Neste finzinho de setembro, mês em que as organizações de saúde de todo o mundo chamam a atenção para a questão do suicídio, quero falar sobre uma outra forma de autoeliminação: o suicídio lento.
Evidentemente, muitos esforços são colocados no entendimento das razões que levam alguém a querer tirar a própria vida, assim como em medidas preventivas que consigam evitar que uma pessoa que está decidida a se matar o faça. Como disse 15 dias atrás, esta é situação de maior urgência da Psiquiatria, a qual requer uma intervenção imediata.
Não está muito claro, inclusive para mim, se os mesmos esforços são aplicados à prevenção de uma morte desejada, mas lenta. Não se trata de uma condição aguda, vamos dizer assim, em que alguém põe fim à própria vida de uma maneira abrupta. Ao contrário. No suicídio lento, a pessoa vai desligando as tomadas da própria vida, definhando, afundando. É um abandono da vida pouco a pouco.
Muitos daqueles que cometem suicídio lento são pessoas cuja relação com o álcool ou com as drogas é de total dependência. Para essas pessoas, o sentido da vida passou a não mais ser dado pelas experiências que elas verdadeiramente têm – ou se permitem ter -, porque as suas experiências de vida passaram a ter um intermediador, um meio de campo que não é legal: justamente o álcool ou as drogas.
Essa é uma situação dramática para todos os que cercam aquela pessoa e também para nós médicos que trabalhamos com a mente. Diferentemente do suicídio propriamente dito – quando alguém está na iminência de se matar ou está em meio ao ato de se matar –, que é uma situação na qual temos a obrigação de atuar, no suicídio lento, embora saibamos que é bem provável que essa pessoa vá morrer no decorrer do tempo, não temos a certeza absoluta de que isso ocorrerá. O talvez nos impede de tomar uma atitude mais drástica.
O que sabemos – e estudos como este, publicado em 2019 na “Frontiers in Psychiatry” – é que o suicídio é um comportamento grandemente motivado pelo desejo de fugir de uma dor psicológica que aquela pessoa sente como insuportável. Isso poderia explicar a relação daquela pessoa com as drogas ou o álcool e, também, com o seu desapego lento da vida.
Neste espaço, quis chamar a atenção para as complexidades que estão por atrás de um ato de suicídio e também que o suicídio apresenta diferentes facetas. É importante que exploremos esse assunto para além das nossas crenças e opiniões pessoais. É preciso haver uma discussão saudável e respeitosa acerca desse tema.
Dr. Arthur Guerra é professor da Faculdade de Medicina da USP, da Faculdade de Medicina do ABC e cofundador da Caliandra Saúde Mental.
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