Empresários e políticos se reuniram no último sábado (25) no Hotel Sofitel Jequitimar, no Guarujá, litoral sul de São Paulo, para o 5º Fórum Nacional do Varejo, Consumo e Shopping Center. O evento, promovido pelo Lide, reuniu representantes das principais empresas do setor para uma discussão sobre o atual panorama econômico do Brasil e o desempenho do segmento.
Os empresários falaram sobre a forma como o governo regulamenta e intervém na economia em áreas como as relações de trabalho, tema impulsionado pela aprovação na semana passada da Lei de TerceirizaçãoApós dois anos consecutivos de queda no Produto Interno Brasil (PIB), o setor tem uma perspectiva otimista para 2017 impulsionada pelo resultado positivo dos balanço do primeiro bimestre do ano. Os números, no entanto, não foram divulgados. Mesmo assim, a performance da economia e das vendas ao consumidor deve ficar bem aquém das registradas em anos anteriores à crise.
Para tentar recuperar o dinamismo, o discurso do empresariado foi além das estratégias que têm sido adotadas pelas companhias, como novas formas de venda, relacionamento com o consumidor e sinergia com as distribuidoras e financiadoras. O debate estendeu-se para a esfera política, mais especificamente para o papel do Estado na economia, como deve ser a relação da empresa com a sociedade e o comportamento cidadão do empresário. Inicialmente, as manifestações empresariais a respeito da política econômica tiveram o mesmo conteúdo de outros fóruns realizados sob circunstâncias econômicas mais favoráveis, com as recorrentes reclamações sobre a elevada carga tributária, o “intervencionismo do governo” e a ineficiência dos gastos públicos. Gradativamente as falas dos empresários foram se direcionando para temas como a forma com que o governo regulamenta e intervém na economia em áreas como as relações de trabalho – tema impulsionado pela aprovação na semana passada da Lei de Terceirização -, a relação empresa-governo e até a política externa.
Lei de Terceirização
O fórum foi realizado três dias depois da aprovação da Lei de Terceirização, que regulamenta a contratação pelas empresas de trabalhadores terceirizados, tanto para as chamadas ocupações de atividade-meio (auxiliar de limpeza e técnico de informática, por exemplo) como para as funções de atividade-fim da empresa, ou seja, uma montadora poderá contratar um empregado terceirizado para trabalhar na linha de produção dos veículos. Entretanto, a aprovação da lei não foi considerada suficiente pelo empresariado do setor. A iniciativa foi qualificada como um “primeiro passo para a modernização das leis trabalhistas”, e houve pedidos para a extinção e o ressurgimento da CLT com base na flexibilização.
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O presidente da Inbrands – holding detentora de marcas de moda e de confecção – Nelson Alvarenga, disse que não prevê alteração no regime de contratação de trabalhadores pelas empresas e qualificou a Lei de Terceirização de “mentirinha”. “Quem contrata ainda é responsável”, afirmou Alvarenga, que pediu, ainda, regras de liberalização e simplificação para o desenvolvimento das atividades da iniciativa privada no Brasil.
Também participou dos debates o Secretário de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Marcelo Maia. Inicialmente favorável a uma nova CLT, Maia disse que no setor público existe consenso para aprovar as novas medidas, e avaliou que a Lei de Terceirização é o “passo inicial”. Além disso, Maia anunciou durante o evento o lançamento do Laboratório de Varejo, uma plataforma voltada à inovação que reunirá startups, fintechs e varejistas, com previsão de início para o primeiro semestre de 2017.
Impostos
Destacou-se a fala do ex-diretor de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp e atual vice-chairman do Lide, o economista Roberto Giannetti da Fonseca, sobre a reforma tributária enviada ao Congresso pelo Palácio do Planalto. O governo propôs a extinção de sete tributos federais (IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins e salário-educação), do ICMS (estadual) e do ISS (municipal), criando três novos impostos para ocuparem a vaga dos extintos: o Imposto sobre Valor Agregado (IVA), o Imposto Seletivo e a Contribuição Social Sobre Operações e Movimentações Financeiras. Giannetti saudou a iniciativa do governo federal de simplificar a cobrança de impostos, mas chamou a atenção para um “golpe” na alteração proposta por esta reforma. “Há um risco de elevação da carga tributária implícita no estabelecimento de uma nova alíquota para o IVA”, alertou o economista.
Internacionalização dos serviços
Gianneti também avaliou a estrutura das relações econômicas brasileiras com o exterior. Ao relembrar o período em que trabalhou para uma autarquia que cuidava do comércio exterior do país, o economista recomendou que o Brasil elevasse a participação do setor de serviços, varejo e dos canais de distribuição, diminuindo a dependência da exportação de bens físicos, que dominam a pauta comercial. “O produto exportado é brasileiro, mas a logística é internacional”, disse sobre a dependência externa brasileira na exportação de serviços, cuja reversão deve gerar recurso ao país.
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Sobre a política externa, Nelson Alvarenga pediu mais ênfase comercial do que política nas relações internacionais brasileiras. “É preciso alavancar as marcas brasileiras no exterior, não ficar com foco no Mercosul”, disse.
O empresário-cidadão
Flávio Rocha, presidente do Grupo Guararapes, que detém a Riachuelo, lançou os princípios para que o empresário “saia da moita e assuma maior protagonismo”, tornando-se um empresário-cidadão. Batizado de “Decálogo do Empresário-cidadão”, o programa tem dez regras que enaltecem o livre-mercado, critica o Estado corrupto e ineficiente e propõe sua substituição por um modelo que estimule o empreendedorismo e transforme o empresário e o investidor que toma risco em protagonistas. “O mercado é sábio, suas leis punem os ineficientes e não há corrupção”, disse Rocha, que mencionou ainda a existência no Estado de uma “mão humana e falha ao favorecer o perdulário”.
Além disso, o presidente da Riachuelo criticou os empresários que se beneficiam de desonerações em troca de “obras públicas”, uma crítica indireta aos executivos das empreiteiras acusados de corrupção pela Operação Lava Jato. “O empresário tem que estar sob o freio e o contrapeso do mercado, e não de um Estado hipertrofiado”, disse.
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Ao mencionar que se inspirou na obra de Milton Friedman para elaborar o princípio do empresário-cidadão, Rocha disse que discorda do economista em apenas um ponto. “Ele diz que a empresa existe para ganhar dinheiro, mas ela precisa de um propósito”, afirmou, avaliando que a empresa é a “melhor instituição para mediar os conflitos entre o capital e o trabalho a partir da precificação”, diferentemente do Estado que potencializaria o confronto.
Por fim, conclamou os empresários a saírem dos seus escritórios e se mobilizarem para que o país que eles desejam se torne real, com “lucratividade, justiça social, fim da corrupção e da concorrência empresarial desleal”. Um discurso alinhado com o do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), durante sua rápida participação no evento, quando pediu para que os empresários “não deixem que uma minoria ruidosa se sobreponha a uma maioria silenciosa”, numa referência às mobilizações sindicais e de movimentos sociais contrários às reformas econômicas propostas pelo presidente Michel Temer (PMDB). O prefeito recomendou, ainda, que os empresários pressionem os parlamentares para que as novas medidas sejam aprovadas, alegando que “o maior interessado é o verdadeiro trabalhador que vai ter emprego e renda após as reformas”.