Os consumidores de energia solar do futuro serão livres e ativos. Em suas casas, telhas e paredes produzirão eletricidade e, por meio de medidores inteligentes, eles acompanharão de perto o perfil da demanda nas diferentes horas do dia. Seus carros serão, definitivamente, abastecidos na garagem – ao mesmo tempo que, caso optem pela compra de energia de empresas geradoras, terão a oportunidade de escolher seus fornecedores como quem hoje busca uma companhia operadora de telefonia celular.
Diretor-geral da consultoria PSR, Luiz Augusto Barroso ressalta que o setor hoje avança, principalmente, rumo ao armazenamento da energia solar, que ainda não é economicamente viável. Em geral, as baterias têm duração de, no máximo, quatro horas – e são muito caras. Por isso, o mundo inteiro pesquisa como tornar essa tecnologia acessível. Apenas com ela será possível viabilizar o uso em larga escala do carro elétrico, por exemplo.
“O futuro será marcado pelo gerenciamento da vida energética. Os consumidores terão autonomia sobre decisões de quando produzir, armazenar ou comprar de terceiros. A energia solar traz o atributo de permitir a autoprodução, o que, junto com o armazenamento, vai transformar o modo como consumimos hoje”, afirmou Barroso.
Uma sinalização do que vem pela frente são os atuais aplicativos de contratação de energia solar por clientes de pequeno porte, sem investimento e sem muito esforço. Nesse modelo de negócio, por meio do celular, um produtor reúne uma cooperativa de usuários, que compartilham os créditos da operação. Isso porque cada megawatt (MW) produzido e não consumido é transformado em desconto na conta de luz.
Os pequenos consumidores, como o residencial e o comercial, além de produtores rurais, são a promessa de crescimento da geração solar no Brasil, segundo Raphael Gomes, sócio da área de energia do escritório de advocacia Lefosse. Ele avalia que o mercado já se expandiu muito entre os grandes consumidores. Falta agora avançar pelo varejo, num sistema de geração distribuída, “a que mais acelera a matriz energética e atrai investidores”, de acordo com o especialista.
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O que diferencia, no setor solar, as gerações distribuída e de autoprodução é o meio como a energia é contratada. Na primeira, o consumidor está atrelado a uma distribuidora e pagaria pelo uso da rede se não fosse subsidiado. Nesse caso, a energia é adquirida em leilões promovidos pelo governo. Já o autoprodutor é um grande consumidor, como uma indústria, que tem a concessão para gerar a sua própria energia e, por isso, não depende de uma distribuidora para ter acesso a ela e não paga encargos setoriais.
Em alguns anos, é possível que todas as categorias de consumidores passem a adquirir energia no mercado livre, como já fazem algumas indústrias. Mas, para isso, o Congresso precisa aprovar o Projeto de Lei 414, que define que, em algum momento, mesmo os clientes residenciais vão poder escolher de quem comprar a energia, sem passar pelas distribuidoras. A perspectiva é de que, quando isso ocorrer, as fontes renováveis, como a solar, ganhem ainda mais relevância na matriz energética, pois, além de economicamente competitivas, elas têm o selo de baixa emissão de carbono.
O setor de energia solar responde, hoje, por 13,1% da matriz elétrica nacional, com 29 gigawatts (GW) de potência instalada, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar). Desde julho do ano passado, a fonte solar tem crescido, em média, 1 GW por mês. Somente a geração distribuída possui capacidade de 20,5 GW.
“Neste ano, um dos desafios do setor são os juros altos. Para as usinas de maior porte nem tanto, porque elas podem atrair capital internacional. Mas a geração distribuída sente muito”, avalia Bárbara Rubim, vice-presidente da Absolar.
Para Marco Aurélio Araújo, diretor operacional da Orion-E, empresa focada em soluções financeiras e no desenvolvimento de projetos de renováveis, a tendência é de continuidade do crescimento. Ele conta que, em 2010, 1 watt-pico (Wp) de potência fotovoltaica era vendido a U$ 7; hoje sai a U$ 0,21. “No entanto, a estrutura regulatória e os processos de licenciamento do Brasil podem ser complexos, exigindo preparo técnico e projetos eficientes para facilitar o desenvolvimento do toda a cadeia”, afirmou Araújo.
Já Guilherme Costa, gerente-executivo da Renovigi Energia Solar, fabricante de sistemas fotovoltaicos, aposta num movimento de consolidação do mercado. “O setor vai continuar crescendo, mas não nos percentuais que crescia no passado. Não tem como continuar duplicando todo ano”, afirmou. Atualmente, a empresa está com 100% da sua capacidade de armazenamento ocupada e a expectativa é de crescimento do faturamento nos próximos anos.
O setor solar tende, no entanto, a permanecer colhendo os frutos da exigência cada vez mais forte para que as empresas ostentem selos verdes em seus produtos, segundo Aurélien Maudonnet, presidente da empresa. “Os clientes vão ser cada vez mais cobrados por ações nesse sentido”, disse. “Eles vão precisar de certificação de ESG com comprovação, o que demandará mudanças no consumo.”
*Reportagem publicada na Revista Forbes (que pode ser acessada no aplicativo ou no impresso) que integra o Especial ESG na edição 108.