Já faz tempo que acompanhamos inúmeras matérias discorrendo sobre as dificuldades de atrair, engajar e reter profissionais da Geração Z. No início, tentávamos nos organizar ao redor de movimentos que se tornaram populares nas redes sociais, como o “Quiet Quitting” e o “Great Resignation”, em que esses profissionais abertamente anunciavam práticas de redução de esforços no trabalho e de desligamentos coletivos.
Neste momento, as empresas precisaram se reinventar, revisitar seus processos e políticas, repensar suas ofertas de valor e buscar alternativas para manter a operação rodando mesmo em meio à grande instabilidade em seus quadros de pessoal.
É difícil julgar em que circunstâncias esses movimentos aconteceram. Em alguns casos, é possível que tenha sido uma reação às más condições de trabalho. Em outros casos, talvez a baixa resistência à frustração ou a desconexão entre as ambições dos profissionais frente ao que é possível oferecer pela maioria das empresas tenha motivado estas ações.
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O fato é que continuamos acompanhando notícias sobre a dificuldade de manter esses profissionais, mas agora a decisão pela não permanência vem das próprias empresas. Em matéria recente da Forbes, apontou-se que a falta de motivação, dificuldade no relacionamento interpessoal e a rejeição às longas jornadas de trabalho são as três principais causas de desligamento desses profissionais.
Inicialmente, as pessoas não estariam mais dispostas a se esforçarem sem a garantia de recompensas e de estabilidade. Também não veriam sentido em adaptar sua comunicação, indo além dos textos e mensagens rápidas para participarem de interações e discussões coletivas. E por fim, não estariam mais dispostas a abrir mão de sua qualidade de vida em troca do vil metal.
Todos esses pontos são muito válidos, mas talvez um pouco ingênuos. É claro que as empresas podem implementar ações, não só para evitar abusos, mas também para endereçar as novas necessidades e melhorar as condições de trabalho. Mas se os pleitos não vierem acompanhados de entregas de valor que justifiquem o investimento, as mudanças demandadas não se justificam.
Na maior parte dos casos, a geração Z está entrando nas empresas no início da carreira, nos cargos “Júnior”. Nesse nível, espera-se que a pessoa tenha sede de aprender. Que esteja disposta a fazer um pouco de tudo, conhecer o modus operandi para que as experiências adquiridas gerem repertório para os desafios futuros. Neste momento, a empresa ainda está investindo no potencial do profissional para que ele se torne um ativo e gere valor no futuro, podendo então sugerir e implementar melhorias.
Numa simulação em que a empresa contrate um recém-formado para uma vaga de Analista Júnior com salário bruto de R$ 3.500, o investimento anual da empresa, incluindo todos os encargos trabalhistas e benefícios, seria de aproximadamente R$ 85.000. Além de eventuais premiações e outras remunerações variáveis.
É claro que esse valor paga pelo trabalho executado, mas o investimento considera também que erros são esperados nesta etapa da carreira, que o tempo de execução será maior em função da curva de aprendizado, que haverá retrabalho e que será necessária orientação e supervisão de um profissional mais experiente. Ou, seja, paga-se pelo erro!
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Um profissional que já esteja dominando os processos da área, executando suas atividades com autonomia e agregando valor (o chamado profissional “Pleno”), tende a receber uma remuneração em torno de 25% maior do que o Júnior. No caso do Pleno, o investimento anual da empresa passa dos R$ 100.000. Mas essa evolução toma tempo. Não basta dominar o trabalho para que a empresa passe a pagar mais pelo mesmo resultado. É preciso trazer retorno para que o investimento se justifique.
É também preciso que as pessoas estejam dispostas a passar por esse processo para então julgar se, de fato, seria possível fazer as coisas de outra forma. Mas se só houver resistência, o que era investimento se torna custo, e então faz mais sentido buscar outro profissional que esteja disposto a aprender antes de criticar.
Fernanda Abilel é professora na FGV e sócia-fundadora da How2Pay, consultoria focada no desenho de estratégias de remuneração.
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