Se eu tivesse que resumir em duas palavras a competência mais importante para um empreendedor ou empreendedora, hoje eu escolheria a frase imperativa: procure problemas – antes que eles saltem à sua frente e a peguem distraída. Antes que lhe tirem o sono no meio da noite. Antes que interrompam uma reunião com um telefonema surpreendente. Antes que seja tarde demais para reverter algo que poderia ter sido evitado. Antes que se torne urgente. Antes que você sinta que foi atropelada por um caminhão ou tomou um caldo no mar que fez perder a noção de espaço e o fôlego por longos segundos.
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Mas procure problemas no lugar certo. Dentro da sua empresa, do seu escritório, da sua liderança, da sua gestão do tempo, do seu raciocínio, da sua estratégia, do seu plano, do seu comportamento, da sua aposta, da sua auto confiança, da sua segurança, da sua sensação antecipada de que está tudo certo, então já poderia se distrair. Essa hora nunca chega. Minha sugestão é que ocupe seu tempo procurando problemas que, de fato, são problemas. E aqui parto da definição popular: problema é aquilo que tem uma solução (como diz minha mãe: o que não tem solução, não é problema). Solução, por sua vez, pressupõe ter autoridade para resolver. Logo, o problema precisa estar no seu território, sob sua responsabilidade. Se o problema é do outro, ele não é seu, então sugiro que nem perca seu tempo conjecturando como tudo seria melhor “se” alguém fizesse alguma coisa que você acha que deveria ser feita, mas não por você.
Focar nos problemas é o caminho do sucesso
Vamos focar nos problemas. Nos meus problemas. Nos seus problemas. Vamos procurá-los com afinco e sem descanso. Este é o caminho mais rápido e eficaz que eu conheço para conquistar o sucesso – seja lá o que ele signifique para você.
Estou longe de ser uma pessoa pessimista ou que vê o copo meio vazio. Considero-me bem otimista, para dizer a verdade, e às vezes até demais para o que a realidade apresenta. Mas aprendi que procurar problemas é a expressão mais proativa e eficiente da minha crença de que tudo vai dar certo. É a maneira mais rápida de ir além de obstáculos, aprimorar meu desempenho, antecipar as críticas, lidar com a frustração e trabalhar na superação.
Considero até que demorei para chegar a essa conclusão, porque ela é contraintuitiva. Somos ensinados desde cedo a buscar confirmações, validações, similaridades, elogios. Procurar problemas exige um esforço extra, remar contra a maré, ir contra o que talvez se aproxime da nossa natureza. Farejar ameaças quando o clima parece tranquilo. Ainda estou distante de praticar meu próprio conselho o tempo todo. Mas sempre gostei da verdade então, por mais desconfortável e dolorido que seja ouvir um feedback negativo, sentir uma rejeição, lidar com uma frustração, no fundo eu sempre senti que os benefícios de me desafiar, melhorar, evoluir valiam mais que o mal estar momentâneo.
Empreender é aprender com obstáculos
Até que, com muita prática de yoga, disciplina, terapia e trabalho, fui me acostumando ao que é tão óbvio que às vezes é mais fácil negar: a vida é feita dos problemas. Eles não são pedrinhas jogadas, que atrapalham nossa linda caminhada florida e, portanto, devem ser ignoradas para voltarmos à vida tranquila e reta. Eles são a vida. Nosso papel é olhar bem para essas pedras que cruzam nosso percurso, aprender com elas – seja tropeçando, seja pisando sobre elas e desequilibrando – e seguir em frente um pouco mais atentos.
Mas pode ser mais confortável ver só aquilo com o que já concordamos passando pelo nossas timelines. Na psicologia, esse comportamento tem o nome de viés de confirmação (viés confirmatório ou tendência de confirmação). Quando alguém procura e usa as informações disponíveis para respaldar sua própria opinião ou crença, buscando reconhecê-la como verdadeiras, e desconsiderando tudo aquilo que a contraria – e que está, muitas vezes, diante de seus olhos.
Talvez um dos motivos que tenha me levado a estudar jornalismo seja uma curiosidade essencial por muitos pontos de vista distintos. Hoje gosto de ouvir opiniões bem embasadas de quem discorda radicalmente de uma opinião minha. Sinto-me tão desconfortável quanto desafiada quando alguém tem a coragem de me dizer exatamente por que acredita que estou completamente errada. Fui entendendo que se trata menos de mim, e mais dos fatos, das perspectivas ou, no máximo, de ideias – que podem ser minhas, mas não sou eu.
É libertador quando se aceita a possibilidade de mudar de opinião até nos temas mais centrais da vida. É muito mais leve entregar um trabalho sabendo que certamente ele pode ser melhor e dar espaço para lhe contarem como, sem melindres. O crescimento pessoal e o de uma empresa ganham velocidade quando se tem a coragem de ir atrás dos problemas – todo dia, toda hora, alimentando conscientemente uma dose não exagerada de paranoia para encontrar os problemas e suas soluções. Acredito que a quantidade de problemas que você encontra voluntariamente é inversamente proporcional aos escorregões distraídos que acontecem quando a gente acredita que o jogo já está ganho.
Ariane Abdallah é jornalista, autora do livro “De um gole só – a história da Ambev e a criação da maior cervejaria do mundo” e fundadora do Atelier de Conteúdo, empresa especializada na produção de livros, artigos e estudos de cultura organizacional.
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