A negociante e processadora de commodities agrícolas Bunge e a petroleira BP anunciaram a criação de uma companhia de bioenergia no Brasil que produzirá etanol e açúcar, além de eletricidade renovável com biomassa de cana-de-açúcar. A joint venture, BP Bunge Bioenergia, na qual cada uma das empresas terá 50%, vai operar de forma autônoma, com um total de 11 usinas nas regiões Sudeste, Norte e Centro-Oeste do Brasil, marcando um dos maiores negócios entre companhias multinacionais no setor, que tem visto forte crescimento nas vendas de etanol no país e deverá ter novo salto nos próximos anos.
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A nova companhia será a terceira maior do mundo em capacidade de moagem, com 32 milhões de toneladas por ano — atrás da Raízen, joint venture entre Cosan e Shell, e Biosev, respectivamente. A fusão das companhias acontece ainda diante de expectativa das empresas de que o mercado de etanol no Brasil deverá crescer 70% até 2030, em meio à implantação de uma nova política para biocombustíveis (RenovaBio), que incluirá a venda de créditos descarbonização (CBios), uma nova fonte de receitas para o setor.
“O Brasil é a Arábia Saudita dos biocombustíveis”, disse à Reuters o presidente-executivo da BP Alternative Energy, Dev Sanyal, acrescentando que a nova companhia terá fluxo de caixa positivo. “Compartilhamos dessa visão de mercado positiva, no sentido que o Brasil é deficitário na produção de combustíveis”, acrescentou em São Paulo Mario Lindenhayn, CEO da BP Biofuels, que será o chairman da nova companhia. O executivo, que também espera crescimento do consumo de etanol no mundo, diante do estabelecimento de obrigações de uso mínimo na China e na Índia, avaliou que a união das empresas poderá garantir “maior escala” às duas companhias.
Além da visão otimista sobre o mercado do biocombustível, o executivo da Bunge Geovane Consul, que será o CEO da nova companhia, disse acreditar que a fusão ocorre em um período em que o ciclo dos preços baixos do açúcar “está por terminar”. “Achamos que a joint venture vai aproveitar… Com as cotações baixas do açúcar, várias empresas estão reduzindo produção ou saindo do mercado”, disse ele, ressaltando que a BP Bunge Bioenergia terá uma das melhores flexibilidade do setor para alterar seu mix de cana, dependendo dos preços das commodities.
As duas empresas produziram 1,5 bilhão de litros de etanol e 1,1 milhão de toneladas de açúcar na temporada 2018/19, além de 1,2 gigawatts-hora em eletricidade. Segundo os executivos, as companhias combinadas terão um índice de ociosidade na moagem de cana de 10%, um dos menores do setor, o que também oferece oportunidade de crescimento, plantando-se mais cana ou buscando-se maior produtividade agrícola.
Enquanto o negócio não é concluído, o que é esperado para o final de 2019, após a aprovação de reguladores como o Cade, a nova companhia não dará previsões futuras. A Bunge disse ainda, em nota, que a parceria fornece “flexibilidade no médio e longo prazos para monetização futura, com potencial de saída total via oferta pública inicial (IPO) ou outra rota estratégica”.
O acordo
Mas o fato é que a empresa nasce com uma dívida considerada relativamente pequena, o que permitirá investimentos para ampliações de produção, destacou Consul. Pelo acordo, a Bunge colocou no negócio suas oito unidades de açúcar e etanol no Brasil, enquanto a BP contribuiu com suas três unidades, ficando acertado também que a nova companhia assumirá uma dívida de US$ 700 milhões da Bunge, que por sua vez recebeu US$ 75 milhões da BP. “Essa dívida coloca a nova empresa com uma das situações mais saudáveis do setor. Com uma dívida que é baixa, a gente vai ter flexibilidade futura para destinar o que faremos com a geração de caixa resultante”, declarou Consul.
Com o acordo, contudo, a Bunge– que investiu bilhões no setor no Brasil– realizará uma baixa contábil de entre US$ 1,5 bilhão e 1,7 bilhão nos resultados do trimestre encerrado em setembro, devido principalmente a efeitos cambiais acumulados. “Esta parceria com a BP representa um importante marco de otimização de portfólio para a Bunge, o que nos permite reduzir nossa exposição atual ao negócio de açúcar e bioenergia…”, disse o diretor-presidente da Bunge, Gregory Heckman, em comunicado.
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Espera-se que o novo negócio tenha sede em São Paulo, com cerca de 10 mil funcionários, em um acordo que, segundo as empresas, será amplamente complementar, pela localização das usinas em várias partes do Brasil e também capacidade de escoamento. Separadamente, o presidente executivo da BP Alternative Energy, Dev Sanyal, destacou que os biocombustíveis são parte importante da estratégia da petroleira para a transição energética, com o mundo apostando mais em fontes limpas de energia.
Com o fechamento da operação, a Bunge disse também que não vai mais consolidar suas operações de açúcar e bioenergia no Brasil em seu balanço –a participação na joint venture será contabilizada pelo método de equivalência patrimonial.
Avaliação positiva
As ações da Bunge abriram em alta de mais de 3% em Nova York após o anúncio da joint venture, antes de reduzirem ganhos para cerca de 2%, enquanto as da BP subiram 0,7% em Londres. As condições do mercado de etanol melhoraram no Brasil, com forte demanda e melhores preços, mas o mercado global de açúcar continua desafiador, segundo analistas.
“Acho que existe uma grande sinergia, haverá uma otimização de recursos, uma diminuição de custos. A Bunge está tirando um grande peso, porque estava tentando vender no passado, e evidentemente que achou um caminho muito mais interessante para continuar no negócio sem ter que efetivamente assumir um prejuízo, que agora pode até ser revertido…”, disse Arnaldo Corrêa, consultor de açúcar e etanol no Brasil. “É uma ótima notícia para o setor, porque o negócio cria um player muito mais forte. Todas essas preocupações sobre o futuro dos ativos da Bunge desapareceram”, acrescentou.
“A nova empresa deverá colocar um foco em combustível e bioeletricidade, que terão uma importância crescente na medida em que a economia brasileira volte a crescer. É interessante porque as empresas têm atributos complementares. Uma do setor de petróleo, a outra do setor agrícola. Terão acesso a clientes nos dois lados, cria uma escala maior para compra de insumos e equipamentos, isso vai trazer redução de custos”, acrescentou Plinio Nastari, analista-chefe da consultoria brasileira Datagro.
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