Na metade de maio, dezenas de empresários e políticos chineses liderados por seu primeiro-ministro, Li Keqiang, aportaram no Brasil dispostos a secar a tinta de suas canetas. Nada menos que 35 acordos comerciais foram assinados por líderes dos dois países, além de convênios em áreas como cultura, ciência e esporte. Linhas de crédito que totalizam US$ 53,3 bilhões para obras de infraestrutura foram prometidas. Boas-novas, sem dúvida. Resta saber: quantas delas sairão do papel?
Aos fatos: com os acordos firmados, Pequim ratifica de forma incontestável seu status de maior parceiro comercial do Brasil. Em 2014, as trocas entre as duas nações chegaram a US$ 78 bilhões. É um valor impressionante, só possível de ser atingido por tratarem-se de economias altamente complementares. “A China possui um grande estoque de capital, ao passo que o Brasil, com seu baixo nível de poupança interna, necessita justamente de capital externo para se alavancar e gerar empregos”, observa Charles Andrew Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China —CCIBC (os gráficos destas páginas são da entidade). “A China tem ainda limitações em terras cultiváveis, mas precisa sustentar uma população sete vezes maior que a brasileira. Para garantir sua segurança alimentar, os chineses importam soja e outros grãos. Além disso, como é uma nação próspera, a China consome hoje mais carne bovina. O Brasil é exportador dessas commodities. E a China também quer ter acesso a recursos estratégicos para seu crescimento, como minérios e petróleo”, completa ele.
Tang é otimista acerca do futuro das relações sino-brasileiras. Questionado sobre anúncios feitos no passado de aportes chineses que não se concretizaram, ele argumenta: “Como os acordos incluem investimentos de companhias públicas e privadas chinesas, junto com companhias privadas brasileiras, é normal que alguns não se tornem realidade após um melhor exame do mercado ou quando é feita a due dilligence nas empresas”. Mas o executivo se diz confiante de que os protocolos agora assinados vingarão.
E que protocolos: ambos os países se comprometeram a terminar a construção conjunta de um satélite de monitoramento terrestre; a China anunciou que começará a importar carne bovina diretamente do Brasil (até agora, tais compras só ocorriam via Hong Kong); o país irá adquirir 22 aviões da Embraer, por US$ 1,1 bilhão; e um banco chinês arrematou 80% de um banco local, o BBM, por R$ 525 milhões. Até mesmo um dos jogos mais populares no Oriente, o badminton, contará com apoio oficial para que se dissemine no Brasil.
E os empreendedores locais estão atentos à tanta agitação. “Desde 2007 somos procurados por profissionais de diversas áreas em busca de conhecimento sobre a cultura de negócios na China”, informa Suzana Bandeira, consultora especializada no país asiático. “São empresários brasileiros que vão para lá visitar feiras e prospectar fornecedores. Há também multinacionais presentes no Brasil que precisam treinar executivos que serão expatriados à China e preparar suas respectivas famílias. Nosso programa inclui temas como a gestão de chineses no trabalho, gestão de equipes multiculturais e coaching executivo para desenvolver competência intercultural, com foco no ajuste e adaptação ao ambiente de negócios chinês.”
Observadores mais céticos, contudo, enxergam esse movimento chinês com cautela. Um empresário próximo ao governo, por exemplo, acha que o governo chinês tentará utilizar sua própria mão de obra em projetos realizados em solo brasileiro, numa proporção nunca antes permitida. Resta a saber, agora, como o Palácio do Planalto irá reagir caso essa possibilidade se concretize.