Há alguns anos, o Facebook tem se tornado a fonte primária de notícias para um número cada vez maior de pessoas em todo o mundo. Por isso, a rede social vem tentando corrigir seu duramente criticado problema com as fake news por meio de uma série de mudanças anunciadas na semana passada.
No entanto, o plano de enfatizar links que algum amigo do usuário compartilhou e alvo de grande engajamento (curtidas e comentários) parece destinado a ter o efeito oposto, promovendo fake news e meios de comunicação não confiáveis ao mesmo tempo em que aumenta os efeitos do chamado “filtro bolha”, que consiste no fato de o Facebook exibir para um usuário apenas opiniões com as quais ele concorda.
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Como já incessante e incansavelmente apontado, as fake news encontraram um terreno fértil no feed notícias do Facebook, pois parece não haver critério para ranquear os sites e, certamente, nenhum esforço foi feito para eliminar as histórias falsas.
A primeira coisa que muitos pensaram ao ler as novas regras do Facebook é que a razão de haver tantas fake news e vídeos de gatinhos fofos no feed de notícias é porque isso é, exatamente, o que as pessoas compartilham, curtem e comentam.
Um artigo controverso pró ou anti Trump, independentemente de quão inverossímil seja, provavelmente terá um engajamento alto de acordo com os novos padrões do Facebook simplesmente por causa do número de pessoas que sentirão necessidade de falar sobre isso e expor suas opiniões.
No início do ano, o Facebook fez um experimento no qual as notícias do feed principal foram divididas e um segundo feed foi criado com notícias de fontes críveis e pré-selecionadas. O feed recebeu o improvável e confuso nome “Explore”.
Como resultado, a incidência de fake news no feed de notícias subiu e o tráfego de grandes sites de notícias caiu. O “New York Times” investigou e descobriu, para citar apenas uma aspas de um editor de um site eslovaco, que “as pessoas normalmente não compartilham notícias chatas com fatos chatos”. Então, uma história completamente fabricada sobre como um homem muçulmano, inspirado por um bom samaritano que devolveu sua carteira perdida, avisou esse homem sobre um ataque terrorista iminente, tornou-se uma das histórias mais compartilhadas no Facebook da Eslováquia. Para piorar, quando a polícia fez um post oficial para desmentir a notícia, descobriu-se incapazes de fazer isso no feed de notícias, já que a polícia eslovaca estava classificada agora na aba Explore.
A solidificação do filtro bolha
O maior perigo do novo feed de notícias do Facebook, no entanto, é que ele serve apenas para fortalecer o efeito do filtro bolha.
Se você for um liberal de elite, há grandes chances de seus amigos também serem liberais de elite, e, assim, seu feed do Facebook consistirá em histórias que seus amigos compartilharam sobre coisas com as quais você concorda. Quanto mais contundentes forem essas histórias, mais engajamento elas receberão no novo sistema da rede social e mais elas aparecerão em seu feed de notícias.
Independentemente de você ser exposto continuamente a notícias do “Wall Street Journal” ou do “National Review” até agora, para acompanhar um ponto de vista alternativo, você não irá mais vê-las. O mesmo vale para os conservadores, que não serão mais atualizados sobre os artigos publicados pelo “New York Times” ou “Washington Post”.
Ou seja, estaremos todos trancados dentro de nossas próprias pequenas bolhas, onde as únicas notícias que veremos serão aquelas com as quais já concordamos – um estado que não beneficia absolutamente ninguém.
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O que é ainda pior é que muitos veículos vão, provavelmente, recorrer à estratégia antiga para criar tráfego: uma manchete feita apenas para o Facebook que seja muito mais exagerada e estridente do que o artigo em si, porque eles sabem que a maioria das pessoas não lê nada além da manchete antes de clicar em “curtir”.
A solução da Apple
Ainda que a Apple venha sendo criticada por seu fraco desempenho recentemente em inovação, o app Apple News, que vem pré-instalado em iPhones, pode ser exatamente o que o Facebook está procurando. O aplicativo mostra histórias de um conjunto de fontes de notícias legítimas e bem conhecidas e não é incomum que ele exiba uma matéria da “Fox News” sobre um evento recente ao lado de uma do “New York Times”.
Nem todas as histórias no Apple News pertencem à categoria das hard news – há muitas matérias sobre crimes e fofocas de celebridades – e elas raramente atingem uma grande profundidade. Porém, se você estiver procurando por um panorama geral sobre o que uma vasta gama de pessoas – pessoas de fora da sua própria caixinha – estão pensando sobre qualquer tópico, é uma ótima ferramenta.
O app é um formato que faria bem ao Facebook imitar caso desejasse quebrar o ciclo de veículos que precisam jogar com o sistema para promover tanto notícias falsas quanto excessivamente tendenciosas. Um primeiro passo seria lembrar das palavras de nosso amigo eslovaco, que “as pessoas normalmente não compartilham notícias chatas com fatos chatos”, e deixar de utilizar o engajamento como uma métrica para novas notícias.
O impacto dos influenciadores
Além de toda a polêmica envolvendo as fake news, as mudanças no Facebook também promoverão mais histórias pessoais em vez de notícias e conteúdo de negócios. Porém, o que é ruim para os negócios é bom para os influencers. Com menos material de veículos de mídia e negócios chegando organicamente aos feeds dos usuários do Facebook, a ação dos influenciadores sociais continuará a crescer.
No cenário das redes sociais, negócios e marcas ganham notoriedade em um período de tempo muito menor do que com a mídia tradicional. Com a estratégia certa, parcerias com influenciadores e outras ações, é possível mover o ponteiro de um negócio para muito além de apenas vendas e engajamento.
Como o algoritmo do Instagram está cada vez mais refletindo o do Facebook, pode-se esperar mais conteúdo orgânico de pessoas e menos de marcas e negócios em 2018. O que deve ser notado durante essa mudança é que os influenciadores são, e sempre foram, pessoas em primeiro lugar, e produtores de conteúdo em segundo. Todo influenciador, independentemente do nicho, tem seu próprio estilo de conteúdo que, por alguma razão, ressoou com sua audiência e fez com que ela explodisse. Esses influenciadores e suas audiências atrairão ainda mais atenção com seu conteúdo orgânico, enquanto o conteúdo similar e não pago de negócios e marcas tende a entrar em sofrimento.
Inicialmente, o Instagram e o Facebook eram cronológicos – ou seja, o conteúdo era exibido na ordem em que deveria ser visto. As estratégias eram menos complicadas e o controle estava com o usuário. Então, em 2016, uma mudança de algoritmo limitou o alcance de uma postagem a 20% de sua base total de seguidores, em média, e permitiu que o algoritmo decidisse qual conteúdo deveria ser exibido em seu feed. O fluxo livre de conteúdo se transformou em conteúdo regulado, e o alcance de perfis de negócios foi reduzido, fazendo com que eles precisem pagar por publicidade apenas para que seu conteúdo fosse visto.
O que vem agora é ainda menos conteúdo de mídia orgânica, o que irá prejudicar as empresas que não estão familiarizadas com as melhores práticas de marketing de influência. Podemos esperar mais anúncios pagos, menos posts orgânicos de marcas e mais parcerias com mega, micro e nano influenciadores.
A partir de agora, conectar-se com influenciadores que têm uma audiência crescente será algo premium para a maioria dos profissionais de marketing. Esta continuará a ser a maneira mais eficiente de influenciar o comportamento do consumidor por meio das redes sociais – e além delas. A chave para que os influenciadores sejam bem-sucedidos é ter um maior entendimento de seus seguidores e das ações das marcas.
A grande questão, porém, é se o Facebook começará a regular os influenciadores e tratar seu conteúdo orgânico da mesma maneira como trata o de negócios. Não se sabe se serão utilizados algoritmos para medir a quantidade de posts de influenciadores que parecem conter marcas, tanto no conteúdo quanto na legenda, e passar a penalizar seu alcance assim como o das empresas de mídia e os de negócios. Afinal, os influenciadores começaram suas contas como pessoas normais, conectando-se com amigos e familiares e não se associando a marcas. O tempo dirá.
Um novo ecossistema de marketing
As empresas que dependem do Facebook e do Instagram para construir negócios vão, definitivamente, perder com as mudanças, mas ainda há esperança. Para a maioria dos negócios, basta entender qual é a ambição de sua marca e produto e alinhá-la com o público-alvo.
O lado positivo das redes sociais é que, com os dados corretos e a escuta social adequada, é possível descobrir sua audiência e descobrir qual influenciador fala com ela. Escolher um influenciador que tem muitos seguidores em seu nicho, dizer a eles para postar algo sobre a sua grife ou produto e marcar a sua conta não é marketing de influência. A melhor maneira de utilizar a audiência de um influenciador é entender o seu objetivo, aprender sobre os fatores que a influenciam e ativar um profissional que mescle a narrativa de sua marca ou produto com a sua própria.
O futuro do marketing de mídia social
Para frear o compartilhamento de conteúdo falso, o Facebook decidiu mostrar menos postagens de negócios e mídia, e mais “conteúdo de pessoas” – isto é, conteúdo de usuários individuais. Mas, se os negócios executarem ainda mais marketing de influência por meio desses indivíduos que são influenciadores, como o Facebook vai identificar essa linha tênue? Essa é uma questão que deve ser respondida nos próximos meses, mas uma coisa é certa: o Facebook vai encontrar uma maneira de aumentar o valor de suas ações, e isso será feito às custas das marcas.
A principal conclusão disso tudo é que o poder está nas mãos dos influenciadores mais do que nunca.