Será que noites bem dormidas podem evitar as doenças cardíacas? Pesquisadores do Hospital Geral de Massachusetts (MGH) e da Faculdade de Medicina de Harvard garantem que sim. Segundo eles, o sono modula o processo pelo qual o corpo fabrica as células sanguíneas – hematopoiese – que poderiam proteger a aterosclerose em humanos. A hematopoiese ocorre principalmente na medula óssea, mas também pode acontecer em outros tecidos, como fígado e baço.
LEIA MAIS: Por que dormir nu faz bem para a saúde e o bolso
Embora os pesquisadores reconheçam que ainda sabem pouco sobre o tema, eles asseguram que dormir mal aumenta o risco de múltiplas condições patológicas, incluindo doenças cardiovasculares. “O sono regulou a hematopoiese e protegeu contra a aterosclerose em camundongos, usados nas pesquisas.”
Alguns estudos levaram os pesquisadores a descobrir um mecanismo entre o cérebro, a medula óssea e os vasos sanguíneos até então desconhecido, que parece evitar o desenvolvimento da aterosclerose, ou endurecimento das artérias – mas que só ocorre quando a pessoa costuma dormir bem. O Instituto Nacional do Coração, Pulmão e Sangue (NHLBI) dos Estados Unidos, que faz parte dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH), foi o responsável pelo financiamento do estudo.
O anúncio dessa descoberta – publicado este mês na revista “Nature” – aconteceu a tempo do American Heart Month 2019, e ressalta a importância de ter boas horas de sono a fim de manter a saúde cardiovascular. Pesquisadores disseram que a descoberta pode fornecer novos focos para combater doenças cardíacas, a principal causa de morte entre mulheres e homens nos Estados Unidos.
“Nós identificamos um mecanismo pelo qual um hormônio cerebral controla a produção de células inflamatórias na medula óssea, de uma forma que ajuda a proteger os vasos sanguíneos”, disse Filip Swirski, Ph.D., principal autor do estudo e professor do MGH e da Faculdade de Medicina de Harvard. “Esse mecanismo anti-inflamatório é regulado pelo sono, e se divide quando você não dorme bem. Pode ser considerado uma peça de um quebra-cabeça.”
Pesquisas recentes associam a falta de sono e alguns distúrbios, como a apneia do sono, a um aumento do risco de obesidade, diabetes, câncer e doenças cardíacas. Mas o NHLBI disse que os cientistas ainda sabem pouco sobre os fundamentos celulares e moleculares que poderiam ajudar a explicar a ligação entre o sono e a saúde cardiovascular.
O instituto informou que a falta de sono é um problema de saúde pública, que afeta milhões de pessoas das mais diversas idades. “Estudos mostram que dormir bem é vital para a saúde, mas que menos da metade dos adultos norte-americanos costumam dormir mais do que sete horas”, afirmam.
Neste estudo, os pesquisadores tentaram aprender mais sobre como a falta de sono afeta o coração e leva à doença cardiovascular. Ao usar um grupo de camundongos geneticamente modificados a fim de desenvolver aterosclerose, os pesquisadores interromperam os padrões de sono de metade desses animais e permitiram que a outra metade dormisse normalmente.
Ao longo do tempo, eles descobriram que os camundongos que tiveram seus sonos interrompidos desenvolveram lesões arteriais maiores do que os demais. “Os ratos com distúrbios do sono desenvolveram placas arteriais, ou depósitos de gordura, que chegavam a ser até um terço maiores do que os ratos que dormiram normalmente”, relatou o NHLBI. “Os camundongos com sono interrompido também produziram o dobro de células inflamatórias em seu sistema circulatório, além de quantidades menores de hipocretina, um hormônio produzido pelo cérebro que desempenha um papel importante na regulação do sono e estados de vigília.”
SAIBA TAMBÉM: Pesquisa revela que é bom dormir mais no fim de semana
Os pesquisadores também mostraram que “ratos ateroscleróticos deficientes em sono que receberam suplementação de hipocretina tendem a produzir menos células inflamatórias e desenvolver lesões ateroscleróticas menores quando comparados com camundongos que não receberam a suplementação”. Eles disseram que esses resultados demonstram que a perda de hipocretina durante a interrupção do sono contribui para a inflamação e aterosclerose.
Ainda assim, os pesquisadores alertaram que são necessários mais estudos, particularmente em seres humanos, para validar essas descobertas antes de experimentar a hipocretina terapeuticamente.
Segundo a “Narcolepsy” – a quarta de uma série de sites produzidos pela Divisão de Medicina do Sono da Faculdade de Medicina de Harvard (DSM) -, pesquisas recentes revelaram que a narcolepsia com cataplexia – doença caracterizada por ataques irresistíveis de sono, episódios temporários de fraqueza muscular, paralisia do sono e alucinações hipnagógicas – é causada pela falta de hipocretina.
Importante neurotransmissor do cérebro, a hipocretina ajuda a manter o estado de alerta e a impedir que o os indivíduos durmam em momentos errados, como é o caso da narcolepsia. Ela transmite sinais de um neurônio para outro e é produzida apenas por um pequeno grupo de neurônios no hipotálamo, uma região do cérebro localizada atrás dos olhos e entre as orelhas. “Dos bilhões de neurônios no cérebro, somente cerca de 100 mil a 200 mil produzem hipocretinas”, relata a série. (As hipocretinas foram descobertas em 1998, quando dois grupos de pesquisa as identificaram no cérebro. Um grupo as classificou como hipocretina-1 e hipocretina-2, enquanto outro grupo optou por chamá-las de orexina-A e orexina-B.)
“Em indivíduos sem narcolepsia e com sono bem regulado, as hipocretinas são liberadas durante a vigília e aumentam a atividade em neurônios-alvo que promovem o estado alerta e suprimem o sono do movimento rápido dos olhos (REM)”, afirmou. “Em pessoas que têm narcolepsia com cataplexia, a maioria dos neurônios produtores de hipocretina morre. A consequente falta de hipocretinas resulta em sonolência duradoura e falta de controle do sono REM, fase do sono na qual ocorrem os sonhos mais vívidos. De fato, isso pode estar tão instável que a paralisia, ou os sonhos, que normalmente ocorre apenas no sono REM, podem se misturar à vigília, causando cataplexia e alucinações oníricas”.
Levar o recém-descoberto mecanismo biológico adiante – o chamado eixo neuro-imune – pode ser um avanço em direção a novos tratamentos para doenças cardíacas, sono e outros distúrbios, afirmaram os pesquisadores.
“Esta parece ser a demonstração mais direta das conexões moleculares que ligam os fatores de risco de sangue e cardiovascular à saúde do sono”, diz Michael Twery. “Compreender o impacto potencial da falta de sono e da saúde na formação de células sanguíneas e doenças vasculares abre novos caminhos para o desenvolvimento de melhores tratamentos.”
Siga FORBES Brasil nas redes sociais:
Forbes no Facebook: http://fb.com/forbesbrasil
Forbes no Twitter: http://twitter.com/forbesbr
Forbes no Instagram: http://instagram.com/forbesbr