RESUMO DA MATÉRIA:
- A pesquisa com uma hashtag seguida do nome da cidade retornou cerca de 70 mil fotos, muitas delas de dias anteriores;
- É importante notar que, mesmo que uma conta seja privada, alguns vazamentos de sites como o Facebook;
- A pesquisa mostrou que tanto o voyeurismo quanto o exibicionismo trazem gratificação aos usuários de mídias sociais.
Este ano, o número estimado de usuários das redes sociais em todo o mundo tende a crescer para 2,77 bilhões. A chance de as pessoas verem a sua vida aumenta com esses números e, às vezes, você nem percebe. Localização marcada, hashtag, configurações de privacidade não funcionais, sugestão de fotos e usuários e até mesmo compartilhamento excessivo contribuem para que os seus amigos, inimigos, colegas, chefes e qualquer estranho observem o que você publica online. A menos que sua conta esteja bloqueada (e nunca esteja sujeita a um vazamento de dados ou hacker), não é possível saber quem vê seu conteúdo, a não ser no Stories do Instagram e recursos similares.
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Acabei de voltar de férias, período no qual acidentalmente conheci um estranho – e muito bem – por meio de sua conta no Instagram, e percebi quantas informações deixamos claras nas redes sociais de forma não intencional. Com a permissão dessa mulher que conheci, vou contar como soube mais detalhes íntimos de sua vida.
Na última semana, visitei uma linda cidade costeira ao longo da Riviera Francesa. Ainda que com o celular em mãos durante todo o passeio, eu me vi incapaz de tirar muitas fotos, em parte porque eu estava mais preocupada em apreciar a paisagem ao vivo. Então, fiquei curiosa para ver se alguém conseguiu tirar boas fotos dos fogos de artifício ou do pôr do sol. Para descobrir, fiz uma busca no Instagram com a hashtag da cidade.
Minha pesquisa retornou cerca de 70 mil fotos, muitas delas de dias anteriores. Fiquei encantada enquanto examinava os resultados e via os rostos de várias pessoas com quem já havia encontrado – desconhecidas sim, mas cujas roupas ou adoráveis cães haviam atraído minha atenção o suficiente para reconhecê-las mais tarde.
Foi quando me deparei com uma mulher com um cachorro bem fofo, e cliquei em sua conta. Não porque eu estava interessada em sua vida (ou em seu pet), mas por curiosidade. Eu não pretendia olhar de perto as fotos dela ou descobrir qualquer coisa sobre sua vida, mas uma foto que ela postou alguns dias antes, que estava em seu feed, levou-me a investigar mais.
Ela também estava de férias, vinda do Reino Unido com sua família. Antes de sair, ela postou uma foto do marido e uma quantidade impressionante de bagagem nos degraus da frente de sua casa, com o número à vista, e marcou a localização. Foi quando me dei conta do volume de informações que ela oferecia no Instagram, e decidi dar uma olhada.
Antes de seguirmos em frente, é válido dizer que já fiz palestras e workshops sobre privacidade na internet. Eu até passei algumas tarefas aos alunos para que eles checassem as contas nas redes sociais uns dos outros e relatassem as informações encontradas. Talvez eu tenha mais experiência do que a maioria em detectar sinais de problemas quando se trata de privacidade, mas isso não me faz diferente de alguém motivado para descobrir mais sobre você a fim de lhe fazer mal.
Passei cerca de 20 minutos observando as fotos do Instagram desta mulher no ano passado – umas 40 no total. Aqui estão coisas que ela postou, além das informações reveladas graças a elas:
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– Uma foto do marido com uma mala um tanto quanto cara nos degraus de uma linda casa, em uma pequena cidade no Reino Unido. Isso foi o suficiente para me dizer que eles estavam bem de vida e onde moravam, sem mencionar que estariam fora de casa por pelo menos dois dias;
– Uma foto da festa da filha. A legenda foi publicada na data do aniversário e fornecia o primeiro nome da menina, a idade e a data de nascimento. Acrescente isso ao fato de que ela já havia marcado a localização da sua casa;
– Uma foto da família indo à igreja. A legenda mencionava que o lugar ficava a poucas quadras da casa. Essas informações podem definir um endereço, dadas as outras informações fornecidas;
– Uma foto do primeiro dia de aula, citando o nome da escola. Essa era uma boa indicação de quantas crianças em idade escolar eles tinham em casa, além de seus interesses e idades, que estavam estampados em suas lancheiras (de super-heróis e princesas da Disney);
– Uma foto do marido usando um terno. Agora eu sabia o que ele fazia para ganhar a vida, onde trabalhava e – graças à legenda – o fato de que eles têm uma babá, que cuida de seus filhos com frequência, e que mora na mesma rua;
– Uma foto dos filhos brincando juntos em um quarto da casa. Isso foi o suficiente para me dar mais informações sobre o gosto das crianças, o que decorava o ambiente e os tipos de brinquedos que possuíam. Vale a pena notar que essas informações são mais do que suficientes para iniciar uma conversa com uma criança, conquistando sua confiança;
– Uma foto do Natal em família. Essa foto mostrava não apenas a família, mas também as pinturas na parede, o tipo de televisão que possuíam, os presentes dos filhos e um Amazon Alexa;
– Uma foto de uma noite de domingo, trabalhando, com um laptop e um copo de vinho. A legenda mencionava frustrações na carreira, um prazo potencialmente perdido e seu desejo por um novo chefe.
Em apenas oito imagens, uma estranha deu a alguém, que simplesmente clicou em seu perfil, uma quantidade notável de informações sobre ela e sua família.
Quando tive a ideia de escrever sobre isso, entrei em contato com ela pelo Instagram para me identificar, dar a ela minhas credenciais e explicar da maneira menos ameaçadora possível o que eu havia feito. Felizmente, ela foi muito gentil e aberta a olhar para a lista de fotos que eu havia mencionado, e me disse para publicar esta matéria assim que ela fechasse sua conta.
É importante notar que, mesmo que uma conta seja privada, alguns vazamentos de sites como o Facebook (que possui o Instagram) pode fazer com que seus dados fiquem públicos em algum momento, por isso é melhor não postar aquilo que não quer mostrar ao mundo. Além disso, qualquer pessoa que o segue pode salvar suas fotos e compartilhá-las sem que você saiba. Alguém que era amigo há um ano pode não ser mais.
A maioria das pessoas assume que ninguém gasta tempo pesquisando online. Isso pode ser verdade, mas se aprendemos alguma coisa na última década, é que os dados pessoais são valiosos e que as pessoas podem facilmente usá-los contra você.
Aqueles que não estão preocupados com a privacidade, porque acham que não têm nada a esconder, deveriam lembrar que seus filhos a merecem. Não importa o quão bem intencionado seja um post sobre uma criança, as postagens podem colocar menores de idade em risco.
A pesquisa mostrou que tanto o voyeurismo quanto o exibicionismo trazem gratificação aos usuários de mídias sociais – nos divertimos tanto ao postar sobre nós mesmos quanto ao observar fotos de outras pessoas. Mas esse hábito pode fazer qualquer usuário entrar em território perigoso, mesmo quando ele está postando uma imagem que não é completamente autêntica.
Minha passagem pela vida de uma estranha me fez repensar alguns dos meus próprios comportamentos nas redes, especialmente quando se trata de localização. Com tudo isso em mente, talvez seja hora de você dar uma olhada em sua própria conta.
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