No meio jurídico costuma-se dizer que “mais vale um mau acordo que uma boa demanda”. Em meados de fevereiro, tive o privilégio de estar em Genebra com o dr. Roberto Carvalho de Azevêdo, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. No início de 2017, Azevêdo foi mantido no cargo para um segundo mandato pelos 164 países-membros que compõem a organização. Não é exagero dizer que ele é considerado o diplomata brasileiro mais influente da atualidade. Desde que foi reconduzido ao cargo, tem como objetivo garantir que, em suas próprias palavras, as negociações comerciais sejam mais inclusivas para que os benefícios sejam amplamente compartilhados.
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Poucas semanas depois desse encontro, porém, o presidente americano Donald Trump sacudiu o mundo ao dizer que “as guerras comerciais são boas e fáceis de ganhar”, após anunciar tarifas sobre importação de aço e alumínio, desencadeando quedas nos mercados acionários mundiais e recebendo inúmeras críticas. Alegando desvantagens comerciais, numa canetada Trump desconsiderou regras comerciais claras, objetivas e equilibradas.
Criada em 1995 com o objetivo de supervisionar e liberalizar o comércio internacional, a OMC substituiu o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt). E, diga-se, a OMC exerce o papel de aparar arestas, diminuir rivalidades e destravar as grandes questões do comércio internacional, inclusive as de natureza jurídica.
As barreiras comerciais representam obstáculos a serem superados. Nosso agronegócio é um exemplo para esse desafio mundial
Azevêdo expressou preocupação com aquela intervenção pouco comum de um membro da organização. Como apontou a professora Maristela Basso, “com mão autoritária e sem respaldo em regras (domésticas e internacionais) capazes de sustentar tamanha arbitrariedade, o presidente Trump elevou as taxas de importação”.
No campo jurídico, as ações de Trump podem ser questionadas nos organismos internacionais. A expectativa é de que as divergências comerciais sejam tratadas tecnicamente no mecanismo de controvérsias da OMC, sem contaminar as relações políticas e diplomáticas entre os países.
É bem verdade que, depois de alguns dias, o presidente americano suspendeu a sobretaxa para o alumínio e o aço do Brasil. Mas o sinal amarelo já está piscando para outras invertidas no comércio mundial.
As barreiras comerciais sempre existiram e sempre existirão, mais altas ou mais baixas, e representam obstáculos a serem superados. A questão é a motivação para superá-las, com a visão de longo percurso.
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Tenho cá para mim que nosso agronegócio é um exemplo para esse desafio mundial. É um setor preparado para atender ao mercado aqui e lá fora, com alta produção e avançada tecnologia. Obviamente, não está imune a barreiras e sanções externas. Mas se impõe por sua competitividade e por sua enorme contribuição no PIB do país, sendo por isso considerado o mais importante para a retomada da economia nacional. Os números são exemplares: de acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o setor representa 48% das exportações do país e é o que mais gera renda. A expectativa para 2018 é que o agronegócio tenha uma participação igualmente forte.
Internamente, para se proteger de práticas adversas, as empresas podem recorrer ao uso de medidas antidumping, compensatórias e de salvaguardas – mecanismos regulamentados no âmbito internacional pela OMC. Lá fora a competição é outra, com regras que podem ser até mudadas unilateralmente. Por isso, é preciso reduzir riscos, promover eficiência e produtividade, atender a regulamentações que evoluem de maneira extremamente dinâmica e consolidar uma imagem de estabilidade e solidez.
Por tudo isso, reforço, sem acanhamento algum, a campanha: o agro é pop. Que outros setores do país também se tornem pop.
Coluna publicada na edição 58, lançada em abril de 2018