Quando a Tesla anunciou em fevereiro que aceitaria o bitcoin como meio de pagamento por seus veículos elétricos, o mundo das criptomoedas entrou em festa. Aqui estava uma empresa de capital aberto, liderada por uma máquina de publicidade bilionária, endossando seu status como meio de troca. A reputação do ativo como reserva de valor, por sua vez, foi aprimorada nos mercados à medida que a cripto alcançava novas máximas, acima de US$ 44 mil.
Avance alguns meses e o quadro é muito diferente. A Tesla não apenas reverteu sua decisão de aceitar pagamentos com bitcoins, mas também citou preocupações sobre seu uso insustentável de energia, levando a uma queda de 30% em seu valor em apenas um dia, movimento que reforçou sua volatilidade inerente e alimentou opiniões daqueles que a consideram inviável.
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Apesar da queda no mercado, há muitas evidências que indicam que as criptomoedas e as plataformas baseadas em blockchain devem desempenhar um papel fundamental no futuro dos pagamentos digitais.
No ano passado foi possível observar o surgimento de grandes instituições olhando para os criptoativos: a adição de ativos digitais do PayPal, o aumento do uso de stablecoins – incluindo a adoção do USDC pela Visa, além de inúmeras novas oportunidades de empréstimos via criptos.
Isso tudo antes de passarmos ao tópico dos CBDCs (Moedas Digitais do Banco Central), que estão sendo ativamente desenvolvidas e testadas na China, consideradas nos EUA, Reino Unido, Brasil e em mais de 30 países.
Bancos apagam incêndios
O setor bancário mantém uma grande influência no espaço de pagamentos. No entanto, os antigos gigantes financeiros se veem encurralados por soluções de pagamentos eletrônicos com rápido crescimento, bem como protocolos, exchanges e aplicativos criptonativos. Efetuar pagamentos somente por meio de conta em banco está começando a parecer tão anacrônico quanto fazer chamadas de longa distância por um telefone fixo.
“O dinheiro está entrando em uma guerra de formatos”, avalia Ronit Ghose, do Citi, em seu último relatório “Future of Money”. Contexto que cria desafios em várias frentes para os banqueiros. Assim como as operadoras de telefonia fixa foram desafiadas com os celulares, os bancos estão sob ataque de empresas inovadoras.
No início deste mês, a gigante de pagamentos canadense Nuvei Corporation concordou em adquirir a fintech Simplex em um negócio de US$ 250 milhões. O Simplex oferece uma alternativa fiduciária para as principais plataformas de criptomoedas e representa um pilar essencial da “criptoesfera” ao permitir que os usuários negociem com ativos digitais por meio de cartões de crédito e débito. É também um dos membros principais da rede Visa e está a caminho de processar mais de US$ 2 bilhões neste ano.
A oportunidade de otimizar os processos de pagamentos de clientes integrando o Simplex em pontos de vendas seria uma grande vantagem para os criptoativos como meio de troca. A Nuvei possui capital aberto e é o maior processador de pagamentos não bancários do Canadá, conectado a 200 mercados em todo o mundo.
As empresas de serviços financeiros criptonativos também estão emitindo grandes cheques. O banco de investimentos Galaxy Digital concordou em comprar a firma de custódia BitGo por US$ 1,2 bilhão em ações e dinheiro. O CEO da Galaxy, Michael Novogratz, disse que a aquisição estabeleceria a Galaxy como um balcão único para as instituições e avançaria sua missão de institucionalizar ecossistemas de ativos digitais e tecnologia blockchain.
O BitGo atende mais de 150 exchanges e possui ao menos 400 clientes institucionais, além de processar 30 bilhões em transações mensais. A aquisição pela Galaxy torna o BitGo uma das maiores empresas de serviços financeiros de criptomoedas. A Paxos, um provedor de custódia e infraestrutura digital, agora alcançou o status de unicórnio após uma rodada de financiamento de US$ 300 milhões concluída em abril. A empresa planeja lançar seu próprio National Trust Bank e solicitar um registro de Agência de Compensação na Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês).
Por que o PayPal está apostando tudo nas criptomoedas
Embora muitas pessoas provavelmente não tenham ouvido falar da Galaxy Digital ou da Paxos, o PayPal é um nome conhecido e cuja inovação no âmbito de criptomoedas parece irreversível, ao contrário do movimento da Tesla. A empresa não só permitiu que os usuários comprassem, vendessem e guardassem criptomoedas, tornando-a uma fonte de financiamento para 26 milhões de comerciantes, como pagou US$ 200 milhões pelo rival do BitGo, o Curv, cujos clientes incluem eToro e BNP Paribas.
O CTO do PayPal, Sri Shivananda, acredita que a mudança tecnológica para o blockchain e criptomoedas pode ajudar a democratizar e trazer maior inclusão financeira. Para o consumidor, o PayPal representa um serviço já conhecido e confiável, que pode atuar como uma porta de entrada para o mundo dos ativos digitais.
O mesmo pode ser dito sobre o Skrill, serviço de transferência de recursos que recentemente expandiu sua oferta de criptomoedas para os EUA graças a uma parceria com a Coinbase. No ano passado, a empresa anteriormente conhecida como Moneybookers, que tem 40 milhões de usuários ativos em mais de 200 países, lançou seu próprio cartão pré-pago, bem como uma solução de remessa e programa de fidelidade. Como o PayPal, a companhia está ajudando na adoção das criptomoedas.
O crescimento Defi e do Open Finance
Dezenas de bilhões de dólares inundaram o espaço DeFi (Finanças Descentralizadas) desde o início de 2020, embora o blockchain do ethereum tenha experimentado um congestionamento severo como resultado, aumentando as taxas de rede para muitos usuários regulares.
Soluções para ganho de escala, como o Celer Network, cresceram devido à sua capacidade de facilitar pagamentos rápidos e seguros fora da rede. De acordo com o Celer, bilhões de transações podem ser processadas por segundo em sua rede, provendo blocos suficientes e rodando aplicações off-chain. A solução de duas camadas visa superar as principais barreiras para a adoção do open finance: alto custo e complexidade de uso, tudo isso por meio de seu novo Layer2.finance, lançado recentemente no ethereum.
Enquanto muitas startups de pagamento com foco em blockchain buscam agilizar os processos do sistema tradicional e facilitar transações de uma maneira mais simples, barata, rápida e segura, outras estão elaborando soluções mais engenhosas e não pertencem apenas ao setor financeiro. A Community Gaming, uma startup sediada em Nova York que hospeda torneios de esportes virtuais e presenciais, é um bom exemplo disso.
A Community Gaming utiliza contratos inteligentes para automatizar pagamentos com transparência entre os jogadores, que também podem ganhar hospedando seus próprios eventos. Os pagamentos são feitos em criptomoedas ou via PayPal. Com a indústria de e-sports já avaliada em mais de US$ 1 bilhão e com previsão de crescimento rápido nos próximos anos, a Community Gaming e outras startups certamente ajudarão a impulsionar os criptoativos para a adoção convencional.
Se a pandemia acelerou a transição global para uma economia sem dinheiro, é justo dizer que essas rodas já estavam em movimento antes de 2020. A evolução das criptomoedas, carteiras digitais, fintechs, stablecoins, CBDCs, protocolos DeFi e outras plataformas de pagamento focadas em blockchain significa que o dinheiro não é o único sob ataque.
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