A população brasileira desfruta da reputação de estar entre as que mais abrem negócios no mundo. E, apesar de a pandemia ter impactado negativamente a economia e a qualidade de vida no país, ela também reforçou o desejo de muitas pessoas de empreender.
Segundo um estudo da Global Entrepreneurship Monitor (GEM) de 2020, ter o próprio negócio passou a ser, pela primeira vez na série histórica da pesquisa que começou em 2000, o segundo maior sonho do brasileiro, atrás apenas do desejo de viajar pelo país. “Hoje, a vontade de ter o próprio negócio está presente em 59% da população adulta, superando, por exemplo, o desejo de ter a casa própria, de comprar um automóvel e até mesmo de construir uma carreira como funcionário”, aponta Carlos Melles, presidente do Sebrae, entidade responsável pelo estudo no Brasil.
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Esse impulso teve reflexos na prática. De acordo com os dados divulgados em fevereiro pelo Ministério da Economia, o número de empresas abertas no ano passado superou o de empresas fechadas. No total, o país ganhou 3.359 milhões de novos negócios, enquanto 1.044 milhão foram encerrados, uma alta de 6% em relação a 2019.
Neste cenário, Melles destaca as atividades que mais atraíram os brasileiros entre 2020 e o primeiro trimestre de 2021, com base em um levantamento feito pelo próprio Sebrae. “Comércio varejista de vestuário e acessórios, cabeleireiro, manicure e pedicure, restaurantes e comércio de alimentos para consumo domiciliar, obras de alvenaria, transporte de cargas e serviços de documentação e apoio administrativo estão entre as atividades que mais cresceram no período”, diz o especialista.
Já Lyana Bittencourt, CEO da consultoria de negócios Grupo Bittencourt, afirma que os negócios digitais estão em alta, especialmente pelas políticas de lockdown que impactaram os hábitos de consumo. “Por causa da aceleração digital que as empresas foram obrigadas a promover para continuar operando mesmo de portas fechadas, novas oportunidades começaram a ser exploradas. Um bom exemplo são as dark stores, lojas que não estão destinadas ao atendimento do público de forma presencial, mas se dedicam às entregas e retiradas in loco. O atendimento e a venda ocorrem de forma digital e a loja funciona como um mini centro de distribuição”, explica.
Para a executiva, diversas atividades apresentaram bons resultados de vendas e ampliaram seu público graças ao marketing digital, que dinamizou as estratégias para a comercialização de produtos e serviços. “Essa tendência expandiu as oportunidades das empresas nas plataformas de live streaming e live commerce. Por meio delas, uma empresa faz uma live de divulgação de um produto e o cliente compra ali mesmo, direto da transmissão, sem sair do ambiente online. As empresas dos mais diversos setores, de bancos a pet shops, começaram a explorar essa oportunidade e tem sido sempre um sucesso”, destaca Lyana.
Em tempos difíceis, como o que vivemos atualmente, o crescimento no volume de novos negócios torna-se expressivo não apenas pela perspectiva das oportunidades, mas também pelo empreendedorismo se apresentar como uma tábua de salvação para aqueles que foram prejudicados pela crise sanitária. “Em cenários assim, o empreendedorismo surge como uma alternativa de renda, muito mais por necessidade. A maioria das pessoas que abrem um negócio nessas condições perdeu o emprego e não consegue voltar ao mercado de trabalho formal, o que as obriga a se virar para sobreviver”, afirma Edgard Barki, coordenador do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da FGV (FGVcenn), em São Paulo.
“Com as diversas crises que o país passou ao longo de sua história, não são poucos os exemplos de pessoas que iniciaram seus negócios ‘do nada’ e conquistaram um espaço no mercado. Somos movidos pela necessidade de sobrevivência e isso impacta diretamente no potencial empreendedor de um país”, diz Lyana.
Com cada vez mais pessoas em situação de vulnerabilidade financeira ingressando no mundo dos negócios, Carlos Melles alerta que abrir uma empresa às cegas ou sem uma preparação adequada dificilmente alcança êxito. “Qualquer pessoa que se torna empreendedora por necessidade, em razão do desemprego, por exemplo, pode enxergar uma oportunidade no negócio e ter um bom desempenho. Mas, para que isso dê certo, é fundamental buscar capacitação e executar as atividades de acordo com um bom planejamento. Em outras palavras, é preciso fazer do limão uma limonada”, diz o especialista.
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Por outro lado, Lyana Bittencourt aponta para condições de fragilidade muito comuns aos pequenos empreendedores. “O grande desafio desses homens e mulheres de negócios é romper a barreira dos cinco anos de operação. Quanto menor a empresa, maiores são as chances de fechar as portas nesse período. Isso porque, em muitos casos, o empreendedor de menor porte está menos preparado para lidar com as adversidades econômicas, como pouco ou nenhum capital de giro, dificuldades de gestão e falta de planejamento.”
Contudo, o coordenador da FGVcenn defende que, apesar da densa burocracia e elevada carga de impostos que pesa sobre as empresas do país, o acesso à tecnologia e informações proporciona condições mais seguras para se abrir e gerenciar um negócio. “Graças à internet e à presença de bons profissionais e mentores nesse ambiente, temos mais conhecimentos sobre empreendedorismo e gestão eficiente, feedbacks e suportes para se abrir um negócio com bom planejamento, entendimento do mercado e do público, além de maiores opções de linhas de crédito e financiamento”, afirma. “As ferramentas tecnológicas também melhoram a comunicação e a rapidez de uma série de atividades. Mas o que importa é quem vai acessá-las e de que maneira. O empreendedor de sucesso deve estar sempre bem informado do que acontece no seu setor, acreditar no seu trabalho e buscar inovar sempre”, completa.
Confira, na galeria de fotos abaixo, 7 dicas dos especialistas em empreendedorismo e gestão consultados pela Forbes para tirar seu negócio do papel em um ano:
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Klaus Vedfelt/Getty Images Aja
O principal ponto de partida para quem deseja empreender é ter em mente o tipo de negócio que quer conduzir e para qual setor trabalhar. Mas, para Edgard Barki, coordenador do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da FGV São Paulo, o primeiro passo para tirar uma ideia do papel é simples: “Agir”.
“Logo no início, o que o empreendedor precisa é fazer, partir para a ação. Elaborar o negócio e decidir investir nele após refletir e medir os prós e contras é fundamental. Mas o projeto deve ser colocado em prática rapidamente, sob risco do empreendedor perder o timing”, explica Barki. “Mesmo assim, essa iniciativa deve ser feita sem medo, sem ter vergonha do projeto, porque nenhuma empresa começa perfeita ou da maneira como imaginamos. Ela vai crescendo e evoluindo, principalmente para desenhar propostas diferentes do que a concorrência oferece. O empreendedor precisa buscar informações para entender o mercado e o setor no qual está inserido, conquistar seu espaço nele e aprender como se relacionar com seu público-alvo”, completa.
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Marko Geber/Getty Images Pesquise muito
Para que um negócio traga bons resultados logo no início, Carlos Melles, presidente do Sebrae, recomenda que o empreendedor saiba onde está se metendo. “Antes de colocar suas ideias em prática, o gestor precisa contar com as ferramentas certas. Para isso, ele deve pesquisar muito sobre o nicho de mercado no qual ele pretende investir, verificar a viabilidade de sua ideia, identificar-se com os outros negócios já existentes e descobrir do que o mercado precisa. Assim, ele pode estruturar seu novo negócio e até mesmo repensá-lo”, explica.
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andresr/Getty Images Tenha um bom plano de negócios
Segundo Lyana Bittencourt, CEO da consultoria de negócios Grupo Bittencourt, não há empreendedorismo sem risco, pois toda empresa, desde o início de suas operações até a sua consolidação no mercado, enfrenta imprevistos e possíveis ameaças ao seu funcionamento e rentabilidade. No entanto, a especialista afirma que os riscos podem ser minimizados e, possivelmente, controlados se o empreendedor elaborar um bom plano de negócio.
E, para que esse plano traga segurança ao projeto e uma perspectiva de onde se pode chegar, a consultora enumera as seguintes perguntas que todo empreendedor deve se fazer:” Quem será o cliente do seu produto ou serviço? Há mercado para o que você pretende oferecer? Quais são seus principais concorrentes e os diferenciais do negócio? Quais serão as fontes de receitas, despesas, precificação dos produtos e margens?”.
A especialista recomenda, ainda, uma série de outros questionamentos: “Quais são as suas metas de venda para que alcance o resultado desejado? Qual será o seu posicionamento no mercado e como vai conquistar novos clientes? Qual o investimento necessário para manter o negócio enquanto ele ainda não está faturando? Quais são as ações de marketing e de divulgação necessárias?”.
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Klaus Vedfelt/Getty Images Busque ajuda
Lyana Bittencourt também recomenda buscar uma rede de pessoas com diferentes pontos de vista e experiências, capazes de mostrar um panorama real do empreendimento e de dar sugestões para gestão e inovação nos produtos e serviços. E essa rede pode incluir tanto profissionais, quanto contatos pessoais.
“É sempre bom apresentar o projeto para pessoas que você acredita que possam contribuir na construção e desenvolvimento do conceito do negócio. Você pode começar buscando a opinião de familiares e amigos e, numa segunda etapa, buscar a opinião de potenciais clientes e até mesmo de investidores”, aconselha.
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Anúncio publicitário -
Klaus Vedfelt/Getty Images Pivote
Ao contar com o apoio de especialistas e colaboradores, o empreendedor tem ao seu alcance informações e recursos para trazer qualidade às suas ações, identificar os erros e acertos do seu negócio e desenvolver possíveis soluções. Por outro lado, Edgard Barki, da FGV São Paulo, defende que a partir dessa interação com parceiros e clientes, o empreendedor aproveite a oportunidade para “pivotar”.
Por definição, pivotar se refere ao ato de avaliar todas as possibilidades de mudança em um modelo de negócio quando o empreendedor percebe que as operações não trazem os resultados esperados. “Isso não significa desfazer o negócio, mas reconhecer que ele necessita de uma reinvenção para se manter relevante. E essa mudança pode partir da ideia inicial. Mas com orientações e opiniões de colaboradores e parceiros, o empreendedor pode descobrir coisas novas, encontrar diferenciais para seus produtos e serviços e tornar sua empresa mais atraente e competitiva”, afirma Barki.
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Klaus Vedfelt/Getty Images Seja ousado e mantenha a mente aberta
Edgard Barki afirma que para uma empresa alcançar o sucesso e diferencial no mercado, o empreendedor deve ter uma boa dose de ousadia. “Todo gestor precisa sair de sua zona de conforto para encontrar ideias, estilos e ações novas, que agregam valor ao negócio e, claro, atendam às necessidades e expectativas do público”, explica.
Contudo, o especialista alerta que a ousadia por si só não basta, pois o empreendedor precisa estar sempre aberto para possíveis transformações em seu negócio, de acordo com as circunstâncias. “A sociedade e as culturas estão em constante mudança, e isso impacta não apenas os hábitos de consumo, como também a relevância de uma empresa em determinado momento. Por isso, o gestor deve sempre interagir com o mercado, saber das novidades culturais, o que seus colegas de setor estão fazendo e aprender com eles. Além de estar disposto, a qualquer momento, a ouvir e aceitar feedbacks de outros profissionais ao seu redor”, pontua.
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Klaus Vedfelt/Getty Images Apaixone-se pelos problemas, não pelas soluções
Outra dica de Edgard Barki é que o empreendedor deve identificar nos problemas cotidianos da empresa e do mundo à sua volta oportunidades infinitas. Não apenas para expandir seu espaço no mercado, mas também para que seu negócio faça a diferença na vida das pessoas. “Ao estar atento às dificuldades que sua empresa enfrenta para se manter, o empreendedor também nota várias questões que afetam os cidadãos de sua cidade e bairro. Assim, ele pode encontrar soluções que beneficiem o negócio, tragam inovações aos produtos e serviços e, ao mesmo tempo, coloca em prática ações que contribuem para o bem-estar social.”
Barki também afirma que, apesar de bem-vindas em momentos de sufoco, as soluções não podem ser as principais motivações do empreendedor. “Cada negócio demanda uma resposta diferente, e elas mudam de acordo com o momento e as novas dificuldades. Se o gestor se agarrar a uma solução como tábua de salvação, dificilmente vai se dispor a melhorar o que já foi criado e sair de sua zona de conforto. Com os problemas, a empresa está propensa a transformações constantes.”
Aja
O principal ponto de partida para quem deseja empreender é ter em mente o tipo de negócio que quer conduzir e para qual setor trabalhar. Mas, para Edgard Barki, coordenador do Centro de Empreendedorismo e Novos Negócios da FGV São Paulo, o primeiro passo para tirar uma ideia do papel é simples: “Agir”.
“Logo no início, o que o empreendedor precisa é fazer, partir para a ação. Elaborar o negócio e decidir investir nele após refletir e medir os prós e contras é fundamental. Mas o projeto deve ser colocado em prática rapidamente, sob risco do empreendedor perder o timing”, explica Barki. “Mesmo assim, essa iniciativa deve ser feita sem medo, sem ter vergonha do projeto, porque nenhuma empresa começa perfeita ou da maneira como imaginamos. Ela vai crescendo e evoluindo, principalmente para desenhar propostas diferentes do que a concorrência oferece. O empreendedor precisa buscar informações para entender o mercado e o setor no qual está inserido, conquistar seu espaço nele e aprender como se relacionar com seu público-alvo”, completa.
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