de coleta. “Os novos pontos vão facilitar o processo de logística reversa e vão auxiliar no aumento de produção, que deve resultar em um aumento de 20% no faturamento até o fim do ano”, diz Schunck.