Na Itália dos Barolos ou na região francesa de Champagne? Será que foi em terrenos consagrados no mundo moderno como esses que o vinho teria surgido? Parece que não. Indícios sugerem que as primeiras vinhas das quais se tem notícia surgiram na Idade da Pedra (7000 a.C.-5000 a.C.) na Geórgia – especialmente na região do Cáucaso, face da Europa Oriental que faz fronteira com Rússia, Turquia e Armênia. Desta última vem o primeiro registro da bebida (4000 a.C.).
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Existem várias outras teorias – algumas pouco científicas, é verdade – para o surgimento do vinho. Há a versão cristã, que toma por base o trecho do Antigo Testamento que diz: “E começou Noé a cultivar a terra e plantou uma vinha” (Gênesis: capítulo 9, versículo 20). Os gregos o consideravam uma dádiva dos deuses. Já historiadores mais recentes imaginam que a bebida teria surgido por acaso, a partir de uvas amassadas que acabaram fermentando. Isso teria acontecido antes do surgimento da escrita, daí a dificuldade de precisar sua origem. Já o cultivo de videiras só começou quando nossos antepassados nômades passaram a ser mais sedentários e dedicados à agricultura.
A trajetória das crenças e teorias acerca do vinho se confunde com a evolução da humanidadeSeja como for, a trajetória das crenças e teorias acerca do vinho se confunde com a evolução da humanidade. Só para citar alguns pontos-chave dessa história: a invenção da ânfora data de 1500 a.C.; as obras de Homero, o poeta grego mais famoso da Antiguidade, já citava a bebida em 750 a.C.; em 404 a.C. nasceu a primeira obra teatral ligada ao vinho – “As Bacantes”, escrita pelo grego Eurípides; em 60 d.C., ele aparece no Império Romano com Júlio César, que ditou a criação dos romanées, demarcação que deixou famosa a região do Romanée Conti, na França; em 169 d.C., Galeno (médico de Marco Aurélio) foi o autor de uma compilação que pode ser encarada como a primeira publicação dedicada ao vinho do mundo; a invenção dos barris veio pouco depois, em 200 d.C.
Dando um salto nessa cronologia, em 1112 monges cistercienses dedicaram-se aos vinhedos da Borgonha e revolucionaram a região, sendo os primeiros a plantar a uva chardonnay e a criar o conceito de grand cru. Em 1220, foi realizada a primeira batalha mundial de vinhos, encomendada pelo rei francês Filipe Augusto – o vinho vencedor foi o da região de Commandaria, no Chipre. Segundo o “Guinness World Records”, o livro dos recordes, o Commandaria já existia desde 2000 a.C. e é o vinho mais antigo ainda em produção.
No Brasil
Com a saga dos conquistadores, em meados do século 16, vieram as primeiras expressões do vinho fora da Europa, especialmente no México e no Peru. No Brasil, o fidalgo português Brás Cubas torna-se conhecido como o primeiro viticultor, primeiro cultivando terras na região de Santos e depois no alto da Serra do Mar.
Com a Revolução Industrial, surgem as primeiras garrafas nos moldes similares aos de hoje, fruto de um projeto do inglês Henry d’Andeli, em 1630. Já em 1785, a rainha dona Maria I (A Louca) decretou a proibição do vinho em solo brasileiro – ordem que só seria derrubada por dom João VI em 1808, com a chegada da família real.
Pelas mãos de um italiano, Manuel Peterlongo, nasceu o primeiro espumante brasileiro. Com a crise econômica mundial de 1929, chegaram os modelos de cooperativa, sistema que fez surgir empresas que são referência até hoje, como Aurora e Garilbaldi. A partir da década de 1950, marcas internacionais como Chandon e Martini começam a se instalar no mercado brasileiro, o que impulsionou e sofisticou o mercado nacional. A década de 1980 representa o início da produção no Nordeste e a criação da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS).
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Na década seguinte, chegaram aqui as produções de vinhos finos e a ExpoVinis, maior feira do setor na América Latina. Nos anos 2000, o Brasil entra no cenário de exportação mundial, e a profissão de sommelier é regulamentada. Por fim, em 2012, a prova de que o Brasil já faz parte da fascinante história do vinho: o Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, foi a primeira região do país a receber a cobiçada certificação de Denominação de Origem. Tim-tim!
*Carla Bolla é restauratrice do La Tambouille, em São Paulo