Resumo:
- Para o fundador da gigante chinesa Huawei, o presidente norte-americano, Donald Trump, é contraditório e pode ser ignorado no futuro;
- Ren Zhengfei diz também que acusações de roubo de IP são falsas, já que a empresa chinesa está à frente das norte-americanas;
- Com o cenário atual, empresário vê tanto possibilidade de a empresa crescer, diminuir — ou desaparecer.
Ao final de uma semana caótica para a Huawei, o fundador e CEO da gigante chinesa de telefonia, Ren Zhengfei, adotou uma postura a um só tempo desafiadora e humilde. Em entrevista à “Bloomberg” publicada no último domingo (26), Ren afirmou que as sanções dos Estados Unidos contra a empresa foram duras, com consequências sobre partes centrais da cadeia de suprimentos e projetos de novos produtos e dispositivos da Huawei.
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O presidente Donald Trump tomou a Huawei como bode expiatório de sua guerra comercial contra a China, um conflito que se tornou uma mistura inebriante de temores de segurança nacional e acusações tanto de roubo de propriedade intelectual como de abusos de direitos humanos em Xinjiang. Por um ano, os EUA persuadiram e ameaçaram países em todo o mundo, na tentativa de reverter a posição dominante da Huawei.
Para Ren Zhengfei, os tuítes de Trump – afeito a essa rede social como o colega Jair Bolsonaro – são “risíveis” e “contraditórios”, e o atual ocupante da Casa Branca deve ser ignorado. “Não há necessidade de negociação. Se ele me chamar, posso não responder.”
Um dia antes de a entrevista de Zhengfei sair na “Bloomberg”, no sábado, o “Wall Street Journal” publicou uma reportagem sobre “a ascensão da Huawei, feita de acusações de roubo e ética duvidosa”. O texto sugere que a empresa tinha uma “cultura corporativa que borrava os limites entre a competição justa e a ética duvidosa.”
Ren Zhengfei negou as denúncias de roubo de IP e inverteu o jogo de acusações: “É mais provável que os EUA roubem a nossa tecnologia, pois estamos à frente. Se estivéssemos atrás, Trump não precisaria fazer tantos esforços para nos atacar”.
Sobre as sanções dos EUA que levaram Google, Qualcomm, Microsoft e ARM, bem como órgãos do setor, a suspender laços com a Huawei, o empresário disse que “os EUA não são a polícia internacional, e não podem governar o mundo”. Como se vê, Ren Zhengfei bateu duro nessa hora. “Os EUA nunca compraram produtos nossos, mesmo que o país queira comprar nossos produtos no futuro, eu não posso vender para eles.”
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Já para descrever o impacto que as restrições de Trump têm sobre a Huawei, o CEO baixou um pouco o tom e lançou mão da imagem de um avião quebrado. “Perder contratos com algumas empresas é como ter um buraco no avião. Estamos trabalhando para consertar o buraco, mas o avião ainda é capaz de voar. Podemos ter planos de contingência para a nave, e não para as asas. Precisamos rever a situação e corrigir o problema”. Ao ser questionado se isso significava que a auto-proclamada liderança de dois ou três anos da Huawei em 5G poderia se perder, ele foi categórico: “Definitivamente”.
A notícia que mais chamou a atenção, na esteira da inclusão da Huawei na lista negra de Trump, foi o efeito que as sanções poderiam ter sobre segmentos de consumo rápido, como o de smartphones, para o qual a rede 5G será imprescindível. As vendas de smartphones foram o principal motor do crescimento da empresa chinesa, no ano passado, colocando a Huawei acima da Apple, abaixo apenas da Samsung. Ren Zhengfei disse que a empresa pode ficar abaixo da meta de expansão esperada, mas ainda assim crescer. “Ser capaz de crescer no ambiente mais difícil mostra quão grandes nós somos”.
É claro que a China precisará tomar uma posição para proteger a marca. O empresário, no entanto, disse que protestaria se o governo chinês tomasse uma medida semelhante contra a Apple, enaltecendo a empresa de Steve Jobs pela inovação no setor. “A Apple é a líder mundial. É minha professora, está avançando na nossa frente”, disse ele.
De modo geral, nessa nova entrevista Ren Zhengfei foi menos otimista do que havia sido uma semana antes, quando afirmou que a proibição dos EUA não afetaria os planos de sua empresa, com os rivais “pelo menos dois ou três anos atrás” da Huawei. “Podemos nos tornar maiores ou menores”, disse ele, suavizando a retórica. “Não somos uma estatal. Não estamos apenas buscando crescimento e lucro. Para nós, já é bom o suficiente continuarmos vivos. Você pode voltar para nos entrevistar em dois ou três anos e ver se ainda existimos. Depois desse período, lembre-se de trazer uma flor e colocá-la no túmulo.”