O último e terceiro aumento na taxa Selic para 4,25% ao ano não foi necessariamente uma novidade para o mercado, mas a retirada do termo “normalização parcial” pelo Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central mostra que a autoridade deve apertar ainda mais o cerco contra a inflação, que acumula em 12 meses uma alta de 8,06%, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) do mês de maio.
Mas entender o impacto das variações na taxa básica de juros da economia na inflação e nos investimentos ainda é um desafio para muitos brasileiros. O Forbes Money conversou com especialistas para entender – e explicar – a relação entre a condução da política monetária e o nosso dia a dia.
Em primeiro lugar, para compreender melhor a Selic, é preciso entender sua estreita relação com o controle da inflação e estímulo ao crescimento econômico. “A grande questão da Selic é a inflação, segurar inflação, esse é o grande objetivo”, explica o professor Eduardo Mira, analista CNPI e especialista em renda variável da Me Poupe!. Segundo ele, aumentos na taxa diminuem o dinheiro em circulação na economia, já que os juros de empréstimos ficam mais caros, fazendo com que as pessoas reduzam seu consumo. “Tirando o dinheiro de circulação, ele [o governo] vai reduzir o consumo, uma vez que isso acontece e as pessoas param de consumir, a inflação cai porque as lojas, o comércio, todo mundo tende a fazer promoções tentar vender mais barato para gerar dinheiro, e isso segura a inflação”, explica Mira.
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As mudanças na taxa Selic, como realizado nesta semana, no entanto, podem levar meses até serem sentidas pela população. Mira explica que “aumentar a Selic agora significa convergir ou segurar a inflação para o ano que vem, então, quando a inflação dá uma acelerada, o governo pode aumentar a taxa mais do que se gostaria”.
Da mesma forma, quando deseja ampliar o fluxo de dinheiro na economia e impulsionar o crescimento do país, o Banco Central pode diminuir a taxa Selic, tornando o crédito mais barato e favorecendo o consumo.
Para compreender essa lógica e acompanhar as tendências para a economia é preciso se manter constantemente atento às expectativas do Banco Central. Toda semana, o BC divulga o Boletim Focus, um relatório com as expectativas da instituição para o câmbio, Selic, inflação e PIB. Nele, é possível avaliar a perspectiva da inflação, do dólar, da Selic, do IPCA, dentre outros indicadores econômicos.
“Atualmente, a gente vê nos indicadores do Focus aumentos significativos da Selic neste ano para provocar essa redução da inflação. Ele mostra claro que o Copom vai aumentar bastante a Selic para reduzir a inflação”, avalia Mira.
Renda Fixa
A Selic impacta diretamente alguns investimentos de renda fixa, como os produtos pós-fixados atrelados ao CDI. O professor explica que a taxa Selic over é igual ao CDI: “a origem deles é igual, e as taxas são praticamente as mesmas”. Entre os investimentos mais comuns que rendem um percentual do CDI estão o CDB (Certificado de Depósito Bancário), o LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e o LCA (Letra de Crédito do Agronegócio), mas há outros produtos de renda fixa vinculados ao indexador.
Já produtos atrelados ao IPCA (também considerados pós-fixados) e os prefixados não são automaticamente afetados pelas variações na taxa Selic, embora possam também repercutir os seus efeitos em longo prazo.
“Quem não vai mudar é aquele que é prefixado, por exemplo, eu tenho um CDB que paga 8% ao ano, independente se a Selic está dois, três, cinco ou dez, ele vai continuar pagando 8% ao ano. Não muda, porque a taxa foi definida na hora da contratação. Na hora que você escolheu investimento, o banco falou que a taxa é 8% e até o vencimento, vai ser 8% todos os anos”, explica Mira.
Camilla Dolle, analista de renda fixa da XP Investimentos, explica que “nesse momento, de tendência de alta da nossa taxa básica de juros, os ativos pós-fixados voltam a ficar mais interessantes do que estavam, por exemplo, no ano passado. Assim, a renda fixa como um todo, acaba tendo mais interesse do público”.
Os investimentos prefixados, por sua vez, são baseados e validados pelas expectativas do mercado por juros e inflação em longo prazo, “se a gente tem uma mudança nessas expectativas, esses investimentos prefixados podem vir a ter uma rentabilidade maior ou menor”, explica a analista.
Ganho real líquido
Para calcular o rendimento dos investimentos, seja em renda fixa ou renda variável, o professor Mira ressalta que não basta a Selic (ou rentabilidade bruta do ativo) ser maior que a inflação, porque ainda é necessário descontar o Imposto de Renda. Por isso, é preciso calcular o ganho real líquido, já que os investimentos e renda fixa, em sua maioria, pagam tributos.
“Isso é importante porque, se a gente pensar em uma Selic de 6,25%, com uma inflação de 5,82%, que é a projeção para o final do ano, mesmo assim as pessoas estão perdendo dinheiro”, explica Mira.
Renda Variável
Os reflexos da Selic na renda variável, por outro lado, são menos evidentes, já que a definição do preço das ações é impactada por diferentes fatores. Apesar disso, Camilla conta que muitas empresas possuem dívidas pós-fixadas, que acompanham a Selic, por isso, “quando temos uma alta de juros, essa dívida acaba ficando mais cara para as empresas e pode impactar o em seu valuation”.
O professor Mira explica que o preço das ações considera todo o cenário macroeconômico, “a crise hídrica já tá no preço, a pandemia, a velocidade da vacinação, tudo isso o mercado já espera, não tem nada novo, a não ser que aconteça alguma coisa muito diferente”.
Mira ainda comenta sobre os FIIs (Fundos de Investimento Imobiliário), que podem ter um movimento diretamente impactado pela Selic através das variações CDI. Os FIIs de papel, por exemplo, investem em CRIs (Certificados de Recebíveis Imobiliários), e alguns deles têm uma carteira mais voltada ao CDI, “esses títulos vão passar a pagar mais, então eles tendem a ter um resultado pouco melhor”, conta.
“É importante entender que a Selic tem um resultado direto sobre os investimentos de renda fixa pós-fixados, sobre os fundos imobiliários atrelados ao CDI, os outros investimentos de renda fixa e variável, que já trazem consigo as variações e expectativas do mercado”, afirma Mira.
“Não necessariamente, no momento de alta da Selic, as pessoas vão sair da renda variável para vir para renda fixa”, comenta Camilla, diante da perspectiva de um crescimento da taxa de 6,25% até o fim do ano.
Para a especialista da XP, o contexto “mostra a importância dos investidores se atentar às questões econômicas, de agenda política, porque essas movimentações de juros, de indicações das autoridades monetárias, tudo isso vai ter algum efeito sobre os nossos investimentos”, avalia Camilla.
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