Vince Steckler mora na mesma rua de Mark Zuckerberg em Palo Alto. Suas casas têm uma coisa em comum, além do endereço do Crescent Park: elas estão cheias de aparelhos inteligentes.
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“Tenho quase 40 dispositivos conectados em casa”, diz Steckler, CEO da Avast Software. Sua residência é um modelo real da visão que a maior empresa tecnológica tcheca parece seguir nos próximos anos. O negócio começou com programas antivírus, cresceu para 435 milhões de usuários e vê seu futuro na proteção de todas as coisas que você conectou à internet em casa – de monitores de bebês, webcams, televisores, termostatos e geladeiras até a campainha da porta da frente.
É impossível proteger cada dispositivo individualmente, e é por isso que o Avast está mirando um nível mais alto: a rede doméstica e todos os fios que levam ao seu roteador wi-fi. A solução da empresa, batizada de Smart Home Security, usa inteligência artificial para identificar e bloquear ameaças: por meio do machine learning, ela “escuta” continuamente seus fluxos de dados e procura anomalias.
A estimativa é que o número de dispositivos conectados à chamada Internet das Coisas (IoT) em todo o mundo praticamente triplique até 2025 e chegue a 75 bilhões. Algumas análises sugerem que a família norte-americana média terá mais de 30 dispositivos conectados até 2020. Não há dúvida de que muitos deles serão vulneráveis, uma vez que os produtores estão inundando o mercado com novos dispositivos a uma taxa esmagadora, e a segurança não é sua maior prioridade.
Naturalmente, a IoT se tornou um tópico importante para o Avast. “Estamos trabalhando nisso há algum tempo. Investimos muito dinheiro em pesquisa e desenvolvimento. Todos estão seguindo esse caminho, mas, como começamos cedo, esperamos chegar primeiro”, afirma Steckler, que passa cerca de 10 dias por mês em sua casa na Califórnia e o resto viajando ou em seu escritório em Praga.
O empresário de 59 anos, com sua cabeça careca característica e bom humor, ajudou a programar softwares para armas nucleares norte-americanas na década de 1980. Mais tarde, trabalhou para a Symantec, supervisionando seus negócios nos mercados asiáticos a partir de Singapura. Em 2009 ele se mudou para a República Tcheca, onde, como diz, encontrou um “diamante bruto”.
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Steckler foi contratado para liderar a Avast por seus fundadores Eduard Kučera e Pavel Baudiš, ajudando-os a transformar uma pequena empresa de 40 pessoas em uma grande corporação, que emprega 1.700 pessoas em todo o mundo, e a abrir o capital. A Avast estreou como o maior IPO de tecnologia europeia na Bolsa de Valores de Londres em maio deste ano, com um valor de mercado de mais de US$ 3 bilhões.
A Avast é um exemplo brilhante de 30 anos de construção do capitalismo em um país pós-comunista: Baudiš e Kučera passaram de um projeto que era um passatempo de fim de semana para uma corporação que protege quase meio bilhão de pessoas, sem privatização, subsídios ou jogo sujo.
Sua história começou na era comunista, quando o regime proibiu a propriedade privada. No final da década de 1980, a dupla de empreendedores deixou o Instituto de Pesquisa de Máquinas Matemáticas (RIMM) para fundar a cooperativa Alwil sob a União Socialista da Juventude (a única entidade legal de propriedade privada da Tchecoslováquia durante os tempos comunistas), e começou uma empresa real após a revolução de 1989.
Na virada do milênio, a Avast quase faliu quando a gigante norte-americana Symantec se expandiu para a Europa Oriental, tentando varrer os mercados. Com preços mais baixos e links estreitos com empresas internacionais, a Symantec quase conseguiu. A Avast só foi salva com a distribuição gratuita de software antivírus para as famílias e com foco nas pequenas e médias empresas.
Dez anos depois, a Avast foi muito mais forte e avançou. Em 2010, Steckler trouxe o primeiro investidor, a Summit Partners. Em 2012, uma tentativa de oferta de Wall Street caiu e o IPO foi cancelado no último momento devido ao desinteresse do investidor e à instabilidade do mercado. Em 2014, surgiu um novo investidor, a CVC Capital Partners, avaliando a empresa em US$ 1 bilhão, e, dois anos depois, a Avast comprou sua rival local, a AVG Technologies, retirando-a da NYSE. Este ano, a estreia da Avast na Bolsa de Valores de Londres fez com que os investidores valorizassem a empresa em US$ 3,1 bilhões.
Todo mês, a Avast protege seus usuários de mais de dois bilhões de ataques em PCs e celulares, e não apenas de vírus. A empresa de antivírus transformou-se em uma solução completa de segurança cibernética com machine learning e tecnologia em nuvem. “É como olhar sob o capô de um carro novo. Você vê uma capa de plástico apenas insinuando o motor e todos os componentes importantes”, acrescenta Steckler. “A mesma coisa está acontecendo hoje com o software. Tem que fazer tudo, mas, ao mesmo tempo, parecer muito simples por fora para os usuários. Poucos querem ver o que realmente está acontecendo, eles só estão interessados nos resultados.”
O que também está sob o capô é um lucro surpreendente: no ano passado, a Avast alcançou US$ 780 milhões em receita e superou ligeiramente a marca de US$ 450 milhões do EBITDA. No primeiro semestre de 2018, a empresa viu seu EBITDA ajustado crescer 10,6%, ou US$ 221 milhões.
De onde vem todo esse dinheiro, quando a grande maioria dos usuários não paga um centavo pelos produtos Avast? Os ganhos vêm de versões premium, usadas por 5% da base de usuários e várias colaborações de negócios, como, por exemplo, com Google e Yahoo. A Avast recomenda o Chrome para seus usuários e a empresa tcheca recebe uma comissão se decidir eles decidirem instalá-lo. E, no caso de produtores de celulares como Sony ou Huawei, se os usuários executarem os antivírus pré-instalados em seus smartphones, provavelmente verão o slogan “Powered by Avast”.
Isso coloca Baudiš, de 58 anos, e Kučera, de 65 anos, entre os tchecos mais ricos do mundo. O primeiro acumulou bilhões graças ao IPO. A dupla trabalha lado a lado há mais de três décadas. Qual é a receita deles para o sucesso? “Nunca um chefe tratou a preguiça como uma virtude”, ri Kučera.
Eles aperfeiçoaram essa atitude ao longo dos anos, adicionando paciência ao seu repertório depois que a tentativa inicial de abertura de mercado em Wall Street deu errado, seis anos atrás. Este ano Steckler escolheu Londres em vez de Nova York e ele tem uma explicação simples para isso.
“Nós já somos grandes demais e estamos preparados para uma empresa de tecnologia que está indo para Wall Street. Isso é para empresas com receita de cerca de US$ 100 milhões e crescimento ao redor de 30%. Somos uma empresa muito mais madura. Nossas receitas são quase oito vezes maiores e temos um alto crescimento de um dígito”, diz ele. Os investidores norte-americanos valorizam muito as startups tecnológicas que geralmente geram pouco ou nenhum lucro e, em vez disso, apenas gastam dinheiro – o oposto da Avast.
“Os investidores europeus geralmente não estão apostando no alto crescimento, eles estão mais interessados nos fundamentos financeiros. Os investidores norte-americanos em IPOs de tecnologia agem quase como vice-presidentes. Eles não investiram muito e estão procurando uma apreciação rápida, em contraste com os investidores europeus que estão fazendo cheques muito maiores”, acrescenta Steckler.
No entanto, as ações da Avast caíram após o IPO de Londres. O preço da oferta de 250 pence caiu abaixo de 210 pence, mas últimas semanas ultrapassou 260. A queda inicial, é claro, não agradou a Steckler como CEO e acionista, mas ele estava correto em permanecer otimista.
Ele diz que tal declínio era esperado. O AVG e o Facebook seguiram um caminho semelhante e experimentaram quedas ainda mais brutais. Analistas do Barclay e do Credit Suisse compartilham o otimismo de Steckler. Suas previsões mostram as ações da Avast subindo para a marca de 300 pence nos próximos meses. Os banqueiros da Jefferies dão à Avast uma recomendação de “compra” e sua opinião é que o valor de mercado da empresa pode dobrar nos próximos três a quatro anos.
“Tenho certeza que a Avast está indo na direção certa”, diz Steckler. “Temos uma empresa que é fundamentalmente sólida e espero que o mercado seja receptivo a isso. Presto atenção ao sucesso da empresa e o preço das ações seguirá.”