A pesquisadora estadunidense Brené Brown passou duas décadas estudando coragem, vulnerabilidade, vergonha e empatia. Em um dos seus livros mais famosos, “A Coragem de Ser Imperfeito”, a autora fala sobre a importância da vulnerabilidade nas relações sociais, sejam elas familiares, amorosas ou profissionais.
Durante sua pesquisa entrevistando centenas de pessoas, a principal preocupação que ouviu quando se tratava de experiência de trabalho era a falta de feedback.
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Ao questionar o motivo para essa falta de retorno nas empresas e nas equipes, Brené recebeu diferentes versões que apresentavam estes dois pontos:
- 1. Não nos sentimos à vontade com conversas difíceis;
- 2. Não sabemos como dar e receber feedback de modo a fazer as pessoas e os processos avançarem.
“As empresas estão tão focadas nas avaliações de desempenho que dar, receber e solicitar feedback de qualidade se tornou raro”, escreve a autora no livro. Segundo ela, isso também é resultado de uma falta de retorno que começa bem antes, na educação. “É incomum até mesmo nas escolas, onde aprender depende de um bom feedback dos professores, que é muito mais eficaz do que notas nas avaliações.”
Porém, Brené Brown afirma que “sem feedback não pode haver mudança transformadora”.
Mas é possível resolver esse problema, e criar uma cultura de feedback pode trazer mudanças impactantes, no trabalho e na vida pessoal.
Isso porque quando não conversamos com as pessoas que lideramos e apontamos seus pontos fortes e onde podem melhorar, elas começam a questionar suas próprias contribuições e o nosso comprometimento.
O primeiro ponto, segundo a autora, é normalizar o desconforto. No ambiente profissional, crescimento e aprendizado são desconfortáveis, sim, e fazem parte do processo. Quando isso já é esperado, a frustração é menor.
Como dar um bom feedback
Na experiência da autora, o segredo de um feedback de qualidade é enfatizar os pontos fortes. Isso não significa desprezar os pontos fracos daquela pessoa, ignorar erros ou aquilo que ainda precisa ser melhorado, mas ajuda a considerar as qualidades positivas como recursos.
Um método eficiente para entender nossos pontos fortes é examinar a relação entre nossas forças e limitações. “Reconhecer as fortalezas indica meios de usá-las para enfrentar os desafios.”
Brené Brown usou essa abordagem com seus alunos, que precisavam indicar três pontos fortes e uma oportunidade de crescimento na apresentação dos colegas.
Para um bom feedback, é preciso “sentar no mesmo lado da mesa”, como ela coloca, uma metáfora para baixar a guarda e ser empático ao reconhecer os pontos fortes e indicar as oportunidades de melhoria da outra pessoa.
Veja o checklist de Brené Brown para um feedback de qualidade:
- Estou disposta a me sentar do seu lado em vez de do outro lado da mesa;
- Desejo colocar o problema na nossa frente em vez de entre nós (ou esfregá-lo na sua cara);
- Estou pronta para ouvir, fazer perguntas e aceitar que possa não estar entendendo a questão completamente;
- Quero reconhecer o que você faz bem em vez de ressaltar os seus erros;
- Reconheço seus pontos fortes e como você pode usá-los para superar os desafios;
- Posso te chamar à responsabilidade sem te envergonhar ou culpar;
- Estou disposta a assumir a minha parte;
- Posso lhe agradecer sinceramente por seu empenho em vez de criticá-lo por suas falhas;
- Consigo explicar como solucionar esses desafios vai te fazer crescer e aproveitar novas oportunidades; e
- Consigo vivenciar a vulnerabilidade e a abertura que espero ver em você.
A importância da vulnerabilidade
Criar uma cultura de feedback em um time ou uma empresa só é possível quando existe uma cultura de abertura entre as pessoas, sem que o medo ou a vergonha imperem.
A vulnerabilidade está no centro do processo de feedback – e isso vale para todos. Não é um desafio só para quem recebe, mas para os dois lados. Brené destaca que um dos maiores equívocos nesse processo é as pessoas se armarem ou usarem uma abordagem de superioridade.
Ninguém é capaz de receber feedback ou assumir responsabilidade por algo quando está sendo duramente criticado. “Nosso instinto de defesa toma conta e nos protegemos.”
A vulnerabilidade é também o que permite um ambiente voltado à inovação. Se as pessoas trabalham sob pressão constante, com medo dos líderes e das represálias que certamente virão se cometerem algum erro, é improvável que criem algo novo.
A inovação parte da tentativa, do espaço para tentar – acertar e errar. “Não há liderança pelo medo”, afirma a autora. E ao mesmo tempo ”não solucionaremos as questões complexas que enfrentamos hoje sem criatividade, inovação e aprendizado estimulante.”
A autora também cita as quatro melhores estratégias para desenvolver empresas e organizações em um ambiente sem vergonha e medo:
- Apoiar líderes que desejem ousar, facilitar conversas honestas sobre o tema e incentivar uma cultura de combate a vergonha e o medo;
- Estimular um esforço consciente para detectar em que pontos a vergonha possa estar atuando na empresa e de que forma ela se dissemina na maneira como nos relacionamos com nossos colegas de trabalho;
- Estabelecer padrões como forma de combater esses pontos. Líderes e gerentes podem motivar ajudando as pessoas a saberem o que querem. Quais são as dificuldades em comum? Como as pessoas lidam com elas? Quais têm sido suas experiências?
- Levar todos os funcionários a conhecer a diferença entre vergonha e culpa, e ensiná-los a dar e receber feedback de maneira que isso encoraje o crescimento e a motivação.
Se não estivermos dispostos a pedir e receber feedback, nunca seremos bons em oferecer. O objetivo não é receber feedback positivo nem evitar dar retornos difíceis. É muito mais sobre se desarmar, reconhecer que há espaço para a evolução e se comprometer a melhorar.