Resolvi escrever sobre um tema que não tem mais nada de novo, mas continua sendo pauta de grande parte das minhas conversas nos últimos tempos: a remuneração dos profissionais de tecnologia.
Muito tem se falado sobre o assunto, especialmente no que se refere aos aspectos intangíveis do pacote de recompensas a eles oferecido, à importância do EVP (Employee Value Proposition), à criação de todo um contexto de oferta de valor que torne a marca empregadora mais atrativa e o ambiente de trabalho mais motivador e capaz de engajar o time.
LEIA TAMBÉM: Desmistificando os planos de stock options
Mas verdade seja dita, você tem que oferecer todos esses “perks” (os mimos e novos benefícios) sem deixar de acompanhar a evolução alucinante no valor da remuneração. Não está sendo fácil atrair e reter as pessoas mesmo com todo esse tratamento diferenciado. Os projetos desafiadores, o ambiente divertido, a sala de jogos e o lanchinho já viraram lugar-comum e não são mais um diferencial para grande parte dos profissionais de tecnologia. Digo isso porque mesmo as empresas mais admiradas nesta área, para as quais setores mais tradicionais perdem profissionais, também estão sofrendo com a alta rotatividade do time.
É verdade que a lei da oferta e da procura dita a regra no mercado de trabalho. É natural que aumente o custo da mão de obra quando se tem pouca gente treinada e muita procura pelo serviço que oferecem, e é também preferível ceder a esse aumento desenfreado do salário ao custo da perda e da reposição dos profissionais. Mas até quando vamos achar que esta é a única solução?
Infelizmente não tenho um coelho para tirar da cartola e um remédio de efeito rápido para oferecer. Podemos assumir que esse é o tipo de trabalho que passará a ser essencialmente terceirizado ou que este seja um problema que só possa ser resolvido com um investimento contínuo na contratação de pessoas para serem formadas e desenvolvidas internamente na base da carreira.
Não estou falando sobre contratar para repor vagas, mas sim do planejamento das vagas do futuro, antecipando e iniciando este processo desde já e continuamente para não permanecer refém da escassez de recursos atual. Até lá, o leilão que presenciamos vai mesmo ditar as regras. Quando não temos tempo de desenvolver internamente, precisamos “comprar” profissionais do mercado. E me digam vocês, o que acontece com o valor dos salários neste ambiente em que ficamos pescando no aquário?
Estão todos apostando na mesma estratégia: pagar salários fixos superiores às referências apontadas nas pesquisas de mercado e reajustar os salários com frequência muito maior do que se faz para quaisquer outras áreas e cargos, além de eventualmente premiar os times por sprints (pequenas entregas dentro dos projetos) ou entregar algum incentivo de longo prazo, que nem sempre é entendido e valorizado. Estamos então causando esse problema que vivemos! Se todas as empresas investem na mesma estratégia de pagar acima do mercado e continuam preferindo contratar gente pronta a desenvolver internamente, esse ciclo vicioso não acaba nunca, e o que era “acima do mercado” ontem se torna pouco competitivo amanhã.
Isso sem falar no fato de estarmos também competindo com empresas de fora do Brasil, que pagam em dólar ou euro para as pessoas continuarem trabalhando do conforto de seus lares, em home office (e com o nosso câmbio, está bem difícil competir com essa nova realidade).
Já vivemos essas bolhas antes. Lembram-se de quando tivemos algo parecido com a escassez de engenheiros? Pois é, a bolha eventualmente estoura. Acho até que vai demorar bem mais desta vez, porque nesse novo momento, a velocidade de crescimento na demanda das empresas é muito maior do que a capacidade de formação de pessoas. Por esta razão, acredito que a solução esteja no investimento das empresas em jovens.
Se ao menos parte dessas pessoas treinadas permanecer na empresa, aos poucos a demanda por profissionais qualificados será suprida e começaremos a depender menos dos leilões salariais. Leilões que hoje, infelizmente, não garantem necessariamente a associação de atributos como experiência, maturidade ou qualidade técnica à contratação de um profissional “sênior”.
Fernanda Abilel é sócia-fundadora da How2Pay, consultoria focada no desenho de estratégias de remuneração, e professora de remuneração no MBA de Recursos Humanos da FGV e na World at Work.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.
Siga FORBES Brasil nas redes sociais:
Facebook
Twitter
Instagram
YouTube
LinkedIn
Siga Forbes Money no Telegram e tenha acesso a notícias do mercado financeiro em primeira mão
Baixe o app da Forbes Brasil na Play Store e na App Store.
Tenha também a Forbes no Google Notícias.