Três anos depois de desenvolver um teste que analisa os genes do paciente para traçar a melhor combinação de medicamentos para doenças da mente como depressão, ansiedade e bipolaridade, a gntech anuncia o mesmo recurso para tratamentos oncológicos. Isso significa que, a partir de agora, pacientes com essas condições clínicas poderão recorrer aos testes farmacogenéticos como suporte à parte do procedimento relacionada aos medicamentos. “É uma forma mais rápida, segura e eficiente de prescrição”, diz o Dr. Guido Boabaid May, médico psiquiatra e atual CEO da empresa.
A startup surgiu em Florianópolis, onde o médico, que também atua no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, mantém seu consultório. O Dr. May não se conformava com os tratamentos à base de erros e acertos usados nos pacientes com distúrbios psicológicos, um mal que assola a população brasileira há anos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil ocupa o primeiro lugar no ranking internacional de países com o maior número de pessoas com transtorno de ansiedade: 18,6 milhões. Segundo as projeções, até o final de 2020 as questões de saúde mental se tornarão a principal causa de afastamento do trabalho por aqui.
O médico explica que apenas 50% dos medicamentos do tipo funcionam na primeira tentativa. E essa proporção vale para cada um deles, ou seja, se for necessário combinar dois ou três, por exemplo, as chances vão diminuindo exponencialmente. Isso sem falar das doses, outra variável. E quanto mais tentativas falhas, mais difícil de tratar fica. “A tendência é que a doença acabe se tornando crônica, com mais medicamentos e doses cada vez maiores.”
Em 2011, durante um congresso de psiquiatria nos Estados Unidos, o Dr. May teve o primeiro contato com um teste farmacogenético, campo da genética que se dedica a estudar como o nosso DNA influencia o comportamento dos medicamentos no organismo, já que as pessoas reagem de maneira diferente a eles. “Hoje sabemos que grande parte da resposta aos remédios se deve às diferenças no nosso DNA. Assim como interfere nas nossas características físicas, ele também atua na maneira como metabolizamos e respondemos aos medicamentos, principalmente no que diz respeito ao sistema nervoso central”, explica. “Com o sequenciamento do genoma humano, em 2003, surgiram vários desdobramentos para diversos ramos da ciência e da medicina, inclusive o aumento dos estudos publicados sobre farmacogenética. Atualmente, são cerca de 1.800 por ano.”
Interessado em trazer os testes para o Brasil, o Dr. May fechou uma parceria com dois fornecedores norte-americanos, uma operação que consumiu quase dois anos entre idas e vindas e que previa a posterior instalação no país. Uma vez consumada essa fase, nasceu a gntech, que conta com a participação da advogada Paula Boabaid May, esposa do Dr. May, que deixou de lado a carreira para atuar como COO da nova empresa. Em 2014, com a alta do dólar e as notícias da Operação Lava Jato, as empresas norte-americanas cancelaram as operações locais e os contratos foram rescindidos. A gntech deixou de ser uma mera distribuidora e passou, então, a tocar a operação sozinha, desenvolvendo a tecnologia local com investimentos dos próprios sócios. Dois anos mais tarde, depois da concepção do painel genético – quais genes são avaliados e as variantes –, a startup fechou uma parceria com laboratórios da USP, que recebiam as amostras e faziam o sequenciamento, para posterior análise da gntech.
COMO FUNCIONA
O teste funciona por meio do esfregaço de swab (uma espécie de cotonete). O paciente recebe um kit com todas as instruções, faz a raspagem para coleta de células bucais, fecha o tubo onde o material fica armazenado, coloca em um envelope e envia pelo correio para o Hospital Albert Einstein, o atual parceiro, que faz o sequenciamento genético e envia os resultados para a gntech. Lá é que o trabalho de análise acontece.
Todo o processo dura cerca de 30 dias e custa, para o paciente, R$ 3.582. Além de impresso, o laudo fica disponível digitalmente, mediante login e senha, inclusive para o médico. “Em todos os casos, são avaliados três tipos de influência do DNA na atuação dos medicamentos: a metabolização, que interfere na dosagem do remédio, a resposta, diretamente ligada à sua eficácia, e a toxicidade, responsável pelos efeitos colaterais. “Qualquer profissional especializado consegue interpretar os resultados e prescrever uma combinação de remédios mais adequada ao DNA do paciente”, explica o Dr. May.
No caso do teste para o sistema nervoso central, são analisados 26 genes, as variantes genéticas e suas interações com fármacos relevantes à psiquiatria, neurologia e tratamento da dor – são quase 80 substâncias, entre antidepressivos, antipsicóticos, ansiolíticos, anticonvulsionantes/ estabilizadores de humor, hipnóticos/ indutores do sono, psicoestimulantes, não estimulantes, inibidores de COMT, antagonistas de opioides e analgésicos/opioides. O laudo indica aqueles que devem ser usados conforme a bula (impacto mínimo ou ausente), os que demandam mais atenção (impacto moderado) e os que precisam ser ministrados com cautela (impacto significativo).
“Dessa forma, o médico entende que, em determinado caso, a dose máxima de protocolo, por exemplo, não fará efeito, porque o paciente tem um metabolismo reduzido e probabilidade de efeitos adversos”, explica.
O teste farmacogenético para oncologia contempla as interações de 17 substâncias de fármacos antineoplásicos, imunossupressores, antieméticos e analgésicos. “No caso de pacientes oncológicos, por exemplo, a informação sobre a toxicidade do medicamento é um item imprescindível, já que os efeitos colaterais podem ter impactos muito severos devido à fragilidade física.”
MERCADO
Segundo levantamento da gntech, em 2018 foram comercializados mais de 12 milhões de testes farmacogenéticos nos Estados Unidos, o equivalente a 3,75% da população. No Brasil, a expectativa é que o recurso seja usado por apenas 0,45% das pessoas em 2020, ou 2,5 milhões.
No caso da startup catarinense, as vendas aumentaram de 32 testes e faturamento de R$ 106 mil em 2016 para 2.442 testes e R$ 8,2 milhões em 2019. A expectativa é que, este ano, o total de testes chegue a mais de 4.000, com faturamento próximo de R$ 14 milhões. Além de convênios com cerca de 30 laboratórios e clínicas, a gntech também vende direto ao consumidor, que normalmente acaba arcando com o custo. “Como os planos de saúde não cobrem, temos alguns casos de fornecimento por via judicial”, conta Paula, revelando que, há algumas semanas, foi surpreendida pela compra de oito testes, de forma voluntária, por uma prefeitura.
“Os testes estão sempre evoluindo. Estamos desenvolvendo agora uma nova versão, no caso do sistema nervoso central, com análise de 93 medicamentos. A versão oncológica chegará a 17. Até o meio do ano, a ideia é lançar um pacote completo, com testes também para outras áreas da medicina, como cardiologia, endocrinologia, geriatria e infectologia. Serão cerca de 170 substâncias”, adianta o Dr. May.
“A lógica é sempre a mesma: conectar todas as informações farmacológicas dos medicamentos a determinado gene com base em estudos científicos. Com isso em mãos, fica mais simples tomar uma decisão sobre a parte do tratamento que envolve medicação.”
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Y Combinator vai selecionar startups no Brasil
A Y Combinator, uma das principais aceleradoras do mundo, está realizando, pela primeira vez, entrevistas no Brasil para selecionar startups sul-americanas para seu programa. Elas serão realizadas em São Paulo, entre 16 e 18 de maio, e as empresas aceitas se juntarão à turma do verão 2020. O programa tem início previsto para junho, em Montain View, Califórnia, mas o financiamento, os recursos e o acesso aos parceiros serão imediatos. Entre as empresas que já receberam apoio da Y Combinator na América do Sul estão Rappi e Quero Educação. As inscrições vão até 16 de março.
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Startup SC divulga as 50 selecionadas para o Programa de Capacitação de 2020
O programa de capacitação Startup SC, iniciativa da unidade do Sebrae em Santa Catarina, acabou de divulgar as 50 startups selecionadas para as turmas que serão realizadas simultaneamente em quatro cidades do estado: Blumenau, Chapecó, Joinville e Florianópolis.
Durante oito meses os participantes terão acesso a workshops e mentorias presenciais e online gratuitas. Ao todo, os benefícios podem chegar a R$ 300 mil, incluindo acesso a serviços de cloud, CRMs e ferramentas de marketing digital.
Nesta 10ª edição, 334 startups de 38 cidades catarinenses se inscreveram: 35% de Florianópolis, 12% de Joinville, 12% de Blumenau e 6% de Chapecó. Em relação à receita, a maioria das selecionadas – 53% – opera no modelo de software como serviço (SaaS). Já no que diz respeito ao negócio, 49% são B2B, 27% são mistas B2B + B2C e 10% são B2C. Outro ponto é que 43% dos projetos apresentados já possuem clientes pagantes.
Das 50 selecionadas, 10 são de Chapecó, como a Moeda Verde, startup de impacto social que incentiva bons hábitos na população por meio de recompensas. Outra dezena pertence à cidade de Blumenau, entre elas, a Suaview, uma plataforma integrada de vitrine inteligente para comércio eletrônico. Vinte das escolhidas são de Florianópolis, como a Fazenda Bioma, fazendas urbanas verticais inteligentes, que produzem hortaliças em qualquer lugar a partir de um ponto de energia, e a Payface, fintech que proporciona a experiência de pagamento usando apenas o rosto. Em Joinville estão as dez restantes, como a Roboteria Shakes & Sundaes, que busca revolucionar o varejo, aumentando a eficiência, reduzindo custos e desperdícios por meio da automação.
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MAIS
– Um recente estudo do Finanso.se revelou que o mercado global de crowndfunding deve continuar crescendo em 2020, quando pode atingir US$ 8,5 bilhões em transações, crescimento de 23,3% em relação ao ano passado. Até 2023, a expectativa é que o volume captado por essa alternativa de financiamento coletivo, geralmente por meio de plataformas online, chegue a US$ 12 bilhões. Atualmente, a China é responsável por 85% de todas as transações do tipo no mundo;
– O coronavírus está mostrando como as crianças podem ser criativas. Após terem suas aulas suspensas, alunos de Wuhan, na China, ainda comemoravam quando descobriram que os professores estavam usando um aplicativo chamado DigiTalk para conduzir as aulas de forma online e enviar a lição de casa. Cientes de que, em caso de má avaliação, o app seria banido da Apple Store, as crianças começaram a dar notas baixas a ele. Da noite para o dia, a avaliação do DigiTalk caiu de 4,9 para 1,4 estrelas.
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