Temos acompanhado as notícias de que a Comissão Europeia propôs regulamentar a origem de seis commodities, soja, carne bovina, óleo de palma, madeira, cacau e café, visando assegurar que estes produtos não estimulem o desmatamento ilegal nos países produtores.
O cerco vai se fechando e para conseguirmos acabar com a mancha que o desmatamento ilegal faz na reputação brasileira, o caminho passa pela regularização fundiária. Só é possível conhecer e punir os criminosos ambientais, se soubermos quem é o dono da terra. O número de posses não registradas, irregulares é muito grande e isto é retrato de um país que não cuidou de sua política agrária. Estas posses, em sua grande maioria, são de terras devolutas, que não foram registradas em cartório pelo estado, porém estão ocupadas; para que seja possível a titulação da terra é preciso que os ocupantes cumpram funções sociais, ambientais e econômicas.
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Quando o produtor tem o título da terra em mãos, ele sai automaticamente da ilegalidade pois possui, CPF, endereço, é rastreável, identificável e não se sujeitaria a infringir a lei. Este produtor, em sua maioria os pequenos produtores, poderá desta maneira participar do agro do futuro, que passa pela certificação. Como poderemos certificar a origem da produção para consumo interno ou para exportação, se estes produtores nem ao menos tem acesso a documentação da terra?
Segundo Maurício Palma Nogueira, da consultoria Athenagro, sem planejamento, a tentativa de controlar os fornecedores indiretos excluirá inúmeros pequenos produtores, cuja produção não será passível de monitoramento: eles serão injustamente jogados na ilegalidade.
Retirar estes produtores da ilegalidade é a melhor maneira de proteger a floresta e fazer a recuperação de áreas desmatadas ilegalmente. A previsão é de que caso aconteça a regularização fundiária, aproximadamente 4 milhões de hectares poderão vir a ser recuperados e reflorestados. É importante pontuar que no Brasil a preservação vem antes da produção rural, sem a RL, reserva legal e as APPS, áreas de preservação permanente e o CAR, cadastro ambiental rural, o produtor não consegue regularizar a sua propriedade, não consegue crédito, muito menos vender a sua produção. A produção rural caminha de braços dados com as leis ambientais, por outro lado, os grileiros vivem na ilegalidade e na clandestinidade.
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De acordo com o Ministro Aldo Rebelo, relator do código florestal e profundo conhecedor do Brasil rural, os beneficiários da regularização fundiária seriam pequenos proprietários rurais, 78% são propriedades de até um módulo fiscal, se incluirmos propriedades de até dois módulos fiscais, chegaremos a 89%, caso incluamos nesta conta, propriedades de até 6 módulos fiscais, seriam 96%. Restam 4% de médias e grandes propriedades em situação de irregularidade, que também têm direito dentro da lei a ter a sua propriedade regularizada; portanto não seria o grileiro o beneficiado, é o proprietário legítimo, principalmente o pequeno.
Rebelo ainda lembra que muitos destes produtores irregulares foram convocados pelo governo na década de 70, quando o governo dizia no seu chamado que havia “uma terra sem homens, para homens sem terra”. Famílias inteiras decidiram mudar o rumo de suas vidas, mudando-se para rincões sem infraestrutura, compraram suas terras em licitação pública e até hoje não conseguiram a regularização de suas propriedades, vivendo à margem da legalidade, sem acesso a crédito, aos benefícios da extensão rural.
Com a regularização fundiária e ambiental, ficaria facilitado o acesso ao crédito, adoção de novas tecnologias, novos investimentos e formas de cooperativismo. Esta regularização traria segurança jurídica, garantindo o direito de transmissão da terra evitando desta maneira que as novas gerações migrem para cidades.
O que existe na verdade é um enorme ruído em torno do tema, devido ao distanciamento entre campo e cidade. Críticas à regularização fundiária visam desestimular desmatamentos e queimadas ilegais, como se fosse haver um estímulo às ocupações. Quando na verdade, a regularização fundiária traria a garantia da aplicação efetiva da lei, segurança jurídica, garantindo acesso a benefícios para o desenvolvimento e o meio ambiente.
Helen Jacintho é engenheira de alimentos por formação e trabalha há mais de 15 anos na Fazenda Continental, na Fazenda Regalito e no setor de seleção genética na Brahmânia Continental. Fez Business for Entrepreneurs na Universidade do Colorado e é juíza de morfologia pela ABCZ. Também estudou marketing e carreira no agronegócio.
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