Peça a uma pessoa comum para pensar sobre o espaço e ela imaginará missões a Marte e filmes de ficção científica, como ‘2001: Uma Odisséia no Espaço’ ou ‘Star Wars’.
Um aspecto das viagens espaciais que, no entanto, não capturou exatamente a imaginação do público é o trabalho pesado necessário para transportar cargas entre órbitas. As embarcações que realizam essa tarefa são conhecidas como space tugs, ou rebocadores espaciais, em tradução livre.
Fundada em 2017 pelo imigrante russo Mikhail Kokorich, a Momentus, empresa de space tugs foi lançada a partir da aceleradora de startups Y Combinator, firmou uma parceria com a SpaceX e tem a NASA e a Lockheed Martin LMT como primeiros clientes. A Momentus afirma ter US$ 90 milhões em contratos assinados e US$ 1,1 bilhão em negociação.
Embora os lançamentos de foguetes possam receber toda a glória, as space tugs são elementos essenciais para expandir a economia espacial. Anteriormente, os custos para lançar um foguete carregando apenas um ou dois satélites eram altíssimos, o que impedia empresas de satélites menores de se lançarem no espaço. Agora, essas empresas podem pegar uma carona em um foguete SpaceX Falcon 9 carregando dezenas de satélites. A space tugs Vigoride da Momentus, também a bordo, entregará esses pequenos satélites ao destino final entre as órbitas, enquanto coleta cargas usadas que podem ser posteriormente reaproveitadas ou reutilizadas.
A Momentus anunciou recentemente que iria abrir o capital neste ano via SPACs. Na transação, a empresa é avaliada em US$ 1,2 bilhão.
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Em entrevista exclusiva a Forbes, Kokorich fala sobre a economia do espaço, por que abrir o capital via SPAC é mais benéfico do que um IPO tradicional e as preocupações ambientais sobre a economia ciberal.
Karl Kaufman: Como você explicaria o modelo de negócios da Momentus para uma pessoa comum?
Mikhail Kokorich: Ajudamos as empresas a operar satélites no espaço. Assim que os satélites forem enviados ao espaço por foguetes, como o Falcon 9, nossos veículos irão transportar os satélites para órbitas personalizadas. Também planejamos reposicionar, reabastecer, consertar ou desorbitar os satélites ao final de sua vida útil. Nossos clientes hospedarão sua carga útil (por exemplo, câmeras ou transmissores de rádio) em nossos veículos, enquanto forneceremos energia e orientações.
Kaufman: Por que você escolheu a rota SPAC para abrir capital? Quais são os benefícios disso em relação à rota tradicional de IPO?
Kokorich: Durante o processo de fusão via SPAC, uma empresa pode comunicar seus planos e projeções ao mercado, o que é um desafio durante o processo de IPO. Isso é especialmente valioso para empresas de crescimento rápido, que valorizam muito o crescimento futuro. Além disso, uma empresa pode negociar e testar o seu valuation durante o processo do PIPE antes de se tornar pública e ir ao mercado. O PIPE é comum em negócios SPAC e também sinaliza ao mercado que a avaliação foi negociada com investidores profissionais e de boa reputação.
Kaufman: Como mudou a economia espacial nos últimos anos e quais são as oportunidades de mercado que você enxerga no setor?
Kokorich: Os números que caracterizam o desenvolvimento da economia espacial são impressionantes. Em 2010, apenas 70 satélites foram lançados. Neste ano, o número é superior a 1 mil satélites. O custo de lançamento caiu quase dez vezes, enquanto o número de empresas desenvolvendo projetos de satélites aumentou em pelo menos dez vezes. As operadoras de satélite estão desenvolvendo dezenas de aplicativos.
Nos últimos anos, toda a indústria espacial tem esperado pelo que será a corrida do ouro do espaço. Poderíamos falar para sempre sobre a importância do espaço para a humanidade e como as tecnologias desenvolvidas para a atividade espacial ajudam a resolver os problemas da Terra, como imagens de satélite, clima, televisão e comunicações, mas sem uma verdadeira ‘febre espacial’ – com enormes recursos financeiros sendo despejados em curto prazo, energia empreendedora e talento de engenharia na indústria espacial – não será possível iniciar uma nova corrida no espaço.
Atualmente, toda a economia espacial – incluindo foguetes, comunicações, imagens, satélites e voos tripulados – não ultrapassa US$ 500 bilhões, o que é menos de 0,6% da economia global. O tamanho atual da economia espacial não é suficiente para causar mudanças drásticas na economia global. Se vários fatores coincidirem, como um aumento acentuado no consumo de conteúdo multimídia em veículos e um rápido crescimento na Internet das Coisas (IoT, em inglês), os serviços de telecomunicações por satélite podem crescer no médio prazo, para US$ 1 trilhão ou mais.
O alto custo dos ativos espaciais, causado principalmente pelo alto custo de lançamento (historicamente chegando a dezenas de milhares de dólares por quilo), foi o principal obstáculo às aplicações espaciais do passado. Para a atual industrialização do espaço e surgimento de novos serviços e produtos espaciais (muitos dos quais substituirão os atualmente produzidos na Terra), precisamos de uma revolução nos custos de lançamento e transporte de cargas no espaço.
Kaufman: Quais são as preocupações ambientais na economia espacial?
Kokorich: A atividade humana no espaço tem muitas implicações ambientais. Foguetes populares do passado, como o Proton russo, ou versões antigas da Long March chinesa, usavam componentes extremamente tóxicos que tinham impactos negativos consideráveis sobre a ecologia.
Os foguetes modernos usam componentes mais ecologicamente corretos, como querosene, metano ou hidrogênio. Foguetes reutilizáveis têm o benefício adicional de não contaminar o oceano. Muitos satélites também criam um risco considerável de lixo ambiental ou espacial. Por exemplo, o mercúrio é um elemento químico usado por algumas empresas de propulsão em seus sistemas que acaba contaminando a atmosfera da Terra. Componentes químicos de satélites ou gases de alta pressão para propulsão elétrica também podem criar um risco de explosão e perigos de detritos.
O problema dos detritos espaciais pode se tornar crítico nos próximos anos. A principal fonte de detritos não é a colisão de satélites, mas as explosões de combustível residual nos estágios superiores. A Momentus usa a água como um componente de propulsão. A água apresenta risco mínimo para o meio ambiente e para a criação de detritos.
Kaufman: Qual será a principal força motriz por trás da inovação contínua nos negócios do espaço?
Kokorich: Durante a corrida entre a União Soviética e os Estados Unidos, a competição entre os dois países foi o motor para a inovação no setor. Quando o Muro de Berlim caiu, a necessidade de competir evaporou e toda a indústria espacial estagnou por mais de duas décadas. Eventualmente, o capital privado se tornou a força motriz da inovação e criou um novo modelo para a economia espacial.
Agora, vemos dezenas, senão centenas de novos participantes no negócio espacial. Essas empresas exploram muitas áreas novas, da comunicação tradicional e observação da Terra à mineração de asteroides no estilo ficção científica e turismo espacial. Um dos principais facilitadores da nova economia espacial é a disrupção no transporte espacial, que reduziu as barreiras de entrada e tornou viáveis muitas novas aplicações espaciais.
A oportunidade de mercado é enorme, com a economia espacial projetada para crescer para US$ 1,4 trilhão na próxima década, e potencialmente mais ainda no futuro. Com qualquer grande oportunidade, vem o risco associado, e certamente haverá uma competição acirrada ao longo do caminho. A Momentus espera que, ao entrar em contato com os mercados de capitais, tenha acesso aos recursos que podem impulsionar suas ambições.
Se o espaço é, de fato, a próxima corrida do ouro, a Momentus estará entre as primeiras a se vender como empresa de infraestrutura na “fronteira final”. Os foguetes podem ter toda a glória, mas alguém precisa ser pago para fazer o trabalho pesado.
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