Quem tem filhos sabe que é praticamente impossível lutar contra os cada vez mais realistas e hipnóticos games desenvolvidos para consoles e computadores. É uma febre mundial que seduz gente cada vez mais jovem (e mais velha também). O mineiro Germano Couy é pai de dois garotos (de 12 e 7 anos de idade). Ele não só joga com os filhos como também pensa nisso o tempo todo, principalmente no trabalho. Explica-se: ele é o country manager da fabricante de computadores taiwanesa Acer no Brasil. Eterno apaixonado por computadores e no cargo desde 2014, Germano é responsável pela virada do portfólio da marca no país – e pelo atual foco em máquinas desenvolvidas especialmente para os jogos. Se antes a Acer era associada a produtos de entrada, mais simples e mais baratos, hoje gaba-se de ter conquistado relevância com produtos mais sofisticados e mais caros, como o impressionante Predator.
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À PRIMEIRA VISTA
“Comecei fazendo engenharia elétrica na PUC de Minas Gerais. Entrei na faculdade muito novo, com 16 anos, em 1988. Logo no primeiro dia de aula tive contato com esse mundo de computadores, que era uma novidade para nós. Foi paixão à primeira vista”, lembra o executivo. O acesso à tecnologia na época era difícil. Dependia de viagens ao exterior, e as compras eram limitadas pela cota de importação. “A gente tinha aquelas calculadoras científicas e achava o máximo. Então o professor disse que tinha algumas calculadoras e peças de computador para vender. Perguntei: ‘Como assim, o que vocês fazem com peças de computador?’ Ele respondeu que amigos pesquisadores traziam as peças para montar os computadores aqui. Fiquei maluco com essa ideia.”
A empolgação com a novidade era tanta que Germano cometeu uma grande gafe. Quando o professor disse que entre as peças havia winchesters, ele logo pensou na velha espingarda do avô, uma Winchester aposentada por falta de munição. “Eu quero. Mas onde consigo as balas?”, perguntou com sinceridade, para gargalhada da classe. Seis meses depois, ele já estava montando e vendendo seus próprios computadores – com winchester e tudo. No ano seguinte, aos 17 anos, dava aulas de programação. “Fui chamado para dar um curso no Dentel, o Departamento Nacional de Telecomunicações. Imagine, um garotão ensinando uma turma de engenheiros experientes.”
Aos 20 anos, abriu sua própria empresa. Montava redes corporativas e vendia as máquinas. Conquistou clientes grandes e um nome respeitado na área. Poucos anos depois, no entanto, quando o mercado se abriu, as pequenas empresas brasileiras do setor se viram obrigadas a sair de cena. Germano mudou-se para São Paulo e, por 15 anos, atuou na Megaware – desde sua criação até levá-la ao posto de terceira maior fabricante nacional de computadores.
Em 2014, veio o convite da Acer. “Fiquei tentado, mas preocupado. Era uma empresa muito grande, de outro país… Será que eu teria espaço para desenvolver minhas ideias? Antes de aceitar, decidi ter uma conversa franca com os executivos de Taiwan: ‘Senhores, o Brasil tem muitas particularidades fiscais, de custos operacionais e de formatos de negócio. Se não for uma coisa tailor-made para o nosso país, a empresa vai ter dificuldade para crescer e ter lucratividade’.”
A Acer já operava havia algum tempo em terras brasileiras, sempre comandada por executivos estrangeiros. “Eram excelentes gestores, mas não conheciam tão bem o gosto do brasileiro e nossas dificuldades. A companhia sabia que precisava de alguém capaz de fazer um turn-around e recolocar o negócio nos trilhos em termos de lucratividade, market share e percepção de marca”, afirma. Assim, a liberdade de ação que ele pleiteava foi garantida – e o jogo começou.
O primeiro passo foi ouvir o consumidor. Como consequência, a linha de produtos foi reformulada, das cores ao tamanho da tela. O segundo passo foi entender o momento econômico que o Brasil passava. “Depois de quatro anos consecutivos em que as classes C e D vinham comprando bastante, com muito apetite por produtos de tecnologia, em 2014 o poder de compra dessas pessoas começou a cair e seu endividamento cresceu.” A operação da Acer no Brasil, calcada em produtos de entrada, tornou-se deficitária.
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Germano criou, então, uma estratégia baseada no fato de que a mão de obra e o custo de um produto de entrada e o de um produto high-end eram os mesmos. “Claro que não tínhamos tantos consumidores high-end, por isso sugeri começarmos com um mix de produtos: de entrada, intermediários e high-end. Os de entrada geravam maior percepção da marca, os do meio tinham maior lucratividade e os high-end colocavam a marca num patamar de imagem mais alto”, explica.
A cúpula taiwanesa achou a tática arriscada, mas acabou concordando. Em 2015, as perdas recuaram 50%. No ano seguinte, a tática foi reforçada. Se em 2014 os produtos de entrada representavam 60% do portfólio, em 2016 eram apenas 17%. Outra ação acertada foi readequar o tamanho da empresa ao tamanho do mercado – agora 50% menor em número de unidades vendidas em função do avanço dos smartphones e do aperfeiçoamento dos computadores, cada vez mais duráveis. No fechamento do ano, a empresa comemorava sua volta ao equilíbrio.
“O desafio agora é este: como tornar a tecnologia desejável. Por isso você vê produtos mais finos, mais leves, híbridos (computador e tablet ao mesmo tempo)”, diz Germano, enquanto coloca um notebook a meu lado e pede para eu pôr meu celular ao lado da máquina. “Viu? É mais fino que seu celular! E estamos prestes a lançar o notebook mais leve do mundo, com 970 gramas.” Ao falar do crescente mercado de computadores para instituições de ensino, ele derrama meio copo de água sobre o teclado de um pequeno notebook-tablet branco e o atira ao chão – para me mostrar que o valente continua funcionando. Mas como jogar é mais divertido que estudar (que a garotada não nos ouça), a aposta mais vistosa da Acer no Brasil é sua linha gamer.
“Esse mercado vem crescendo no mundo inteiro. Aqui não atraía tanto a atenção dos fabricantes. Até que em 2016 resolvemos fazer uma aposta e importamos algumas unidades. A aceitação foi surpreendente. Vimos que era viável produzir localmente. Quando fizemos isso, o custo caiu 35%, e nossa expectativa de vendas foi superada na mesma proporção.” Ele se refere ao VX, primeiro modelo feito no Brasil, produzido desde março de 2017 na fábrica de Jundiaí (SP).
Logo ficou claro que os jogadores brasileiros queriam performance, usabilidade e preço competitivo. Nesse espectro estão disponíveis máquinas de R$ 4.999 (preço inicial do VX, valor considerado baixo no universo gamer) até R$ 20 mil. Sob demanda, a Acer produz o cobiçado Predator 21X, que no Brasil custa R$ 89 mil (mais R$ 8 mil do monitor opcional de 34 polegadas e tela curva). “Nossa expectativa é que nos próximos dois anos a linha gamer chegue a 30% do negócio.”
Advogando em causa própria, Germano fala de opções menos chamativas, projetadas para pessoas como ele – executivos de meia-idade e fãs de games. “Dá para usar essas máquinas para trabalhar e jogar sem chamar atenção”, revela. Com esse “mau exemplo” vindo de cima, como fazer com que os filhos não passem o dia todo na frente da tela? “O trato é o seguinte: se eles vierem com boas notas, tudo bem. Senão, nada de jogo – e vai já estudar.”
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