Análise de conjuntura, como se sabe, é um esporte radical. Especialmente para os que se arriscam no voo arrepiante das projeções. E, quando surge no céu um dólar nervoso, aí é que as acrobacias arrojadas e os tombos espetaculares se multiplicam.
O ano de 2019 já foi, em si, o maior encontro da história entre análise e vontade. Ou má vontade. O mercado apostou num projeto vencedor – que entregou o que prometeu. No entanto, quem for pesquisar algum trecho isolado do percurso, desde 1º de janeiro, terá frequentemente a impressão de que o mundo tinha acabado na véspera – ou iria se acabar no dia seguinte. Uma multidão de analistas de conjuntura sentenciava sem capacete que a reforma da Previdência subira no telhado – por falta de “articulação”, por “desidratação” e alguns outros nomes que eles costumam dar para sua própria (má) vontade.
Claro que quem despencava a toda hora do telhado era um analista de conjuntura – ou um cacho deles – mas isso, como se sabe, não é notícia.
É também óbvio que numa conjuntura onde a aposta é paga logo na primeira rodada, o mau humor jamais virá do próprio mercado – ou pelo menos não provocado pelos que pagaram a aposta adiantado e com juros.
Mas o esportista radical é destemido e não olha para trás, nem para os lados: se joga para frente com a fé de que o próprio salto será a sua sustentação… (confiança é tudo). Então o dólar subiu porque o Lula foi solto e vai ter arruaça como no Chile. Aí ninguém obedece ao Lula, e o dólar sobe porque um filho do presidente falou alguma coisa. Aí o presidente desautoriza o filho, e o dólar sobe porque o leilão do pré-sal não teve grana de fora. Aí a grana de fora entra em outras cessões/acordos e as desestatizações passam de R$ 100 bilhões, mas o dólar sobe porque o Paulo Guedes falou no AI-5. Aí fica claro que Guedes falou contra o AI-5, e o dólar sobe porque Guedes diz que compreende a subida do dólar…
Sem querer atrapalhar o salto mortal dos oráculos imortais, os dados associados à atividade do atual governo brasileiro são os seguintes: juros na menor taxa da história, inflação em queda (nem aí pro câmbio), criminalidade idem, PIB e empregos em recuperação consistente, reformas cruciais em andamento (o oráculo que previu a inviabilidade da reforma da Previdência no primeiro ano sumiu – e ninguém sentiu falta dele).
Mas e o dólar? Sei lá, pergunta ao seu analista de conjuntura. Mas diz a ele que você só vai entender se ele o levar para uma volta ao mundo. De graça.
Guilherme Fiuza é jornalista e escritor com mais de 200 mil livros vendidos, autor dos best-sellers “Meu nome não é Johnny” (maior bilheteria do cinema nacional em 2008), “3.000 dias no bunker” (história do Plano Real, também adaptado para o cinema), “Bussunda – A vida do casseta”, entre outros. Escreveu o romance “O Império do Oprimido” e é coautor da minissérie “O Brado Retumbante” (TV Globo), indicada ao Emmy Internacional.
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