Bill Gates quer que você saiba dois números: 51 bilhões e zero. O primeiro é o número de toneladas de gases de efeito estufa normalmente adicionados à atmosfera a cada ano como resultado das atividades humanas. Já o zero é o número de toneladas que precisamos atingir até 2050 para evitar uma crise climática.
Gates tem um plano de como ir de 51 bilhões a zero, e fica feliz em dizer que isso não custa trilhões de dólares. O que podemos esperar de um empresário que fez sua fortuna com tecnologia é que a solução sugerida esteja ligada em grande parte à inovação.
Ele explica seu plano em um novo livro, “Como Evitar um Desastre Climático: as Soluções que Temos e os Avanços que Precisamos” (ed. Companhia das Letras), que será lançado amanhã (16) nos EUA e no dia 19 no Brasil, de acordo com o site da Amazon. Antes do lançamento, Gates conversou com a Forbes sobre os motivos que o fizeram produzir a obra.
A meta número um do livro, diz Gates, é definir claramente quais setores da economia estão produzindo os 51 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa que o mundo normalmente adiciona à atmosfera a cada ano.
Esta não é sua primeira receita pública para o clima. Em 2010, ele deu uma palestra no TED Talk clamando pela necessidade de eliminar as emissões de carbono até 2050. Já em 2015, se envolveu na Cúpula do Clima de Paris, ligando para o então presidente da França, François Hollande, e o encorajando a fazer com que os países concordassem em aumentar seus orçamentos de P&D para inovação em tecnologia limpa. Vinte países assinaram.
Para ajudar a definir uma estrutura em torno do progresso e do custo de novas inovações livres de carbono, Gates e sua equipe criaram um termo chamado Green Premium (ou Prêmio Verde, em português). Ele explica que o Green Premium demonstra a diferença de custo entre um produto ou processo que não emite carbono com outro que o faz. Os prêmios impactaram o setor de automóveis a ponto de aumentar as vendas de carros elétricos (embora Gates indique que apenas 2% das vendas globais de automóveis são veículos elétricos). No setor industrial, entretanto, os Prêmios Verdes são muito maiores. “Os problemas mais difíceis de resolver estão em áreas como aço e concreto e até mesmo em transporte, como combustível de aviação”, diz Gates. Os problemas aos quais ele se refere: criar processos para fazer esses produtos que não emitem gases de efeito estufa. A pesquisa está em seus estágios iniciais e é aí que a P&D do governo pode desempenhar um papel, sugere Gates.
Quanto isso vai custar?
Em dezembro, Gates sugeriu que os EUA criassem um Instituto Nacional de Inovação em Energia (National Institutes of Energy Innovation, em inglês) para ajudar o país a assumir a liderança na inovação em mudanças climáticas. A ideia é se inspirar no National Institutes of Health, a espinha dorsal da pesquisa médica dos EUA, que tem um orçamento anual de cerca de US$ 37 bilhões. Gates afirma que os atuais gastos do governo dos EUA com P&D em inovação energética são de cerca de US$ 7 bilhões anuais.
Outra sugestão de Gates é transferir os créditos fiscais da energia solar e eólica para áreas mais emergentes. “Se você fizer isso e talvez dobrar ou triplicar o valor que gasta com esses benefícios fiscais, acho que será uma contribuição monumental do governo Biden”, explica ele.
Qualquer inovação tecnológica proveniente dos Estados Unidos ou de outro lugar deve ser acessível o suficiente para que países como a Índia a adotem, ressalta Gates. No momento, os EUA são responsáveis por 14% das emissões mundiais. Se apenas os EUA chegarem a zero emissões de carbono, não resolveremos o problema globalmente.
Onde Gates está investindo
Gates diz no livro que colocou “mais de US$ 1 bilhão” em empresas que buscam emissões zero. Ao todo, ele diz à Forbes que são cerca de US$ 2 bilhões. O bilionário se descreve como talvez o maior financiador de tecnologias de captura de carbono do ar. Duas das empresas mais conhecidas em que ele investiu estão produzindo carnes vegetais: Impossible Foods e Beyond Meat. Ele classifica alguns de seus investimentos como filantrópicos, como o dinheiro que investiu em um modelo climático de código aberto que visa mostrar como a geração de eletricidade funcionará em longos períodos de clima adverso, quando a energia eólica e solar fossem fechadas.
Sua maior aposta tem sido na TerraPower, uma empresa de energia nuclear com um reator que usa urânio empobrecido como combustível. Gates fundou a empresa com alguns outros sócios há mais de uma década. Em 2017, a TerraPower formou uma joint venture com uma empresa chinesa e planejava produzir seu primeiro reator na China. Esse acordo foi negado pelo governo dos EUA, que no final de 2019 bloqueou a cooperação dos EUA com a China em energia nuclear civil. Agora, o plano é construir uma planta de demonstração em algum lugar dos EUA.
Sua esperança é que a planta de demonstração seja construída dentro de cinco a sete anos.
Gates também investiu em empresas de carbono zero por meio do Breakthrough Energy Ventures, um grupo que ele montou e lançou em dezembro de 2016. “Foi muito mais fácil arrecadar dinheiro do que eu esperava”, diz ele. “Fiz cerca de 22 ligações e recebi cerca de 20 ‘sim’ para o primeiro bilhão.” Os investidores incluem bilionários como Jeff Bezos, Vinod Khosla, John Arnold e John Doerr. Até agora, a investidora aportou 40 empresas; uma delas, a QuantumScape, que está desenvolvendo baterias de metal de lítio para veículos elétricos e ainda não tem receitas, se tornou pública por meio de um Spac em novembro passado. Embora muitas das empresas ainda estejam em um estágio inicial, Gates descreve algumas como “realmente selvagens”, incluindo a QuidNet, que está trabalhando para armazenar eletricidade bombeando água para poços subterrâneos sob pressão; quando a energia é necessária, a água é liberada e passa por uma turbina, gerando eletricidade.
O Breakthrough Energy Ventures levantou outro fundo de US$ 1 bilhão em janeiro, com a maioria dos mesmos investidores iniciais e alguns recém-chegados. (Gates não revelou os nomes.) Ele diz que também é o maior investidor do fundo mais recente. O novo fundo buscará investir em mais processos industriais, como cimento de baixo carbono e produção de aço, bem como em tecnologias para capturar o carbono do ar, diz Gates.
Um dos outros investimentos de Gates que tem ido na contra seu foco em carbono zero. No início de fevereiro, o braço de investimento de Gates, Cascade, fez parceria com o Blackstone Group e a empresa de private equity Global Infrastructure Partners em um acordo de US$ 4,7 bilhões para comprar a Signature Aviation, a maior operadora mundial de bases de jatos particulares. As viagens em jatos particulares cresceram rapidamente durante a pandemia, mas essas viagens emitem uma grande quantidade de gases do efeito estufa. Como ele concilia o acordo com a premissa de seu livro? Um porta-voz de Gates não respondeu à pergunta.
Não se sabe se o livro vai realmente influenciar os criadores de políticas e impulsionar a criação de novas tecnologias, mas, se nada der certo, Gates quer que as pessoas se engajem no tema. “Minha esperança é que possamos mudar a narrativa compartilhando os fatos com amigos, família e líderes. E não apenas os fatos que mostram que precisamos agir, mas também os que mostram quais ações são as melhores”, ele escreve.
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