“Pense fora do garrafão”. Mais que o título de um curta-metragem, primeiro fashion film desenvolvido pela NBA no mundo, este poderia ser o lema do escritório brasileiro da poderosa liga de basquete americana. Seis anos depois de aterrissar em território nacional, a empresa, cada vez mais, mira para fora da quadra para estabelecer-se como uma marca de lifestyle, ligada ao universo da moda, do entretenimento e da cultura.
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O curta, um projeto inédito idealizado pela NBA Brasil para divulgação de suas lojas próprias, tem dois minutos e mescla música, comportamento, skate, game, estilo e, claro, basquete. Lançado em abril e premiado no La Jolla International Fashion Film Festival, realizado em julho na Califórnia, ele é apenas uma das ações organizadas recentemente pela liga por aqui. Várias outras medidas além-garrafão foram adotadas, todas tão bem-sucedidas que o país foi considerado pela matriz como o segundo mercado estratégico da NBA no mundo, atrás apenas da China. “Foram usados mais de 45 kpis [key performance indicators] para entender a maturação de cada negócio no mundo, como potencial econômico, ecossistema do jogo, parcerias locais e potencial de expansão, entre outros”, diz o head da liga no país, Rodrigo Vicentini, sentado no sofá de uma sala de reuniões do WeWork WT Morumbi, em São Paulo, onde a marca resolveu alugar um espaço há três meses – o escritório nacional funciona no Rio de Janeiro. “Além disso, fomos também eleitos o país mais inovador do mundo.”
Entre os projetos que levaram a esse título está a NBA Fan Zone no Rock in Rio, no ano passado, um espaço de mil metros quadrados que misturava esporte e tecnologia e no qual os visitantes puderam ver a réplica de um vestiário da NBA e disputar uma competição virtual de arremessos. “Inicialmente é possível pensar: o que uma liga de basquete tem a ver com um festival de rock? A resposta é que a música está no dia a dia dos nossos fãs. Popstars estão sempre nos jogos da NBA. E a partida é muito musical, é entretenimento”, diz Rodrigo. “O espaço recebeu mais de 320 mil pessoas que não estavam no festival para aquilo. Elas estavam lá para assistir a shows. Isso mostra que o público quer se conectar com a marca. A NBA é uma love brand.”
Também fazem parte das ações as duas edições da NBA Finals em São Paulo, espaço montado em um casarão na Avenida Paulista que reuniu fãs para assistir às finais das temporadas de 2017 e 2018 (neste ano, 10 mil pessoas passaram por lá); a NBA House, casa temática com shows, torneios e atividades tecnológicas que funcionou no Boulevard Olímpico durante a Rio 2016 e que recebeu mais de 80 mil pessoas, e a quadra digital que sediou o lançamento mundial do game NBA2K19, na NBA Fan Zone da última Game XP, maior evento de jogos da América Latina, realizado no Parque Olímpico em setembro.
Muitas dessas ações foram feitas quando o executivo Arnon de Mello Neto tocava a operação nacional da liga. Formado em economia pela Universidade de Chicago, com mestrado em administração pública em Harvard e MBA pelo MIT, ele comandou a NBA Brasil até fevereiro de 2017, quando foi promovido a VP na América Latina. “Quando abrimos o escritório brasileiro, em 2012, o principal objetivo era estar mais perto dos fãs e de um mercado que tinha muito potencial”, diz Arnon. “Estar fisicamente no país era uma vontade antiga, e hoje vemos o quanto a decisão foi acertada. A NBA cresceu verticalmente e o basquete vem fazendo o mesmo temporada a temporada, dentro e fora das quadras. Isso é resultado de um planejamento bem feito e de uma equipe capacitada, que começou pequena. Temos buscado trazer inovação, criando novas formas de falar com os fãs, aumentando a distribuição de jogos na TV e nas plataformas digitais, promovendo eventos, inaugurando lojas, proporcionando experiências”, explica.
Dentro e fora da quadra
A missão de fortalecer a liga no país contava com uma vantagem: o brasileiro é um apaixonado pelo esporte. Segundo dados do Ibope Repucom, 30 milhões de pessoas se declararam fãs da NBA no país, e nosso interesse pelo campeonato aumentou 17% entre 2016 e 2017. “Mas a NBA vai muito além do esporte. O consumo da marca no Brasil não é só através do basquete. Notamos que as pessoas querem consumir a NBA independentemente da forma como a marca se traduza para elas”, afirma Rodrigo Vicentini.
A empresa não fala em números regionais, mas a estimativa é de que no ano passado o escritório brasileiro tenha faturado R$ 100 milhões – o crescimento foi de 300% em quatro anos. O número ainda é aquém do registrado pelo mercado chinês (US$ 150 milhões em 2017) e quase incomparável ao da matriz, cujo faturamento na temporada 2016/2017 foi de US$ 7,3 bilhões, segundo levantamento da consultoria alemã Statista. No entanto, o potencial no país é enorme. “Nosso crescimento é vertical em todas as linhas de negócios: patrocinadores, receitas de transmissão, números de audiência, números de lojas, vendas nas lojas… O aumento de todas as receitas locais está acima de dois dígitos”, diz Rodrigo.
É possível medir isso levando em conta a audiência das transmissões dos jogos – são mais de 300 partidas por temporada. Segundo o Ibope, a audiência do SporTV cresceu 68% na temporada que encerrou no meio deste ano em relação à do ano passado, enquanto na ESPN o aumento foi de 40% – a emissora divulgou ainda que as finais da temporada 2017/2018 tiveram o maior índice de audiência da história do canal no Brasil. E já somos o segundo mercado mundial no ranking de assinantes do app NBA League Pass, que transmite partidas por streaming, com exceção dos EUA.
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Outra vertente que cresce aqui é a feminina. No Instagram e no Facebook, o salto foi de 13% em relação a 2017. Dados de março da Nielsen Sports mostram que elas compõem 39% dos fãs da NBA no país (48% delas se declaram fanáticas). Isso se traduz, claro, em negócios: as quatro unidades da NBA Store no país (Rio, São Paulo, Campinas e Mogi das Cruzes) acabam de lançar uma coleção feminina – a liga já lançou uma coleção cápsula em parceria com a C&A em 2016. Ela é composta por 25 tipos de produtos, entre vestidos, camisetas e regatas, de times como Lakers, Chicago Bulls e Golden State Warriors (atuais campeões).
Para atrair mais fãs, em março a liga lançou o programa NBA Freestyle. Exibido às quintas-feiras à noite pelo Twitter, o semanal tem basquete, moda e comportamento como temas e é o primeiro programa próprio para um mercado fora dos EUA. A próxima tacada é o NBA Café, uma mistura de restaurante temático com sports bar nos moldes do que já existe em Barcelona. Embora o projeto esteja cercado de mistério, é certo que será em São Paulo (“o local já está fechado”, diz o head do escritório nacional), terá telões que vão transmitir os jogos e deve abrir suas portas no primeiro semestre do ano que vem. “Estamos há dois anos estudando a ideia e pensando em parceiros, cardápios… Vai funcionar como uma extensão da marca. O objetivo é encantar o fã, oferecer a ele uma experiência agradável.”
Para José Colagrossi Neto, diretor do Ibope Repucom e especialista em marketing esportivo, a estratégia da marca está sendo bem construída. “A NBA sempre conseguiu se comunicar muito bem dentro do esporte, mas com ações ‘fora da quadra’ agora consegue também conversar com diferentes públicos e de diversas maneiras. Deixa de ser apenas uma liga de basquete e acaba sendo reconhecida como uma referência de tendências, de moda e estilo. Serve como parâmetro a outros esportes com o mesmo potencial.”
Tudo isso não quer dizer que a empresa tenha se descuidado do esporte em si. A liga anunciou o lançamento do NBA Basketball School, programa que pretende promover o desenvolvimento da modalidade entre jovens de 9 e 17 anos, com a implantação de núcleos de escolinhas do esporte em clubes, academias e escolas. Os alunos serão orientados por técnicos capacitados pela liga, com metodologia desenvolvida pela NBA. A ideia é, além de impulsionar o basquete e os valores do esporte, descobrir e lapidar atletas. A operação nacional da empresa também já realizou duas edições da Jr. NBA League no Brasil, campeonato que reúne mais de 600 estudantes de 42 equipes de escolas particulares e públicas e de projetos sociais.
Além disso, é um case de marketing esportivo a parceria de quatro anos que a NBA Brasil tem com a LNB, a Liga Nacional de Basquete, que promove o NBB (Novo Basquete Brasil) e outros campeonatos nacionais. A princípio, a ideia era que a liga americana ajudasse a brasileira comercialmente, mas o negócio passou a envolver capacitação de técnicos, atletas e árbitros. Jogadores e comissão técnica de franquias da NBA vêm ao Brasil dar clínicas de basquete.
“Os benefícios da estratégia da NBA são crescer, aumentar sua base de fãs e valorizar ainda mais o produto”, afirma Colagrossi. “A NBA alcançou isso globalizando a transmissão dos jogos, oferecendo experiências únicas a seus fãs, tornando seus supercraques celebridades globais que extrapolam o esporte, estando mais perto dos fãs e construindo
uma marca que representa um estilo de vida. Identificamos em nossas pesquisas tanto fãs apaixonados por basquete como pessoas que passaram a seguir a NBA por interesses que vão além da quadra – e que um dia serão fãs também.” Cesta – e de três pontos – para a NBA!
Reportagem publicada na edição 63, lançada em novembro de 2018
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