O empresário paulista Marcelo Rodolfo Hahn, 49 anos, gosta de acelerar. O fundador, controlador e presidente-executivo da Blau Farmacêutica é tão conhecido no poderoso mercado de medicamentos quanto nas pistas de corrida – ele patrocina uma equipe de Stock Car e participa de competições nacionais e internacionais.
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Recentemente, no entanto, Hahn tirou o pé do acelerador de seus bólidos para se concentrar na direção dos negócios. Especializada em medicamentos biológicos e drogas sintéticas de alta complexidade, a Blau Farmacêutica está empenhada na consolidação de seus produtos no exterior (começando pelos cinco países vizinhos onde mantém subsidiárias) e nos preparativos para listar a empresa no Novo Mercado da bolsa. “Estamos buscando a liderança na América Latina”, diz o dono da Blau, controlador de 100% das ações da empresa. “Queremos que a companhia seja reconhecida mundialmente.”
Nada mau para uma empresa que nasceu como uma pequena importadora de preservativos, 30 anos atrás. Hahn tinha 19 anos e vendeu seu carro para começar o negócio, um Santana Quantum que rendeu o equivalente a US$ 20 mil. Esse foi todo o capital de largada da empresa, que começou se chamando Blaüsiegel Comércio, Exportação e Importação. Corria o ano de 1987, e o Brasil – como o resto do mundo – estava alarmado com o avanço da aids, o que gerou um boom no consumo de camisinhas.
“As duas fábricas que existiam no país não tinham capacidade para atender a demanda”, lembra o empresário. Ele enxergou ali uma oportunidade. Começou a importar preservativos masculinos, mas tratou de dar um toque particular naquele cenário de medo, quase terror: criou uma embalagem menos sisuda, diferente dos demais produtos que já estavam no mercado, e passou a vender as camisinhas em caixas com 12 unidades. “A ideia era fazer um produto voltado para o lado erótico.”
Cheio de energia, ele exercia quase todas as funções da companhia: percorria as redes para vender o produto, fazia mala direta, cuidava do marketing. Por causa da peregrinação em grandes cadeias de farmácia e varejo, para oferecer seu produto, acabou por conhecer como poucos os players do mercado.
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Além de inovar na apresentação do produto, Hahn teve a ideia de criar uma marca própria para vender os preservativos que importava: Preserv. “Aprendi cedo a não vender produtos com marcas dos outros. Até hoje somos 100% proprietários de todas as marcas que produzimos”, ensina.
A aposta mostrou-se certa já nos primeiros anos: a Preserv explodiu em vendas, rapidamente superou concorrentes mais famosas e virou case de sucesso.
INFLUÊNCIA GENÉTICA
Apesar da exitosa operação como importador e distribuidor de cosméticos e produtos para a saúde, as raízes farmacêuticas de Hahn falaram mais alto: poucos anos depois, o empresário começou a investir na pesquisa e desenvolvimento de medicamentos. E tratou de fazê-lo em áreas diferentes daquelas em que atuaram seus antepassados farmacêuticos. “Meu princípio era não competir com meu pai. Por isso, fui para produtos diferentes”, explica. A Ariston, farmacêutica de seu pai, produzia medicamentos tradicionais, como diclofenaco (anti-inflamatório), dipirona (analgésico e antitérmico) e cortisonas (imunossupressores).
Mesmo deitando suas lentes sobre outros segmentos, Hahn admite que a influência familiar falou alto. “Eu praticamente nasci no chão de uma indústria farmacêutica”, diz. Seu avô e seu bisavô também tiveram empreendimentos nessa área. O bisavô tinha uma indústria de remédios na Alemanha nos anos 1900, enquanto o avô químico montou uma empresa do ramo na Argentina na década de 1940. Depois seu pai migrou para o Brasil e seguiu no negócio, com a Ariston Farmacêutica. “Infelizmente, ele não progrediu. Encontrou muitas dificuldades no país e acabou saindo do mercado.”
A despeito da experiência negativa do pai, os genes da origem farmacêutica eram dominantes em Marcelo Hahn: depois de importar e distribuir produtos, a Blau (nome que passou a adotar em 2010 e que significa azul, em alemão) começou a pesquisar, desenvolver e lançar seus próprios medicamentos. Inicialmente, foram hemoderivados. Em seguida, vieram remédios oncológicos e produtos de proteína recombinantes – nestes, a empresa foi pioneira.
Hoje, o grupo tem posição de destaque entre as empresas farmacêuticas brasileiras no canal no retail (não varejo). Ou seja: abastece diretamente hospitais e clínicas com drogas para enfermidades graves, em áreas como oncologia, infectologia, hematologia e nefrologia. São medicamentos de alta complexidade como antibióticos, injetáveis, anestésicos, vacinas, soros hiperimunes, hemoderivados, hormônios e anticoagulantes. “Apenas 5% do faturamento vem do varejo”, afirma o empresário, referindo-se ao mercado de farmácias.
As camisinhas Preserv, que deram origem à empresa, ainda estão no portfólio da companhia, mas atualmente representam menos de 1% da receita. E não é porque o produto tenha baixo volume de vendas, já que a Blau fornece preservativos para campanhas do governo. Ocorre que, devido à alta complexidade da linha de medicamentos, a companhia tem produtos com preço médio elevado, o que faz a receita dos preservativos se diluir no cômputo total. “Alguns de nossos produtos chegam a custar R$ 800 o frasco”, diz ele.
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Com três fábricas no Brasil, a companhia tem no seu portfólio ativo 72 moléculas, 81 produtos e 177 apresentações comerciais. Esse patrimônio farmacológico é resultado de uma constante injeção de recursos na área de pesquisa e desenvolvimento: são cerca de 70 colaboradores trabalhando na área, que absorve 3,5% da receita anual da companhia.
NA DIANTEIRA
A Blau já assegurou liderança de mercado em dez medicamentos com marcas próprias: Imunoglobulin, Eritromax, Hepamax, S. Ribavirin, Oprazon, Oxanon, Doclaxin, Filgrastine, Metrexato e Taxofen. Essas drogas respondem por cerca de 80% da receita.
No fim de 2017, a empresa anunciou seu ingresso no mercado de dermocosméticos, com o lançamento de uma toxina botulínica (que ficou famosa com a marca Botox) de produção própria.
Além das unidades no Brasil, a Blau tem subsidiárias no Uruguai, Colômbia, Argentina, Chile e Peru e exporta para outra dezena de países. Está ampliando a capacidade produtiva das três fábricas no Brasil (São Paulo e Cotia) e concluindo uma nova planta de biofármacos alinhada com as mais rígidas regras internacionais.
Um dos muitos fronts em que a Blau está apostando são medicamentos para a reprodução humana assistida, como a fertilização in vitro. “Gostamos das coisas difíceis” brinca.
EMPRESA: Blau Farmacêutica
FUNDAÇÃO: 1987
SEDE: Cotia (SP)
NÚMERO DE FUNCIONÁRIOS: 1.100
RECEITA LÍQUIDA: R$ 492 milhões (janeiro a setembro de 2017, último balanço divulgado)
Sucesso (e susto) nas pistas
Marcelo Hahn é apaixonado por automobilismo desde muito jovem. Foi piloto da Ferrari no Troféu Maserati de 2005 a 2008. Com o fim da categoria, ingressou em campeonatos de GT3 no Brasil e no exterior. Em 2013, ao lado de Allam Khodair (o “Japonês Voador”), sagrou-se campeão sul-americano de GT3 a bordo de um Lamborghini Gallardo. Coleciona vitórias no Mercedes-Benz Challenge, Pirelli World Challenge, Fara USA e Porsche GT3 Cup. Em 2017, competiu na GT Open, um dos principais campeonatos de carros de Gran Turismo da Europa.
Marcelo já transmitiu a paixão pela velocidade à família: o filho, Christian, também é piloto. Ambos já correram juntos diversas vezes, chegando a vencer as 500 milhas de Homestead, nos EUA, em 2015. Naquele ano, o empresário sofreu um acidente espetacular nas primeiras voltas da quarta etapa do Mercedes-Benz Challenge, realizada em Santa Cruz do Sul (RS). Numa tentativa de ultrapassagem, Hahn foi lançado contra a barreira de pneus em alta velocidade. Ninguém se feriu, mas seu carro ficou totalmente destruído.
Além da presença do empresário nas pistas, o automobilismo brasileiro tem a Blau Farmacêutica como grande patrocinadora: há mais de uma década, a companhia apoia a Stock Car – tem uma equipe própria competindo na categoria, a Blau Motorsport.
Reportagem publicada na edição 57, lançada em março de 2018