À medida em que notícias de marcas que optaram por trocar o estúdio e fotógrafos por inteligência artificial generativa surgem, observadores de empresas de conteúdo visual podem concluir que o setor está com os dias contados. Uma mudança notável no jogo para estas empresas foi o aumento na adoção de ferramentas de IA generativa, como o MidJourney, capazes de produzir imagens a partir de instruções, em poucos segundos. O resultado pode ser ultrarrealista e quase indistinguível de fotografias tradicionais, o que traz desafios para empresas cujo negócio é vender este tipo de material.
Mas, para a Getty Images, dona de um dos maiores bancos de conteúdo visual – incluindo fotos, vídeos e música – do mundo, o segmento atravessa mais uma onda de transformação. “Embora haja sempre uma mistura de entusiasmo e nervosismo quando novas tecnologias entram em ação, a história mostra que, na verdade, cada salto tecnológico aumenta o valor da experiência, da criatividade e dos talentos artísticos genuínos”, diz Grant Farhall, chief product officer da Getty Images, em entrevista exclusiva à esta coluna.
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Fundada há quase 30 anos, a Getty agora abraça a IA generativa para responder às mudanças do mercado e propõe o uso da tecnologia como forma de expandir horizontes criativos. A empresa usou seu próprio conteúdo para criar um modelo de IA generativa, com foco em “criativos”. A ferramenta promete encontrar o conteúdo visual certo para uma peça e gerar conceitos complexos para sessões de fotos.
Por aqui, a companhia encontra um terreno fértil para emplacar seus avanços, graças à abertura dos brasileiros para o uso de novas ferramentas. A Getty fez uma pesquisa global que revela que a América Latina é uma das regiões com maior entusiasmo e interesse pela IA globalmente. Com uma amostragem de 7 mil adultos em 25 países, o estudo VisualGPS descobriu que os brasileiros mostraram um interesse 15% maior por IA quando comparados com o restante do mundo. Além disso, nove em cada 10 pessoas na região acreditam que a IA pode ajudar a tornar suas vidas mais eficientes.
Além de discutir as mudanças no segmento de conteúdo visual, a Rumo Futuro falou com Farhall sobre a visão de futuro da Getty para o setor. Confira os melhores momentos da conversa a seguir:
Rumo Futuro: Considerando a aceleração global na adoção de IA, como estes avanços devem impactar o setor de conteúdo visual?
Grant Farhall: A indústria fotográfica testemunhou avanços tecnológicos significativos ao longo de sua história. Observamos a evolução da fotografia passando do analógico para o digital e os smartphones democratizando a arte mais do que nunca. Muitos acreditavam que os fotógrafos se tornariam obsoletos porque todos tinham as ferramentas para tirar fotos. No entanto, o que descobrimos é que a essência de uma grande fotografia vai muito além do dispositivo. Criar uma imagem realmente incrível requer uma quantidade incrível de habilidade, conhecimento e experiência. Em última análise, há uma diferença distinta entre você e eu tirando fotos com nossos celulares e fotógrafos profissionais capturando o mundo ao nosso redor.
Embora haja sempre uma mistura de entusiasmo e nervosismo quando novas tecnologias entram em ação, a história mostra que cada salto tecnológico aumenta, na verdade, o valor da experiência, da criatividade e dos talentos artísticos genuínos
RF: Estamos diante de um número crescente de marcas brasileiras (e globais) recorrendo à IA para substituir completamente a necessidade de usar fotografia tradicional de estúdio, por exemplo. Como a Getty Images está abordando esse problema e como foi o processo que levou ao posicionamento atual de vocês sobre o assunto?
GF: Escutamos os clientes sobre o rápido crescimento da IA generativa – e percebemos tanto entusiasmo, quanto hesitação – e tentamos ser intencionais em relação ao modo como desenvolvemos nossa própria ferramenta. Criamos um serviço que permite que marcas e profissionais de marketing adotem a IA com segurança e ampliem suas possibilidades criativas, ao mesmo tempo que compensamos criadores pela inclusão de seus recursos visuais nos conjuntos de treinamento da plataforma.
Historicamente, abraçamos a inovação e encontramos maneiras de capacitar nossos clientes por meio de novas tecnologias. Apoiamos o avanço da IA generativa que respeita os direitos de propriedade intelectual, concebida para proteger criadores e sustentar a criação contínua.
RF: De que forma a plataforma de IA generativa de vocês pode influenciar a forma como as empresas utilizam a inteligência artificial no espaço de imagens digitais?
GF: Trabalhamos muito para desenvolver uma ferramenta responsável que dê aos clientes confiança nos recursos visuais produzidos por IA generativa para fins comerciais. Como fornecedor editorial, é nosso papel capturar eventos reais como eles são, e não os manipular ou recriá-los para contar uma história diferente. A última coisa que queríamos fazer era produzir uma ferramenta que realmente pudesse produzir deepfakes. É por isso que sabíamos que construir uma ferramenta de IA generativa comercialmente viável é de suma importância.
Acreditamos firmemente que, ao oferecer uma solução de IA generativa comercialmente segura, podemos fortalecer ainda mais a confiança que os nossos clientes depositam em nós, permitindo-lhes adotar a IA nos seus negócios, sem riscos.
RF: À medida em que a IA continua a ganhar destaque, como as marcas podem garantir a utilização ética desta tecnologia, no que diz respeito a conteúdo visual?
GF: Acreditamos que a IA generativa é uma ferramenta interessante que deve ser baseada em dados autorizados, recursos visuais e privacidade individual. Apoiamos o avanço da tecnologia de IA generativa criada de forma responsável e que respeita os direitos de propriedade intelectual estabelecidos há muito tempo, concebida para proteger criadores e sustentar a criação contínua, através da obtenção do consentimento dos titulares dos direitos para formação.
As ferramentas e serviços de IA generativa devem ser transparentes quanto aos dados utilizados para formação, bem como aos resultados que foram criados através da IA generativa e os fornecedores de modelos partilham a responsabilidade de abordar a desinformação, o preconceito e a utilização indevida. Trabalhamos com vários inovadores nas áreas de inteligência artificial e aprendizado de máquina para apoiar o desenvolvimento de modelos e conteúdos generativos criados de forma responsável.
RF: Como a evolução da IA em imagens deve alterar a forma como as marcas e consumidores interagem com conteúdo visual nos próximos cinco a 10 anos?
GF: A IA está causando mudanças tão profundas como a Revolução Industrial, mas essas mudanças estão acontecendo mais rapidamente – ao longo de semanas e meses, em vez de décadas.
No curto prazo, ofereceremos aos criativos uma nova ferramenta que os ajudará a realizar seu trabalho com mais rapidez e melhor conteúdo. Ninguém sabe o que o futuro da IA reserva, mas estamos entusiasmados com as possibilidades para os criativos. É por isso que trabalhamos duro para estar na vanguarda da conversa e garantir que esses modelos sejam comercialmente seguros e feitos de uma forma que compense os criadores.
Quanto aos próximos anos, a nossa pesquisa de mercado VisualGPS diz que a IA gera nervosismo e entusiasmo nas pessoas em todo o mundo. No entanto, o que vale hoje para os consumidores globais é a expectativa de transparência por parte das marcas quando se trata de imagens de IA: nove em cada 10 pessoas que consultamos querem saber se uma imagem foi alterada, e esperam que as imagens de IA sejam identificadas como tal.