Advogada por formação, a francesa Laure Allard, fez sua primeira incursão no design de moda com um desfile no line up da São Paulo Fashion Week, na última quinta-feira. Ela desenhou peças para vestir a equipe que vai dar vida ao funcionamento do hotel Rosewood São Paulo, que faz parte do complexo Cidade Matarazzo.
Laure desenhou, entre outras peças, ternos risca-de-giz, tailleurs com pois, vestidos prés-du-corp e saias godês que serão usados em vários ambientes – da conciergerie ao restaurante Blaise e o jazz bar – com o delicioso nome de Rabo de Galo – passando pelo atendimento, marketing e governança. Na tarefa, usou seu apurado olhar de estilo e um amplo repertório histórico-cultural.
Laure é casada com o empresário francês Alexandre Allard, que há dez anos trabalha na criação e realização do ambicioso projeto Cidade Matarazzo que, além do hotel, compreende também uma torre de escritórios, uma fashion megastore, restaurantes e um centro cultural. Tudo localizado em ampla área, próxima à Avenida Paulista, onde funcionou por muitos anos o antigo Hospital Umberto I – popularmente conhecido como Hospital Matarazzo.
“Basicamente trabalho com meu marido e nunca tive um cargo oficial na empresa, mas achei interessante idealizar e desenhar essa coleção sozinha. Não só por ser um pedido dele, mas porque também estou envolvida no projeto há 13 anos”, diz ela, que contou com a colaboração do estilista Marcelo Sommer e do TS Studio no desenvolvimento e supervisão da produção.
Laure também conta que o casal teve outra experiência com a moda, na revitalização da marca Pierre Balmain, por exemplo. “Não se pode dar palpite no trabalho de um gênio da moda. Então eu só observava”, diz ela sobre a marca que, na época, tinha como diretor criativo o estilista Christophe Decarnin.
Pelo jeito, Laure observou muito bem e deu um show com o figurino destinado à equipe. E entrega: “Meu marido já pediu algumas peças da coleção para ele usar”. Em clima de soft opening, o Cidade Matarazzo começa a funcionar em dezembro, com inauguração oficial em março, depois do Carnaval.
A seguir, alguns momentos da conversa com Laure Allard logo após o desfile.
Tristeza, por favor vá embora
“Sempre observei, mesmo nos grandes hotéis que investem milhões na arquitetura assinada por nomes consagrados, que o uniforme da equipe é feio, feito com tecidos de baixa qualidade, modelagem ruim e as pessoas visivelmente sofrem por terem de usar aquelas roupas todos os dias. Elas se sentem desvalorizadas. Eu mesma, quando jovem, trabalhei para uma famosa marca de bebidas, em Paris, e meu uniforme era de uma cor tão infeliz que eu parecia estar fantasiada. Pensando nisso, decidi criar essa coleção. Afinal, trabalhar na equipe de um hotel como o Rosewood São Paulo significa estar vestido à altura da arquitetura de Jean Nouvel, da decoração de Philippe Starck e de obras de mais de 50 artistas brasileiros.”
Geleia geral
“Para o desfile eu não quis usar modelos profissionais. Convidei pessoas que realmente fazem parte da equipe, algumas celebridades brasileiras e vários amigos. Um dos homens que desfilaram, nasceu no Hospital Matarazzo. Lembra dos desfiles do Jean Paul Gaultier, quando ele colocava para desfilar aquela diversidade de pessoas? Uma verdadeira comunidade? Foi a minha inspiração. E o Brasil é um país diverso. A trilha sonora do DJ Zé Pedro – com músicas brasileiras cantadas em francês e vice-versa – ajudou a trazer ainda mais alegria para a apresentação.”
Tupi or not Tupi?
“Minha maior inspiração, no entanto, foi o ‘Manifesto Antropofágico’, do Oswald de Andrade. Porque fiz um mix de influências brasileiras, francesas e internacionais. Afinal foi ele quem disse ‘Tupi or not Tupi?’, não é? Sem falar na Semana de Arte Moderna, que completa 200 anos em 2022 e, eu acredito, deve movimentar São Paulo. Minha ideia geral foi fazer um mix do surrealismo francês com as raízes do Brasil e revisitados pela Antropofagia e o Modernismo de 1922 que, aliás, também inspiraram o décor do Philippe Starck.”
Na casa do conde
“Os ternos que eu desenhei, com lapelas e gravatas largas, são referência aos trajes do conde Francisco Matarazzo. A ideia é que os hóspedes sejam os convidados do conde.”
Hollywood cabocla
“Outra referência foram os filmes da Vera Cruz – Ciccillo Matarazzo era um dos investidores da companhia de cinema – que influenciaram o décor do jazz bar Rabo de Galo. Sobretudo, ‘O Cangaceiro’ que recebeu um prêmio em Cannes, e me fez pensar em estampas florais e coloridas.”
Produto Nacional
“A cultura brasileira é muito rica e deve ser tratada com elegância, respeito e bom gosto.”
Com Mario Mendes e Antonia Petta
Donata Meirelles é consultora de estilo e atua há 30 anos no mundo da moda e do lifestyle.
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