“Se eu puder mostrar aos homens americanos, individualmente, como podem melhorar, eles vão me amar!” É o que diz, como um messias, o alfaiate Nedo Bellucci, de Nova York, cuja ampla clientela inclui celebridades como Liam Neeson e Rupert Murdoch. Enquanto ele fala, estou me contemplando, não totalmente à vontade, nos espelhos triplos de sua elegante e exclusiva alfaiataria, que fica no alto de um edifício na Rua 57, perto da Quinta Avenida. O alfaiate de luxo Bellucci está puxando a parte de trás de minha camisa, que faz um sulco sob minhas axilas, para defender seu ponto de vista: a camisa, uma Brioni comprada em liquidação, me dá um ar desleixado.
O próprio Bellucci veste calças jeans e camiseta branca, com um blazer escuro perfeito contrastando com um cachecol de linho quadriculado em roxo e com um chapéu de feltro azul engenhosamente amarrotado e dobrado para cima na aba, de seus amigos napolitanos expatriados da Worth & Worth. Em boa forma física aos 39 anos, ele parece um eterno jovem frequentador da noite, o que de fato é. Ele se sente em casa em seu ateliê, aberto há dois anos. São três andares aconchegantes, com acesso por elevador privativo, que ele chama de Palazzo Bellucci (belluccinapoli.com), tudo em tons de preto, branco e cinza. No andar de baixo há um clube VIP com vista para os vizinhos: Louis Vuitton, Bvlgari e Tiffany.
Estamos tendo um momento pedagógico com minha camisa. Primeiro problema: a costura do ombro está abaixo da linha do meu ombro, dando um aspecto que Bellucci chama de “caído”. Isso acontece com as camisas 99% das vezes, diz ele, profissionalmente espantado com o descaso: “A maioria dos alfaiates ainda tira as medidas do colarinho até o punho, o clássico ‘comprimento 34’ ou coisa que o valha. A questão é que, quando você desenha a camisa desse jeito, não sabe onde fica a costura do ombro. Mas a costura é um aspecto visual – e esta passa uma imagem de ombro arredondado”.
“Quando você eleva a costura para a altura do ombro” – e aqui vem outro puxão que estica a camisa sob minhas axilas –, “realça o ombro. Você está definindo o espaço geometricamente. O que nós fazemos é medir dois pontos, de uma escápula à outra, e depois desenhamos as mangas. Com isso, todos os nossos clientes arregalam os olhos: ‘Meu Deus! Meus ombros pareciam caídos e agora parecem atléticos!’.”
O Evangelho do Corte de Ombro Alto é um adendo de Bellucci ao grande Cânone da Alfaiataria Napolitana, tradição que ele recebeu e que ele prega: paletós não acolchoados, não forrados (ou com pouco forro), com “ombros macios” não estruturados, cavas altas e muita costura à mão (30 a 40 horas de costura, no caso de seus melhores ternos sob medida, que custam US$ 3.500). O conjunto todo é desenhado de modo a facilitar o movimento natural e aumentar o conforto. (“Os paletós de Nápoles são famosos porque parecem uma segunda pele; se você consegue fazer isso, é um sucesso.”)
Porém, Bellucci acha que, nesta era do “misturar e combinar”, um paletó com corte napolitano apresenta outra enorme vantagem sobre um corte inglês quadradão, com ombreiras: como não é tão obviamente formal e não visa a impressionar, o paletó napolitano é por si próprio mais versátil: vai bem tanto com calças jeans ou cáquis quanto com as calças do mesmo terno.
Bellucci, que já foi gestor de portfólio de fortunas privadas no grupo financeiro italiano Generali, chegou a essas convicções no corte e costura do outro lado da fita métrica. “Meu pai me levou ao alfaiate dele para fazer meu primeiro terno quando eu tinha 10 anos”, recorda. “Em Nápoles, isso é normal. Toda essa experiência linda de ir junto com o meu pai e de ele se encontrar com os amigos na alfaiataria me ajudou a realizar meu sonho quando vim a Nova York.”
Seus contatos napolitanos também ajudaram. Quando ele estava recomeçando em Nova York e trabalhava como garçom durante o dia, seus amigos de infância Oscar e Luca Blandi, cabeleireiros de celebridades, se dispuseram a comprar suas primeiras camisas – o “escritório” dele era um livro de pedidos – e lhe indicaram alguns clientes. Foi por meio de outro expatriado, o restauranteur Emilio Ballato, que ele conheceu Murdoch. (Eles passaram horas analisando juntos os armários na casa do presidente da News Corp., e Bellucci gosta de deixar clara uma questão a respeito de seu cliente famoso: “As pessoas que não o conhecem ficam falando, mas eu fiquei espantado e impressionado com a humildade dele”.) Outro contato napolitano em Nova York o apresentou ao financista que se tornaria seu apoiador oculto no Palazzo Bellucci.
Hoje, uma visita ao palazzo mistura terapia de compras, aculturação ao Velho Mundo e formas de entretenimento que talvez você tenha deixado passar despercebidas anteriormente. Em uma mesa elevada no fundo do showroom principal, por exemplo, fica Simone Olibet, mestre camiseiro napolitano com ar de professor. Se for devidamente incentivado (US$ 595 por camisa é um começo), ele criará uma camisa do zero em 24 horas, passando-a quando você chegar, para que seja entregue ainda quente (“saindo do forno”). “Muitos clientes gostam de vê-lo trabalhar”, observa Bellucci. “E é divertido mesmo. Ele dispõe todas as peças e, acredite, só de olhar você não consegue imaginar onde elas vão parar.”
Chove a cântaros lá fora, o que nos impede de relaxar no terraço com azulejos terracota do 18º andar, mas um jazz suave serve de consolo. Em um canto, dentro de um aquário grande só de vidro, nada um membro da família das piranhas, do tamanho de uma torradeira. “Ei, se você estiver aqui dentro de uma hora, eles vão dar um peixe dourado para ele comer!”
Sim, claro… Alfaiataria napolitana, Campari com gelo, comida para peixe. “Costumavam dizer que a paz no mundo era criada no fazer contato das alfaiatarias”, diz Bellucci quando seguimos para o elevador. “Essa também é a nossa ideia.”