A importância do ambiente para o desenvolvimento de um talento esportivo está cientificamente comprovada. Eu, por exemplo, poderia ter sido o melhor jogador de hóquei no gelo do mundo, mas nasci e cresci no Brasil onde não é comum termos temperaturas baixas e tampouco termos acesso aos tais esportes “de inverno”. Desta forma, não me tornei aquele que supostamente poderia ser.
Brincadeiras à parte, inicio esse texto, que visa tratar do papel do trabalho em equipe na ascensão de um atleta de destaque, com esta analogia que demonstra que um atleta precisa estar inserido em um ambiente estruturado e desafiador para que possa assim desenvolver suas capacidades.
As chamadas forças de apoio ou primeiro núcleo compõem a parte central e essencial deste ambiente desenvolvedor. Este núcleo é formado pelas pessoas que possuem, comumente, um maior convívio diário com o atleta e/ou que exercem maior influência sobre ele, sendo normalmente constituído por familiares (pai, mãe, irmãos, primos, entre outros) e pela equipe profissional (treinador, preparador físico, fisioterapeuta, entre outros), que será o foco principal deste artigo já que eu, Rafael Paciaroni, sou o atual treinador da tenista Beatriz Haddad Maia, mais conhecida como Bia Haddad.
Conforme citado acima, definir e escolher a equipe de trabalho se torna parte essencial do processo pois, embora no tênis o protagonismo das ações pertença ao jogador, a equipe é fundamental e determinante na facilitação e otimização dos processos de aprendizagem. A escolha desta equipe começa com a figura do treinador, que dentro da equipe interdisciplinar, tem comumente o papel de líder do processo. No meu caso, preciso ter uma comunicação clara e precisa com o Rodrigo Urso (preparador físico), Paulo Roberto Cerutti (fisioterapeuta) e demais profissionais envolvidos, motivando-os e extraindo suas melhores versões profissionais diariamente. Para tanto, necessito ter disposição e energia para estar sempre presente a solucionar os desafios que surgem a toda hora na vida de um atleta de alta performance como a Bia. Desta forma, ao papel do líder não basta somente saber o que dizer, mas sim quando dizer e como dizer. Uma analogia que poderia encerrar este parágrafo trazendo mais lucidez às palavras é a da Fórmula 1, na qual a mente da Bia representa o piloto do carro; o corpo dela é o carro; treinador, preparador físico, fisioterapeuta e demais da equipe interdisciplinar somos os mecânicos/ engenheiros do carro dela; nós ajudamos a elaborar a estratégia de corrida, limpamos o visor do capacete da Bia, trocamos os pneus do carro dela, cuidamos de toda parte mecânica, elétrica, entre outras coisas que visam dar toda tranquilidade e segurança ao carro (corpo) e ao piloto (mente) para que ela, Bia, possa performar ao máximo com consistência.
Ademais, para que o atleta possa estar equilibrado, distante da euforia (um extremo) e da acomodação (outro extremo) que trazem a perda do foco no presente, se faz necessário ter objetivos claros e definidos, não apenas em relação ao ranking, mas sobretudo os inerentes aos processos diários tais como, as metas: técnica, tática, física, nutricional, psicológica e cultural. Como exemplo no caso da Bia, traçamos as metas gerais/anuais antes da pré-temporada (normalmente em dezembro) onde estabelecemos as metas principais de cada área citada acima, assim como antes de começarmos cada gira de torneios traçamos pequenos objetivos que ao serem alcançados, automaticamente, geram uma nova reunião para elaboração de novas metas corroborando para o alcance ou superação da meta anual.
Não só a elaboração de metas e objetivos nos guia na elaboração de um planejamento interdisciplinar que visa controlar as cargas de trabalho, assim como a estruturar as rotinas diárias pré e pós-treino. No nosso trabalho junto à Bia utilizamos ferramentas que nos ajudam a controlar desde níveis de desconforto físico, qualidade do sono até oscilação de humor, estresse. Todas essas informações nos ajudam a ter diariamente uma intervenção mais precisa que corrobora para a atleta estar um longo período longe das lesões e podendo desenvolver o seu jogo ao máximo.
Por fim, o investimento financeiro é parte determinante na viabilização de toda essa estrutura profissional, desde a compra de uma passagem aérea que te faça chegar o mais rápido possível no seu destino, até a possibilidade de viajar sempre acompanhada não só do treinador, mas também do preparador físico ou fisioterapeuta. Por isso, o incentivo econômico dado diretamente ao jogador, como também a projetos como o Rede Tênis Brasil (RTB), que visa fomentar a prática do tênis, formar cidadãos e, consequentemente, cidadãos tenistas, assim como desenvolver atletas de alto nível, como no caso da Bia, se torna imprescindível para o crescimento virtuoso deste ambiente/sistema.
Foi com seu primeiro núcleo bem definido, apoio familiar incondicional, um ambiente saudável e estruturado profissionalmente, que a Bia Haddad alcançou recentemente a marca de 25ª melhor jogadora do mundo (WTA) e pretende seguir dando passos adiante na carreira.
Rafael Paciaroni é o atual treinador da tenista Beatriz Haddad Maia. Foi treinador formador de atletas de destaque internacional, como Matheus Pucinelli de Almeida. É autor do livro: “Tênis: novos caminhos para uma abordagem profissional”. Vencedor do prêmio mérito acadêmico durante sua formação universitária, publicou artigos científicos e apresentou trabalhos em congressos internacionais a respeito da temática “formação e ambiente de desenvolvimento de tenistas de alto rendimento”.
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