Por anos acreditei que o Dia Internacional da Mulher era um dia para a mulher ser homenageada, valorizada e presenteada, pelo homem. Eu esperava mensagens, elogios ou pequenas ações de afeto que enfatizavam as minhas qualidades enquanto mulher, pelo viés e opinião masculinos. Eu aguardava receber essas demonstrações, assim como um cachorrinho aguarda o biscoito como recompensa por ser um bom garoto, ou no meu caso, uma boa garota. Esse foi o significado que a televisão, o comércio e a sociedade me passaram da data de hoje. À época, mal eu sabia, que na verdade, este dia é de extrema relevância. Um dia criado por mulheres, para mulheres.
Por volta de 1910, no contexto das lutas das mulheres contra a opressão e pela igualdade de direitos, a ativista alemã Clara Zetkin propôs, durante a Segunda Conferência Internacional das Mulheres Socialistas em Copenhague, a criação de um dia para reivindicar demandas e celebrar conquistas. No ano seguinte, como proposto, o Dia Internacional da Mulher passou a ser anualmente celebrado, na Áustria, Dinamarca, Alemanha e Suiça, no dia 19 de março. Neste dia, mais de um milhão de mulheres saíram pelas ruas reivindicando seus direitos civis, direito a voto, ao trabalho, aos estudos e treinamentos e a necessidade de representação feminina em cargos públicos e políticos. Menos de uma semana depois, no dia 25 de março, ocorreu o incêndio da fábrica Triangle Shirtwaist em Nova York, onde 140 mulheres imigrantes, na sua maioria judias e italianas, morreram consumidas pelo fogo ou se atirando janela abaixo. Esse terrível desastre trouxe ainda mais atenção às leis de trabalho dos Estados Unidos e manifestações se multiplicaram contra as condições insalubres que as mulheres eram submetidas. Alguns anos depois, na Rússia, ocorreram protestos por parte de trabalhadoras por melhores condições de vida e de trabalho e contra a entrada da Rússia na Primeira Guerra Mundial, os quais foram brutalmente reprimidos, dando origem ao início da grande Revolução de 1917. O protesto de maior importância se deu em 8 de março de 1917, pelo calendário gregoriano, data então instituída como o Dia Internacional da Mulher pelo partido das trabalhadoras da Russia. Em seguida vários países passaram a adotar a mesma data. Somente na década de 70, o ano de 1975 foi designado pela ONU como o Ano Internacional da Mulher e o dia 8 de março foi adotado igualmente pelas Nações Unidas, visando celebrar as conquistas sociais, políticas e econômicas das mulheres, independente de divisões nacionais, étnicas, linguísticas, culturais, econômicas ou políticas. Ainda se debate qual evento de fato iniciou o Dia Internacional da Mulher, diante das múltiplas manifestações e protestos da luta das mulheres por todo o mundo no decorrer da história.
Hoje, o que importa, mais do que nunca, é relembrar essas e outras grandes mulheres, e nos inspirarmos nelas, na suas lutas e coragem. Sem elas, não haveria liberdade e muitos de nossos direitos fundamentais não teriam sido conquistados. Nós os recebemos de presente, sem esforço algum, elas abriram os caminhos e hoje é nosso dever mantê-los abertos para as próximas gerações.
Nos tempos atuais, com a globalização e tecnologia, temos amplo alcance quando falamos do conhecimento da violação dos direitos das mulheres e da luta pela igualdade de gêneros. Não há como ignorar a existência das crises e causas complexas que milhões de mulheres enfrentam diariamente pelo mundo, fazendo todas nós responsáveis umas pelas outras. Muitas vitórias foram alcançadas no ano de 2020, mesmo em meio a pandemia. Entre muitas, celebro profundamente países que baniram a mutilação genital feminina, como o Sudão, que em média 86% das suas mulheres e meninas já passaram por esse procedimento terrível. Celebro também a iniciativa e vitória de Monica Lennon do Parlamento da Escócia, o país se tornou o primeiro a oferecer produtos de higiene pessoal gratuitos para meninas e mulheres. Em muitos países, milhares de mulheres enfrentam a escassez de produtos de higiene e preconceito em relação à menstruação, trazendo consequências seríssimas como interrupção e abandono dos estudos e abusos. A Nova Zelândia merece todo o reconhecimento, tendo aprovado o projeto lei de pagamento de salários sem distinção em razão de gênero, quando relacionados ao mesmo cargo e função. Em seguida a Espanha seguiu o exemplo, requerendo o mesmo de empresas e em caso de violação, altas multas serão cobradas.
Existem inúmeros motivos para celebrar o Dia Internacional da Mulher, todos os dias, nós mulheres, criamos grandes vitórias. Para o equilíbrio e bom funcionamento da sociedade precisamos estar ativas, precisamos estar na mesa onde grandes decisões são tomadas, precisamos continuar a desenvolver, pesquisar, educar, investir, gerir e comandar. Precisamos ser fortes sim e quebrar estereótipos. Não vamos permitir que tentem calar nossas vozes, para não incomodar, muito pelo contrário, não há mais espaço para tentar nos silenciar.
Que cada uma de nós continue fazendo sua parte, seja dentro da sua casa, na educação de suas filhas e filhos, no trabalho e na sua comunidade. Precisamos continuar tecendo nossa rede de apoio, dando umas as outras suporte e oportunidade, com mais amor e menos julgamento, mais compaixão e força para levantar aquela que cair, mesmo sabendo que somos todas diferentes umas das outras, mas ao mesmo tempo, sabendo que somos todas iguais.
Somos todas,
Mulheres.
Roberta Alimonda é advogada, ativista dos direitos humanos, mestre em Resolução de Disputas Internacionais (MIDS L.L.M) pela Universidade e Instituto de Pós-Graduação de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento de Genebra (IHEID)
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