Investimentos em inovação são cruciais para organizações brasileiras que desejam ganhar vantagem competitiva – ou, pelo menos, sobreviver no atual clima de instabilidade socioeconômica. Mas o país ainda apresenta defasagens em inovações quando comparado a outros do mesmo tamanho e estágio de desenvolvimento.
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No início da última década, houve um aumento nos investimentos do governo em ciência e tecnologia e um enquadramento jurídico, inspirado na lei francesa de inovação. Contudo, as coisas mudaram consideravelmente desde então: entre 2011 e 2018, o Brasil caiu em 17 posições no Global Innovation Index (GII), estudo publicado pela Cornell University, a escola de negócios francesa Insead e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual. O novo relatório da GII, divulgado recentemente, classificou o país na 64ª posição, com os piores indicadores entre os países do BRIC.
Mas por que é tão difícil inovar no Brasil? Para começar a achar respostas para essa pergunta, questionei a Luiz Ricardo Marinello, um advogado focado em propriedades intelectuais em São Paulo, sobre os desafios que as organizações locais enfrentam, especialmente quando se trata da interação entre centros de pesquisa, universidades e o setor privado – a chamada “hélice tríplice”.
De acordo com Marinello, há uma desconexão entre os interessados e, em parte, isso se deve à estrutura jurídica que carecia dos mecanismos exigidos para a implementação na prática. Outras barreiras críticas para levar inovação para um nível nacional incluem uma grande quantidade de impostos, incentivos fiscais insuficientes que muitas vezes não alcançam a todos, falta de mão de obra qualificada e redução de orçamentos governamentais para ciência e tecnologia.
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“Em uma recessão, o governo vê como uma boa saída cortar gastos nessas áreas, mas isso não poderia estar mais longe da verdade. Inovações agregadas à criação de trabalho podem gerar oportunidades a médio e longo prazos e fortalecer a habilidade do país de se proteger de futuras desacelerações”, diz Marinello.
Contudo, mudanças recentes no cenário jurídico para inovação podem ajudar, potencialmente, a melhorar a situação atual.
Um novo enquadramento jurídico para inovações
A lei brasileira de inovação tecnológica foi inicialmente introduzida em 2004. As medidas pretendiam incentivar a cooperação entre governo, academia e empresas. Tais iniciativas se tornariam – idealmente – ofertas comerciais.
A primeira medida jurídica para as inovações procurava aumentar a participação de instituições públicas de pesquisa no processo como um todo, estimular essas iniciativas junto a empresas, apoiar inventores independentes e criar fundos específicos, assim como parques e centros tecnológicos em que partes interessadas locais poderiam reunir recursos de pesquisa e desenvolvimento para gerar impacto.
Ainda que tudo isso pareça ótimo em teoria, a aplicação dessas provisões é uma história completamente diferente, segundo Marinello. “A criação de um quadro jurídico para apoiar a inovação foi uma atitude bem intencionada, mas, na prática, não funcionou. Isso aconteceu porque a lei não era boa o suficiente sozinha: para funcionar, mecanismos precisavam ter sido criados.”
Atualizações na lei de inovação em 2016 e 2018 pretendiam introduzir tais mecanismos. Essas são regras para estimular e induzir acordos entre organizações públicas de pesquisa e o setor privado, trazendo mais segurança jurídica às partes em torno das tecnologias desenvolvidas em conjunto.
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A revisão inclui mais regras explícitas do engajamento das partes interessadas, assim como mais liberdade das mesmas para concordar com os termos do uso de propriedade intelectual resultante de parcerias. Isso pode incluir, por exemplo, a concessão de todos os direitos às organizações do setor privado para produtos e serviços criados sob esses projetos.
Essas inovações também podem significar que os departamentos governamentais estão autorizados a contratar, diretamente, serviços como parte de projetos de inovação – anteriormente apenas organizações sem fins lucrativos podiam providenciar esses serviços. Um item controverso do cenário original estabeleceu que gastos com pesquisa devem ser proporcionais aos resultados obtidos em trabalhos de pesquisa e desenvolvimento. Essa inconsistência foi abordada e, mesmo que os resultados não sejam alcançados devido ao risco tecnológico, o financiamento será autorizado.
Outras novidades incorporadas às recentes emendas incluem uma dispensa de licitação pública para atividades de pesquisa e desenvolvimento que custem até R$ 80 mil (US$ 20.767), enquanto o uso de edifícios públicos para projetos de inovação se tornou mais simples e os gastos relacionados a essas iniciativas são agora dedutíveis.
Questões não resolvidas
As recentes mudanças na estrutura significam que não há mais demandas legais para o assunto, mas Marinello aponta que existem outras questões práticas que permanecem sem solução. A burocracia é uma delas: ainda leva, em média, 90 dias para abrir uma empresa no Brasil – embora algumas cidades, como São Paulo, estejam tentando mudar isso.
“Problemas estruturais, como processos lentos e antiquados, a falta de políticas nacionais específicas para a inovação, assim como a escassez de habilidades, ainda permanecem sendo grandes obstáculos para um maior desenvolvimento”, ele disse.
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“As pessoas do meio irão se juntar e a hélice tríplice vai girar mais rápido apenas se houver uma consciência da importância desse tema em diversos departamentos do governo”, diz Marinello.
Incentivos fiscais precisam ser mais significativos e os processos melhorados para que a inovação ganhe força no Brasil, insiste o advogado. “O governo precisa entender que os processos de inovação são diretamente relevantes para a melhoria da economia como um todo, já que, como resultado, podem criar empregos e reduzir a desigualdade.”
Embora ainda seja cedo para avaliar o impacto das mudanças nas questões legais para a melhoria do setor no Brasil, Marinello acredita que aproximar as universidades e o setor público das empresas já é motivo de comemoração, embora ainda haja trabalho para ser feito. “Se o país puder encontrar uma maneira de, pelo menos, reduzir sua burocracia, poderá aumentar seus indicadores em um curto espaço de tempo.”