Na semana passada, o Ministério da Saúde publicou no Diário Oficial a portaria 467, que regulamenta o atendimento médico à distância, uma prática até então proibida no país, com exceção dos tratamentos relacionados às doenças psicológicas. Com o isolamento social imposto para tentar conter a disseminação do novo coronavírus, a medida foi tomada em caráter excepcional e está autorizada apenas enquanto durar a pandemia. Nesse período, a modalidade poderá ser usada para orientação dos pacientes e, se necessário, encaminhamento médico; monitoramento de parâmetros de saúde e/ou doença, realizado sob orientação e supervisão médica; e troca de informações e opiniões entre profissionais da saúde de padrões para auxílio diagnóstico ou terapêutico tanto pela rede pública quanto pela privada.
“Vamos utilizar de toda a potencialidade da telemedicina. Ela não será somente de médico a médico, será aberta de maneira geral para as pessoas poderem fazer consultas tendo do outro lado profissional de saúde capacitado para poder fazer o manejo clínico”, declarou o Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, ao anunciar a medida.
Estudos internacionais já comprovaram que o uso da telemedicina reduz em 32% os custos com urgência, emergência e consulta eletiva e reduz em 30 milhões o número de consultas presenciais por ano. Desde 2011, os investimentos na área ultrapassam os US$ 38 bilhões e a expectativa é que os investimentos ganhem mais fôlego a partir de agora.
Para o Dr. Francisco Neri, Chief Medical Informatics Officer, obstetra e ginecologista do Grupo Santa Joana, para fazer frente às situações epidêmicas, onde o aumento da demanda e da complexidade da assistência são inevitáveis, formas inovadoras de acompanhamento são essenciais. “Só assim é possível evitar a sobrecarga do sistema de saúde e as consequentes extemporaneidade e ineficácia do cuidado”, diz. “A telemedicina tem potencial para as investigações epidemiológicas, o controle de doenças e o gerenciamento de casos clínicos, enquanto racionaliza o uso dos recursos de saúde.”
Adriano Fontana, CEO e cofundador do BoaConsulta, startup que conecta pacientes a especialistas por meio de uma plataforma para agendamento online, diz que o teleatendimento é um formato que está completamente alinhado com a medida primordial de combate ao novo coronavírus: ficar em casa. Com a nova ordem mundial, a startup está disponibilizando, a partir de quinta-feira (2), cerca de 10 médicos da sua equipe para atendimentos gratuitos por videoconferência que vão de 15 a 20 minutos. “São plantões para tirar as dúvidas em relação à Covid-19, quais os sintomas, quais as medidas que devem ser tomadas pelo paciente. É um vírus com uma velocidade de contágio alta, portanto, a desinformação sobre ele abre espaço para um pânico generalizado. Para evitar isso, vimos que era o momento de iniciarmos os testes da nossa solução de teleatendimento com os teleplantões sobre o novo coronavírus”, explica.
Fontana diz que, a princípio, a solução será oferecida à sua base ativa de pacientes – cerca de 1 milhão de pessoas que já estão habituadas a utilizar continuamente o app para marcar consultas, ou seja, minimamente familiarizadas com a tecnologia. “Mas, pensando além desta ação inicial, a solução será útil para toda a população que precisa de atendimento, principalmente enquanto a situação do país não voltar à normalidade. Especificamente para os idosos, entendemos que de agora em diante eles também farão usufruto de uma plataforma online para acompanhamento de sua saúde, mesmo que auxiliados por terceiros no início. A experiência de tê-los como usuários, inclusive, é fundamental para desenvolvermos uma solução cada vez mais simples e intuitiva.”
Segundo o executivo, a plataforma, no que diz respeito à infraestrutura e tecnologia, está preparada para suportar milhares de consultas por dia. “Com base no número de pacientes ativos atualmente e em uma curva de adesão progressiva, esperamos chegar rapidamente a 5.000 consultas diárias quando disponibilizarmos a solução para toda a base de prestadores cadastrados, com múltiplas especialidades e, inclusive, convênios. E isso acontecerá após os teleplantões iniciais para a Covid-19.”
Quem anunciou algo parecido foi a startup curitibana de agendamento online de consultas Doctoralia. Desde o último dia 27, a empresa disponibilizou sua solução para o atendimento a pacientes por meio de videoconferência às instituições do sistema público de saúde interessadas, de maneira gratuita. Com a ferramenta, os atendimentos, antes realizados em locais de alta circulação de pessoas, serão feitos remotamente.
“Todo o atendimento aos pacientes, desde a triagem até a consulta, poderá ser realizado pela plataforma. Os médicos vão avaliar o estado de saúde e indicar o tratamento. Os casos mais graves serão encaminhados para os hospitais e Unidades Básicas de Saúde (UBSs)”, esclarece o CEO da startup, Cadu Lopes. Para o executivo, a telemedicina, além de promover a segurança do enfermo e da comunidade, ainda garante a proteção dos dados dos pacientes, pois segue o padrão norte-americano de criptografia avançada AES e está de acordo com a General Data Protection Regulation (GDPR), a Lei Geral de Proteção de Dados europeia.
A plataforma também está disponível para profissionais de saúde do setor privado de todas as especialidades. “A adesão à tecnologia tem sido grande. Em seis dias, mais de 3.500 consultas por vídeo foram marcadas com os mais de 1.500 profissionais de saúde cadastrados na plataforma”, conta Lopes.
AMPLO ACESSO MÉDICO
O Cubo Itaú, um dos mais importantes centros de fomento ao empreendedorismo tecnológico da América Latina, possui desde agosto de 2018 uma vertical dedicada a soluções inovadoras em saúde, o Cubo Health, cujas startups possuem diversas propostas de orientação médica remota e acompanhamento de tratamentos. “A telemedicina torna os processos médicos mais ágeis e aumenta a resolutividade dos atendimentos, evitando assim visitas desnecessárias a emergências e levando o acesso a médicos para todo Brasil. Em momentos como esse, ela se torna essencial, ajudando a desafogar os hospitais. Está claro que se existia alguma dúvida em relação a importância das healthtechs, não deve haver mais”, diz Renata Zanuto, co-head do Cubo.
É lá que fica, por exemplo, a Hisnëk, que usa a inteligência artificial Ivi para interagir com colaboradores de empresas de forma dinâmica e efetiva, promovendo saúde e prevenindo de doenças. A ferramenta é responsável por gerar dados populacionais de qualidade de vida e bem-estar, guiando as ações de prevenção, manutenção de saúde e bem estar focando em três pilares: alimentação e nutrição, saúde mental e atividade física.
O centro de fomento também apoia a Conexa e a Docway, que oferecem orientação médica por vídeo, com atendimento humanizado e tecnológico para operadoras de saúde, hospitais e pacientes diretamente – mas até agora não podiam, por exemplo, prescrever receitas. E a Cuco Health, que atua no acompanhamento de tratamentos ajudando pacientes crônicos a melhorarem sua adesão medicamentosa, facilitando a recompra e o controle, além de ajudá-los na compreensão sobre a doença gerando dados para a equipe de saúde responsável.
Vitor Moura, CEO da VidaClass, plataforma de saúde digital que já disponibiliza enfermeiros para fazerem uma avaliação online dos sintomas do coronavírus diretamente pelo aplicativo e pelo site da empresa, traz à tona a situação atual do país no que diz respeito à saúde. “Cerca de 170 milhões de brasileiros não possuem nenhum plano de saúde e o acesso a um médico ou mesmo a um tratamento da rede pública pode demorar meses. Destaco que não estamos falando de qualidade de tratamento, mas das dificuldades em ter acesso a algum tipo de especialidade”, diz. “Se nos grandes centros, em uma capital como São Paulo, o tempo médio de agendamento de consulta no SUS, em 2018, era de 85 dias, como agir em localidades como Amazonas e Pará?”, pergunta.
ANTES E DEPOIS DO CORONAVÍRUS
Para Thiago Julio, gerente de inovação aberta da Dasa, sponsor do Cubo Health, as startups de telemedicina tiveram um aumento significativo na demanda recentemente, gerando um desafio muito grande. “Ninguém teve tempo de se preparar de fato para este momento”, explica. “Existem startups que estão no front, atendendo pacientes e ajudando a salvar vidas, e que estão com o desafio de escalar, assim como as grandes empresas. E aí abre uma oportunidade para novos serviços, regulamentação e até de investimento, pois governo e instituições fomentadoras vão querer investir nas healthtechs”, continua o especialista. Para ele, a atual crise vai gerar uma guinada positiva para o setor, que será marcado por antes e depois do coronavírus – mostrando ao mercado que as startups de saúde são eficientes e necessárias não só para momentos de crise, mas para o desenvolvimento da saúde pública.
Se depender dos números, a tese de Thiago Julio será facilmente comprovada. A TopMed, empresa que tem um modelo de negócios focado no mercado B2B, com serviços para operadoras de saúde, setores público e corporativo, seguradoras e companhias de cartões de benefícios baseada em Florianópolis (SC), vem registrando recordes em sua central de atendimento nas últimas semanas. Desde 11 de março, quando a OMS declarou a pandemia, o número de atendimentos saltou 760% quando comparado aos três meses anteriores.
No dia 16 de março, a prefeitura da cidade lançou o “Alô Saúde Floripa”, reforçando o atendimento por telefone, aplicativo para celular e whatsapp. Apenas a central telefônica da TopMed atendeu, em três dias, mais de 2.000 moradores em busca de informações sobre o coronavírus. Os serviços ofertados são os mesmos que a empresa oferece a seus clientes em todo o país: informações em saúde, direcionamento do paciente quando é necessário procurar um centro de saúde, atendimento pré-clínico e agendamento de consultas.
O Brasil é o maior mercado de saúde da América Latina e o sétimo maior do mundo, com mais de US$ 42 bilhões gastos anualmente em cuidados de saúde privados, de acordo com o mais recente Global Startup Ecosystem Report – pesquisa do Startup Genome, que avalia os principais ecossistemas e as cidades mais promissoras no campo da inovação em todo o mundo. O país tem atualmente 353 startups de healthtech, segundo dados do Startupbase. Dessas, 34,8% estão concentradas no estado de São Paulo. Em relação ao nível de maturidade das startups nesse segmento, 46,4% delas estão em fase de tração e e 30% em fase de operação.
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NerdMonster oferece ferramentas para que pequenos negócios garantam presença online
Para tentar ajudar os pequenos e médios negócios que foram obrigados a fechar suas portas diante da pandemia do novo coronavírus, a NerdMonster, madtech (marketing, publicidade e tecnologia) do segmento de digital retail, está oferecendo, gratuitamente, acesso à sua plataforma. A iniciativa faz parte do movimento SeuNegocioNoMapa.com, criada há um ano e meio para garantir a presença digital do varejo.
“O objetivo é que essas pequenas empresas existam nos principais canais de busca da internet e, assim, possam dar continuidade aos seus negócios, pelo menos parcialmente”, diz Claudio Roca (foto), diretor geral da empresa.
A ação contempla dois passos. O primeiro está relacionado à inclusão – de uma maneira simples e imediata – na plataforma Google Meu Negócio. “Normalmente, para passar a fazer parte dela, o empreendedor precisa preencher um formulário e aguardar uns 15 dias. Com a nossa ajuda, esse processo acaba sendo instantâneo em 99% dos casos”, explica o executivo.
A próxima etapa passa por uma conversa – bem didática e sem termos técnicos – do dono do negócio com um robô, que explica a importância da presença digital, localiza o estabelecimento, checa as informações que existem na internet sobre ele e oferece algumas recomendações, como o cadastro em outros canais, o diálogo com os consumidores e a atualização constante das informações.
“Atualmente, apenas 11% das micro, pequenas e médias empresas no Brasil possuem algum tipo de presença digital. Isso precisa mudar e este é o momento”, diz Roca. O executivo embasa essa necessidade com estatísticas: 96% dos consumidores que compram numa loja física pesquisaram, primeiro, no ambiente online. “Não dá mais para estar em apenas um lugar.” A NerdMonster atende, atualmente, 38 mil estabelecimentos no país e conta com o apoio de empresas como Alelo e Coca-Cola no movimento SeuNegocioNoMapa.com, que estão levando a solução para suas redes de parceiros e clientes.
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ClassPass cria rede de apoio para instrutores e estúdios
A ClassPass, rede mundial de experiências fitness e de bem-estar, acaba de anunciar uma estratégia para repassar recursos para os estúdios e instrutores que não podem oferecer aulas presenciais devido à Covid-19. Uma dessas iniciativas contempla aulas transmitidas ao vivo por meio do aplicativo e site da plataforma com 100% dos pagamentos destinados diretamente a eles até 1º de junho – ou seja, a empresa está abrindo mão da sua taxa. Além disso, a startup criou um fundo de apoio aos parceiros que passa a oferecer aos membros da plataforma uma forma fácil de doação de créditos para seus estúdios favoritos diretamente no aplicativo. A proposta é beneficiar todos os parceiros com contribuições de até US$ 1 milhão.
“A pandemia global apresentou um desafio diferente de qualquer outro que a indústria fitness e de bem-estar já tenha visto. Quase 90% dos nossos 30.000 parceiros entre academias, estúdios e demais estabelecimentos em 30 países fecharam indefinidamente seus locais físicos. Precisamos agir agora para proteger esses negócios que mantêm nossa população saudável e resiliente”, afirma o CEO Fritz Lanman.
As reservas estão abertas para as próximas aulas com transmissão ao vivo organizadas por mais de 500 parceiros. Para os estúdios interessados em organizar aulas online pela primeira vez, a ClassPass vai oferecer treinamento e recursos para educar os profissionais fitness sobre as melhores práticas e ajudá-los a ingressar na plataforma. A startup também ajudará os proprietários de estabelecimentos do setor a entenderem os recursos financeiros disponíveis e a solicitar empréstimos e assistência governamental.
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MAIS
– A Claro, Oi, TIM e Vivo se uniram em um movimento para ajudar os brasileiros que estão em casa durante o isolamento social por conta da pandemia da Covid-19. Com a hashtag #FiqueBemFiqueEmCasa, a campanha apresenta as iniciativas em comum das empresas focadas na crise, como a liberação de conteúdo de TV e internet, bônus de internet no celular e navegação gratuita no app Coronavírus SUS;
– A NeoAssist, empresa de tecnologia omnichannel para atendimento ao cliente, acaba de disponibilizar, de maneira gratuita, uma plataforma de chat para hospitais, laboratórios e clínicas tirarem dúvidas de pacientes, remotamente. O acesso será oferecido por 90 dias.
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