Pensando em questões relativas à como organizações precisam se organizar para responder às demandas amplificadas de transformação digital e mudanças de modelos de negócio, tenho retornado com frequência ao tema da simplicidade e procurado me distanciar das noções tradicionais de perfeição.
À medida em que as necessidades da sociedade em geral ficam mais sofisticadas com o avanço digital, observo que há um afã por parte das organizações de tornar a resposta a estes temas cada vez mais complexa. Apresentam-se decks de uma centena de slides que analisam mercados prontos para receber a disrupção de tecnologias emergentes, com gráficos incríveis detalhando a estratégia para aproveitar o tal filão.
LEIA TAMBÉM: Como a curiosidade contribui para o sucesso de uma equipe
Apesar de terem se tornado cada vez mais frequentes, estas apresentações mágicas não são algo novo. Em tantas reuniões ao longo da minha carreira, fui tomado por um sentimento ambivalente: ao mesmo tempo em que era óbvio que não faltava conhecimento ou paixão pelo trabalho em questão, eu notava a ausência de um ingrediente essencial. Faltava o foco na execução, em detrimento da busca pela estratégia perfeita. Era como ter um grande avião, sem uma pista para pousar, quando se precisava da leveza de um parapente. Esse é um dos maiores riscos que uma empresa pode correr: a estratégia é inútil sem execução.
A busca pela perfeição sem uma visão de como planos se tornarão realidade faz com que ideias caduquem, com lindos slides cheios de conceitos sem aderência, tornando-se apenas material de consulta futuro. Pior ainda, esta atitude abre espaço para a ultrapassagem da competição, e escancara a falta de uma percepção atualizada dos negócios na era digital. No setor de tecnologia, por exemplo, a briga no passado era entre as grandes empresas do ramo, que se comportavam da mesma forma e tinham longos e burocráticos ciclos de desenvolvimento de produtos, além de todas as benesses de uma certa previsibilidade em relação à concorrência. Esse cenário já foi superado há um bom tempo.
Em 2021, startups de sucesso estão colhendo os frutos da subversão desta lógica do passado. Estas são as formigas que surgem de repente, e devoram o piquenique das organizações incumbentes. Um dos grandes motivos para isso é a agilidade na execução: por operarem em um contexto de escassez, o foco dos fundadores é trabalhar para obter resultados o mais rápido possível. Para atingir estas metas, empreendedores raramente traçam estratégias floreadas, e preferem executar ideias simples. A frase do meu amigo Bob Messier resume bem a mentalidade das empresas vencedoras: “It’s all about progression, not perfection”, que, em uma tradução livre que não soa tão bem quanto o original, quer dizer: o que interessa é o avanço, e não a perfeição.
Outra característica positiva dessa ênfase em ação que proponho aqui é a criação do espaço para erros. Combinada a conceitos como a autonomia de times, a execução de ideias simples torna a experimentação e inovação possíveis em uma organização, que passa a ter uma maior tolerância a erros com responsabilidade. A simplicidade também traz mais pragmatismo, já que planos extremamente complexos têm maiores chances de fracasso.
Para quem sofre com grandes planos sem foco em execução, sugiro que a atenção se volte para o desenvolvimento de uma rota simples, com resultados que podem ser obtidos de forma relativamente fácil. Depois de executar, comunique os resultados: na maioria das vezes, uma apresentação extensa pode ser resumida em três slides: o plano, os resultados e os próximos passos. No final do dia, a estratégia é sobre o que se coloca em prática. Ao promover a ação de forma descomplicada, líderes abrem espaço para a construção de expertise e ideias que evoluem com o tempo, e trazem a vantagem competitiva e flexibilidade necessária para navegar por cenários de incerteza e mudança. É justamente neste campo que nossos parapentes precisam pousar.
Marvio Portela é vice-presidente sênior para Estados Unidos, América Latina e Caribe do SAS. O executivo passou por grandes empresas como Oracle e IBM, trazendo uma vasta experiência na área de vendas e gestão de parcerias. Sua carreira no SAS teve início em 2010.
Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dos autores e não refletem, necessariamente, a opinião de Forbes Brasil e de seus editores.