“Vivencie a existência do meu trabalho sem nada na mente” dizia Donald Judd (1928-1994), um dos maiores nomes do minimalismo americano, que apregoava não buscarmos narrativas, metáforas visuais ou associação imaginativa diante de sua admirável obra tridimensional. O fato de suas esculturas não possuírem referências a priori mexeu com o mundo norte-americano das artes plásticas nos anos 60. O novo é sempre polêmico, ele nos retira abruptamente da zona de conforto ao qual nos habituamos, nos assegura e nos protege do desconhecido.
Bienais de arte são espaços expositivos abertos ao novo, a novas propostas, novas correntes artísticas, novos ideários, novos estímulos, novas sensações. Com um olhar desprovido de preconceitos é como devemos observar uma obra seja na galeria ou em evento de porte como uma bienal. No primeiro contato não há necessidade de nos alvoroçarmos para entendê-la ou começar a formular teorias a respeito, basta apenas se sensibilizar com ela.
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Quando a bienal não cria polêmica, não fomenta debates, o conjunto de obras exibidas, selecionada pelos curadores, não terá atingido o desafio de estimular novos questionamentos e ampliar nossa sensibilidade e mente, seja ela a pioneira Biennale de Veneza, fundada nos idos de 1895, a nossa, a segunda bienal fundada no mundo, a Documenta de Kassel na Alemanha ou uma das tantas outras que hoje existem em várias partes do planeta, que chegam a mais de duzentas.
Não ficou imune a polêmicas nem a 1ª Bienal Internacional de Arte de São Paulo, inaugurada em 1951. Uma delas envolveu a obra de um jovem desconhecido de nome Abraham Palatnik (1928-2020) que teve sua participação recusada porque 2 o trabalho que apresentou – Aparelho Cinecromático (1949), o primeiro da série que entraria para a história da arte brasileira – era tão moderno, tão visionário, que não se encaixava em nenhuma categoria prevista no regulamento do evento! (E, a bem da verdade, não se encaixa até hoje).
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Foto: Levi Fanan 35ª Bienal de São Paulo, Una Voz para Erauso. Un Epílogo para un Tiempo Trans, 2021-2022, vídeo de Cabello/ Carceller
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Foto: Levi Fanan 35ª Bienal de São Paulo, Sumidouro Nº 2 – Diáspora Fantasma, 2022, Diego Araúja e Laís Machado
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Foto: Levi Fanan 35ª Bienal de São Paulo, Carlos Bunga, Habitar a Cor (2015 – em processo)
35ª Bienal de São Paulo, Una Voz para Erauso. Un Epílogo para un Tiempo Trans, 2021-2022, vídeo de Cabello/ Carceller
Resolvido o impasse não só Aparelho Cinecromático foi exposto na edição inaugural como ainda ganhou menção especial do júri internacional. Hoje a obra de Palatnik, representada por nossa galeria, está nos principais museus, entre eles, o MoMA de Nova York, que possui dois trabalhos desse artista exponencial na coleção.
O importante é sempre manter a mente aberta, no mais, o tempo dirá. Ou como diria outro revolucionário da arte, Marcel Duchamp (1987-1968): “Eu me forcei a me contradizer para evitar conformar com meu próprio gosto”.
Com colaboração de Cynthia Garcia, historiadora de arte, premiada pela Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) [email protected]
Nara Roesler fundou a Galeria Nara Roesler em 1989. Com a sociedade de seus filhos Alexandre e Daniel, a galeria em São Paulo, uma das mais expressivas do mercado, ampliou a atuação inaugurando no Rio de Janeiro, em 2014, e no ano seguinte em Nova York.
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