Todo engenheiro formado no conceituado Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), em São Paulo, tem profundo conhecimento sobre os ventos. Mas poucos souberam tirar tanto proveito deles como o cearense Mário Araripe, 62 anos. Formando no ITA na turma de 1977, Araripe pilotou vários negócios de sucesso até se tornar o rei da energia eólica com sua empresa Casa dos Ventos, maior desenvolvedora de parques do setor no país.
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Nascido em Crato, interior do Ceará, filho de um engenheiro de obras contra a seca, ele saiu do sertão para estudar até em Harvard (EUA), mas sempre voltou ao interior do Nordeste para empreender. Ali montaria seu império.
O primeiro negócio próprio depois de se formar passou bem longe da aeronáutica: após trabalhar na empresa têxtil da família do sogro, Araripe montou uma incorporadora especializada em imóveis de luxo nas belas praias do Ceará. A construtora Colmeia chegou a ser uma das maiores do Nordeste, até ser vendida, em 1994. O empresário investiu então em duas indústrias têxteis, a Companhia Valença Industrial e a Têxtil União. Ambas fazem parte até hoje do Fundo Salus, que reúne os empreendimentos de Araripe.
“Não tem furacão, tufão, ciclone. A produtividade da usina eólica no Nordeste é a maior do mundo”
Foi depois da venda da Construtora Colmeia que o empresário apostou naquele que viria a se tornar um de seus negócios mais famosos: em 1997, após retornar de uma temporada de estudos em Harvard, investiu na fabricante de veículos utilitários Troller, fundada dois anos antes em Horizonte (CE) pelo engenheiro Rogério Faria. Tornou-se controlador da marca e foi o responsável pela grande aceleração da empresa – os jipes fizeram fama internacional em ralis como o Paris-Dacar.
A Troller Veículos Especiais foi a única montadora de veículos 100% brasileira até o comecinho de 2007, quando Araripe vendeu a empresa à norte-americana Ford, em um negócio estimado em R$ 600 milhões.
Foi nessa brecha que o ITA e os ventos voltaram a entrar na vida do empresário: o estímulo para investir na energia eólica veio numa conversa com o engenheiro Odilon Camargo, ex-colega do Instituto, responsável pelo primeiro grande levantamento sobre o potencial eólico do Brasil, elaborado para o Ministério de Minas e Energia.
“Eu havia acabado de vender a Troller para a Ford e estava extremamente líquido. Odilon me disse que deveria olhar a energia eólica e foi o que fiz”, relatou Araripe sobre o conselho do amigo. Por coincidência, anos antes, enquanto Camargo preparava o atlas eólico do Ceará e precisava visitar locais de difícil acesso, Araripe havia lhe emprestado um Troller para a tarefa.
Os ventos do Nordeste estão entre os melhores do mundo para a geração de energia eólica. Bom de faro para novas oportunidades, o cearense seguiu a sugestão do ex-colega de turma e, ainda em 2007, criou a Casa dos Ventos, que começou comprando e alugando terras no Ceará para desenvolver projetos eólicos. Rapidamente, a empresa se tornou a maior desenvolvedora de parques de geração de energia dos ventos – entre projetos próprios e para terceiros.
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A Casa dos Ventos também se transformou em grande vendedora de empreendimentos: em 2016, repassou dois parques à Cubico Sustainable Investments, por cerca de R$ 2 bilhões. O negócio envolveu os complexos Ventos de Santa Brígida, no agreste de Pernambuco (com capacidade para 182 megawatts), e Ventos do Araripe I, no sudeste do Piauí (210 megawatts). Na ocasião, foi a maior transação já realizada no Brasil com ativos eólicos em operação. Os dois parques eólicos representam aproximadamente um terço dos ativos com energia contratada da Casa dos Ventos.
Em maio deste ano, a companhia confirmou a venda de mais dois empreendimentos, desta vez para a Echoenergia, criada pelo fundo britânico Actis: Ventos de São Clemente, em Pernambuco (216 MW), e Ventos de Tianguá, no Ceará (130 MW). Nesta negociação, o valor não foi divulgado, mas foi igualmente bilionário. “Como temos outros projetos, às vezes vendemos para investir mais em outro”, declarou o empresário depois da primeira alienação, para a Cubico.
Quando Araripe ingressou no setor, a energia eólica representava apenas 0,2% da matriz elétrica brasileira. Hoje, o país já é o nono maior produtor mundial – em boa parte, graças à Casa dos Ventos. A empresa participou do desenvolvimento de um terço de todos os parques eólicos atualmente em operação ou em construção no Brasil.
Recentemente, a empresa inaugurou a usina Ventos do Araripe III, um dos maiores complexos da América Latina. Localizado na Chapada do Araripe, entre Pernambuco e Piauí, o projeto é composto por 14 parques e 156 aerogeradores, com produção de 359 MW. Nele foi investido R$ 1,8 bilhão.
Além dos projetos próprios, a Casa dos Ventos tem participação acionária em outras usinas (que somam 657 MW). Mas seu maior gigantismo está no potencial: a empresa soma 15 gigawatts (cerca de 20 vezes a capacidade dos parques que já vendeu) em projetos engatilhados, com áreas já mapeadas e aprovadas. O fundo Salus é dono de mais de 180 mil hectares de propriedades rurais no Brasil – o que significa muito chão para torres de energia eólica.
“Em termos energéticos, raras são as regiões da Terra com ventos tão fortes e constantes como no Nordeste do Brasil. Além da latitude certa, ele está no lado certo do continente em relação à rotação da Terra. Não tem furacão, tufão, ciclone. A produtividade da usina eólica no Nordeste é a maior do mundo. O preço é muito competitivo”, festeja o novo integrante da lista de bilionários de FORBES.
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