A economia do mundo padece com as consequências da disseminação da doença COVID-19, causada pelo novo coronavírus, e as empresas começam a anunciar o impacto da situação em suas finanças. No Brasil, uma das primeiras a tornar pública uma revisão de meta de endividamento foi a BRF. O CEO, Lorival Luz e o CFO, Carlos Moura, falaram com exclusividade para a Forbes em meio a uma agenda intensa no dia da divulgação do balanço de 2019.
Na mesma data, a companhia anunciou fato relevante ao mercado com a mudança da meta de guidance, ou seja, de perspectiva para a razão da Dívida Líquida com o Ebitda (Lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) que passou para uma faixa entre 2,35x e 2,75x no final de 2020. Este índice dá uma ideia ao investidor de quantos anos a empresa levaria para pagar sua dívida, caso os números no cálculo se mantenham constantes.
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“Nós tínhamos uma divulgação de guidance de 2,65x para o final de 2020 e, dadas as inúmeras mudanças de cenário e o efeito do câmbio sobre o nosso negócio com 60% de endividamento em moeda estrangeira, fizemos um intervalo”, explica Carlos Moura.
A BRF reportou lucro anual pela primeira vez desde 2015. Para as operações continuadas, a companhia obteve lucro líquido de R$ 1,2 bilhão em 2019 ante prejuízo de R$ 2,1 bilhões no ano anterior. No total societário, o lucro líquido foi de R$ 297 milhões no ano passado contra resultado negativo de R$ 4,5 bilhões no exercício de 2018. Embora os números atuais sejam positivos, as ações BRFS3 fecharam com queda de 7,27% a R$ 26,15 no pregão após a divulgação dos números de 2019 e do fato relevante com a mudança de meta de endividamento.
No histórico da BRF, formada pela fusão entre Perdigão e Sadia aprovada pelo CADE, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, em 2016, a variação brusca na cotação do dólar durante a crise financeira global de 2008 e um desequilíbrio com operações financeiras no mercado futuro de câmbio levaram à falência da Sadia e à posterior compra pela Perdigão. Apesar do caso ainda ter forte presença na memória dos investidores, os executivos da BRF não veem qualquer associação com a atual crise econômica global causada pelo coronavírus.
“Absolutamente não”, afirma Carlos Moura. “O que aconteceu foi que, dada a mudança da cena externa, o mercado mudou, e o que nós percebemos foi um ruído em relação à comunicação da alavancagem e uma revisão das expectativas sobre a companhia em relação ao quarto trimestre, mas estamos numa maratona e não numa corrida de 100 metros. A gente olha o preço das ações de forma diligente, mas conduz a companhia para gerar valor ao acionista de forma consistente”.
Ainda de acordo com Moura, a sensibilidade do segmento de alimentos ao câmbio é tratada com uma governança robusta. “Essencialmente, olhamos duas coisas: a proteção do balanço, ou seja, dos ativos e passivos em moeda estrangeira com o diferencial entre eles protegido, assim como a proteção da exposição do resultado operacional dos próximos 12 meses. A gente também verifica a nossa curva de exposição em moeda estrangeira desse resultado e determina limites prudenciais desta proteção, inclusive, publicados em nosso site”, explica.
Apesar do cenário desafiador, a BRF prevê investimentos de R$ 2,2 bilhões a R$ 2,5 bilhões na unidade da empresa na Arábia Saudita e na nova fábrica de salsichas em Seropédica, na região metropolitana do Rio de Janeiro. Para 2020, a empresa planeja ainda o lançamento da linha vegetal de hambúrgueres e nuggets, além dos produtos premium.
“Nós não antevemos uma alienação relevante de qualquer ativo da companhia e examinamos as oportunidades que existem no mercado para eventuais aquisições como, de praxe, algo rotineiro em nossa companhia, seja no Oriente Médio, na Turquia ou em outros locais”, explica Moura.
Os países árabes e a China são os maiores compradores de frango brasileiro, segundo a Câmara de Comércio Árabe-Brasileira. Fora o cuidado extra com a volatilidade do dólar neste ano, a BRF não vê consequência negativa nas vendas devido à propagação do coronavírus. Pelo contrário. “Até o momento, ainda não tivemos impacto, nem negativo, nem positivo. A perspectiva é de que haja um aumento da demanda do mercado internacional pelos nossos produtos. Aí, o impacto é de volume e também de preços, de forma a beneficiar os resultados da companhia”, afirma Moura.
Outro destaque apresentado no balanço da BRF foi a entrada da empresa no Índice de Sustentabilidade (ISE) da B3, uma seleta lista de empresas listadas na bolsa de valores brasileira e que possuem eficiência econômica, equilíbrio ambiental, justiça social e governança corporativa. A BRF é a única companhia do setor alimentício presente na carteira deste índice.
“É um orgulho, um reconhecimento grande do trabalho que a gente está fazendo. Depois de três anos de prejuízos da companhia, divulgar um resultado de R$ 1,2 bilhão e também o reconhecimento do ISE nos dá muita confiança em relação ao caminho que a companhia está tomando e o que a gente espera para 2020”, conclui o CEO, Lorival Luz.
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Luciene Miranda é jornalista especializada em Economia, Finanças e Negócios com coberturas independentes na B3, NYSE, Nasdaq e CBOT
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