A nova série de Vik Muniz nasceu “de um saco cheio de dinheiro”, conforme as palavras do escritor Eduardo “Peninha” Bueno. As obras do mega artista-fotógrafo estão na individual “Dinheiro Vivo” que inauguramos na sede paulistana da Galeria Nara Roesler no próximo sábado (4).
Peninha não mentiu. Vik foi, sim, à Casa da Moeda do Brasil, sua parceira nessa empreitada, fornecendo sacos de cédulas de real descartadas, inutilizadas, para desenvolver quatorze trabalhos que recriam as estampas impressas no papel-moeda brasileiro. Com outro viés de seu conceito de reciclagem, que rima sustentabilidade com arte, a série discute questões sobre apropriação, original e cópia, e ainda debate sobre o meio ambiente, o consumo de recursos e o valor da arte.
A realização das obras segue a ideia que firmou seu nome na arte contemporânea mundial. As obras, fotografadas e apropriadas pelo artista, são construídas com materiais encontrados no nosso lixo do dia-a-dia. Mas, no caso de “Dinheiro Vivo”, o “lixo” são cédulas do real, a moeda oficial brasileira, nosso vil metal, como os antigos descreviam nosso desacreditado dindim.
Desta vez, ele conceituou sua ideia na forma de protesto ambiental contra a atitude desprezível do governo anterior, concentrando sua pesquisa imagética no mais importante elemento gráfico nas cédulas do real: a fauna brasileira. Nas obras, cada animal é reproduzido apenas com a cédula picada no qual aparece na nota de real, fazendo com que cada obra tenha a exata coloração da cédula equivalente.
Ou seja, a imagem da tartaruga marinha é construída apenas com fragmentos de notas de dois reais em seu característico azul; a garça com um picado de cinco reais no tradicional lilás; o mico-leão-dourado na de vinte tem cor amarela; o lobo-guará em tom de sépia na de duzentos reais e por aí vai. Com isso, a ilusão de ótica é expandida à ilusão do valor monetário, alçando a obra figurativa ao complexo patamar de obra conceitual.
Mas Vik não para aí. Na segunda metade de “Dinheiro Vivo”, ele articula mais um viés de seu forte protesto ao estender a homenagem à nossa flora, retratada pelos artistas viajantes do início do século 19. Esses artistas-cientistas (como eram vistos muitos artistas plásticos da época) desembarcaram em nossas terras, financiados por seus governos, para retratar a paisagem natural e humana do Novo Mundo, pouco antes da invenção da câmera fotográfica, quando a pintura e a gravura eram ainda as técnicas mais utilizadas de reprodução e difusão da imagem.
Aqui, Vik recria quadros famosos de alguns artistas estrangeiros responsáveis por moldar a imagem do nosso país no exterior: o alemão Rugendas, o norte-americano Johnson Heade e o francês Taunay. Mas, o mais importante é que não reproduziu apropriações cromaticamente fiéis. Vik alterou a paleta de cores original de propósito. Sua intenção? Convidar-nos a ver nosso país sob uma outra ótica. E refletir sobre o Brasil sob uma nova perspectiva.
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Cortesia da Galeria Nara Roesler Vik Muniz, Dinheiro Vivo, Floresta Brasileira, a partir de Johnson Heade, 2022.
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Cortesia da Galeria Nara Roesler Vik Muniz, Dinheiro Vivo, Vista da costa da Bahia, a partir de Johann Moritz Rugendas,
2022. -
Cortesia da Galeria Nara Roesler Vik Muniz, Dinheiro Vivo, Garça, 2022.
Vik Muniz, Dinheiro Vivo, Floresta Brasileira, a partir de Johnson Heade, 2022.
Vik Muniz: Dinheiro Vivo
Galeria Nara Roesler, São Paulo
Abertura: 4 de março
De 4 de março a 22 de abril, 2023
Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte [email protected].
Nara Roesler fundou a Galeria Nara Roesler em 1989. Com a sociedade de seus filhos Alexandre e Daniel, a galeria em São Paulo, uma das mais expressivas do mercado, ampliou a atuação inaugurando no Rio de Janeiro, em 2014, e no ano seguinte em Nova York.
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