Há algumas semanas dei uma palestra para quase 700 pessoas do mercado financeiro sobre ESG. Falei sobre evolução do conceito, como cada vez mais essas três letras fazem parte do dia a dia de trabalho e as motivações pelas quais, do analista ao vice-presidente, esses fatores precisam ser levados em consideração.
Em resumo, os conceitos de “E” de “environment” (meio ambiente), “S” de social (que considera o bem-estar dos funcionários e preocupações com questões sociais da comunidade onde está inserida) e “G” de governance (governança) estão presentes tanto da porta para dentro quanto da porta para fora da empresa. Isso porque as empresas já passam a ser constantemente cobradas pelos consumidores ou pelos investidores a incorporar práticas sólidas de ESG.
Segundo dados da KPMG, um em cada três consumidores entendem como fundamental a consciência da marca, ambos no cenário pós-pandemia. Além disso, 30% dos entrevistados julgam mais importante a abordagem em relação ao meio ambiente, não tolerando comprar de empresas que poluem ou destroem os recursos naturais. E também 27% dos consumidores estão mais preocupados com questões de sustentabilidade agora do que antes da pandemia.
Bem, que a necessidade de ajustes para os parâmetros ESG para atender aos anseios de clientes e investidores é progressiva, isso já está mais do que claro e os números mostram. O que começamos a ver agora também é um movimento crescente de revisão das políticas internas das empresas para endereçar também seu pilar S. Isso significa rever práticas voltadas aos funcionários, políticas de inclusão e também de saúde.
O estudo interessante LifeWorks Mental Health Index mostra que um dos fatores de preocupação relativo ao pilar social que cresce nesta fase pós-pandêmica é com a saúde mental dos funcionários. Não que isso seja assunto novo – afinal o equilíbrio mental foi um dos temas extensamente debatidos em 2020 -, porém, os olhares sobre a qualidade do ambiente de trabalho tem ampliado também.
Há quem diga que tem um “M” de “mental” crescendo dentro do “S” da sigla, justamente para sinalizar os esforços sobre saúde mental. Empresas de vários ramos estão revendo políticas de horas trabalhadas – o que chamou bastante atenção, pressão sobre resultados e interação com a liderança.
O levantamento aponta que trabalhadores que indicaram suporte sadio para saúde mental durante a pandemia tiveram melhores resultados do que as empresas que não fornecem nenhum tipo de suporte adequado. E mais: 76% dos entrevistados pelo LifeWorks afirmaram que ter suporte à saúde mental é um diferencial no momento de optar por pedir ou não demissão de um posto de trabalho.
Olhar para o bem-estar da equipe nessa fase pós-pandemia se mostra fundamental. E não é necessário ir tão longe para adotar políticas que englobem essas questões. Na minha própria equipe, além de ter a política de incentivar o diálogo constante com a liderança sobre outros fatores nas reuniões 1:1s – como o “como você está se sentindo”-, ir além das entregas abre uma porta para diálogo humano entre os colaboradores.
E mais, há alguns meses contratei uma médica de estilo de vida para que pudesse atender gratuitamente meus funcionários com recomendações, orientações, em sessões mensais. O objetivo é ajudar para que encontrem equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, que observem suas sensações e seu momento. São pequenas ações do dia a dia que demandam esforços de gerentes, líderes de RH e mesmo dos próprios colaboradores que podem auxiliar no apoio à saúde mental do funcionário.
O custo da pressão
Por outro lado, empresas que não se atentarem à essa nova realidade dos funcionários tendem a perder dinheiro. Um relatório da Lancet Commission previu que até 2030 o número de dias de trabalho perdidos em virtude de problemas dos funcionários relacionados à saúde mental vai custar à economia global US$ 16 trilhões.
E para as companhias, os impactos financeiros podem ser percebidos nos custos crescentes com saúde corporativa, acidentes de trabalho, absenteísmo, redução da produtividade, assim como perda de profissionais.
Olhar para a saúde mental significa também vislumbrar empresas mais produtivas. O Google fez um estudo – mencionado na publicação recente da Corporate Knights – com 180 equipes que mostrou que segurança psicológica estava entre uma das características principais dos profissionais de alto desempenho. Isso sem falar, claro, em evitar risco reputacional e mostrar o que de verdade é o “walk the talk” para o assunto.
Além disso, outros estudos mostram que empresas que investem nessa frente, no fim das contas, também passam essa percepção de valor aos acionistas e têm valor das ações até três vezes mais alto do que aquelas que não têm políticas claras nesse sentido.
Por fim, vale observar números que eu citei anteriormente em um artigo meu: 83% dos líderes executivos (C-level) e profissionais de investimento do mundo afirmam que esperam que os programas ESG contribuam com mais valor para os acionistas. ESG é uma realidade e veio para ficar, observar práticas sólidas que deem resultado nos negócios, na produtividade e, ao final, no valor de mercado é fundamental.
E eu acredito muito, como disse na palestra que dei há alguns dias mencionada no início deste texto, que as iniciativas devem começar de dentro para fora: analisando as práticas corporativas, o que deu certo, o que precisa ser melhorado, e aí sim divulgando para o mercado. Olhar para a própria equipe como humanos – muito além de resultados – é um grande começo.
Camila Farani é um dos “tubarões” do “Shark Tank Brasil”. É Top Voice no LinkedIn Brasil e a única mulher bicampeã premiada como Melhor Investidora-Anjo no Startup Awards 2016 e 2018. Sócia-fundadora da G2 Capital, uma butique de investimentos em empresas de tecnologia, as startups.
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