O IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), o indicador oficial de inflação do país, alcançou, em agosto, alta de 9,68% no acumulado dos 12 meses. Mas o resultado prévio dele, o IPCA-15, que registra a variação de preços na primeira quinzena de cada mês, já ultrapassou os 10%, chegando a 10,05%, se também considerado os 12 meses findos em 14 de setembro.
Outra medida sobre o comportamento de preços na economia brasileira é o IGP-M (Índice Geral de Preços-Mercado), medido pela FGV (Fundação Getúlio Vargas), comumente identificado como a inflação do aluguel. Em 12 meses até setembro, o indicador acumula alta de 24,86%. Em 2020, o IGP-M fechou com o acumulado de 23,14%, e forçou muita negociação entre inquilinos e proprietários para a continuidade de contratos.
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Esses são índices importantes para a compreensão do movimento inflacionário no país. Keyler Rocha, professor aposentado da faculdade de Economia e Administração da USP, explica que o conceito de inflação é a alta generalizada de preços no mercado, seja o do consumo comum, o de capitais, o de crédito, entre outros. Mas ressalta que a medida não fornece um número perfeito. “Ela é formada por uma cesta de produtos variada, ou seja, é um conceito diversificado conforme os critérios e os índices escolhidos.”
O impacto da inflação de dois dígitos
Mas a inflação de dois dígitos reforça muito negativamente a expectativa para o movimento dos preços. “A inflação tem muito a ver com o clima de insegurança. Quando as pessoas acreditam que a inflação vai aumentar, agem em função disso e aumentam os preços”, afirma Rocha. E, diante de uma série de problemas enfrentados pelo Brasil atualmente, as perspectivas de crescimento econômico são colocadas em xeque.
Para Guilherme Cadanhotto, especialista em renda fixa da Spiti, a inflação alta é muito ruim para economia real, porque corrói o valor do dinheiro, e consequentemente diminui a expectativa de atividade econômica. “Os empresários tendem a ter menor recompensa financeira do que teriam por conta da incerteza e enxugam contratação, expansão, investimentos, infraestrutura. Por outro lado, as pessoas de menor renda que não têm acesso a instrumentos financeiros que protejam o dinheiro da inflação, perde seu poder de compra, o que também tira o potencial de consumo da população brasileira.”
Nesse contexto, o Banco Central, maior autoridade monetária do país, tem como principal arma o aumento da taxa básica de juros, a Selic. Segundo o último relatório do BC, a projeção para o IPCA no fim do ano é de 8,45%, enquanto a taxa básica de juros é calculada em 8,25% para o mesmo período, mas está em 6,25% neste mês.
O professor Keyler explica que o aumento na taxa de juros, no entanto, afeta as empresas, com custos maiores refletidos nos produtos. “Esse aumento desestimula a inflação futura, porque desestimula o crescimento econômico, então há uma perspectiva de retração pela frente, devido à alta de juros.”
Em resumo: “as soluções existem, mas elas são dolorosas”, resume o professor. A perspectiva para o próximo ano, porém, é que a inflação caia, se a alta dos juros for bem sucedida. Mas, ao mesmo tempo, isso deve provocar uma redução do crescimento das atividades econômicas.
Cadanhotto conta também que o impacto do aumento na taxa de juros leva de seis a nove meses para ser sentido na economia. “As últimas altas na taxa não buscam reduzir a inflação de 2021. Esta inflação já está dada. O BC tenta combater a alta nos preços de 2022 e 2023.”
É importante ressaltar também que, no próximo ano, haverá eleições. Outras questões são acrescentadas para o desenho dos cenários econômicos. Qual será a equipe econômica dos principais candidatos? Ela estará mais preocupada com a instabilidade fiscal? Ou aceitará uma inflação mais alta para aumentar a atividade econômica? São muitos os fatores que interferem nesse indicador, mas as incertezas em relação ao futuro e a escassez de produtos, historicamente, movem os custos das atividades para cima.
Cenário em que a inflação se dá
O cenário causado pela pandemia do coronavírus no Brasil contribuiu e muito com o fôlego da inflação nos últimos meses. A isso, somou-se a crise político-institucional. Se a alta generalizada nos preços não é exclusividade o país neste momento, aqui ela tem crescido a passos largos, voltando a um patamar visto pela última vez em 2000.
O analista da Spiti explica a situação por meio de quatro fatores. O primeiro é global, mas exige voltar no tempo para 2020, quando fábricas no mundo todo fecharam, quebraram ou reduziram a produção por causa da pandemia.
O consumo médio global caiu porque as pessoas não saíam de casa. No Brasil, por exemplo, ficaram receosas de gastar em meio a dúvidas sobre o futuro e o quadro de desemprego. Segundo o especialista, com a retomada da economia, as pessoas voltaram a consumir. Ao mesmo tempo, varejo e indústria não tinham oferta de produtos suficiente para dar conta da demanda.
O segundo fator mencionado por Cadanhotto é a desvalorização do real frente ao dólar e o consequente impacto nos produtos importados. O economista lembra que, no Brasil, a insegurança era muito grande no início da crise gerada pela pandemia da Covid-19. “Em momentos de aversão ao risco, os investidores tiram o dinheiro de países mais instáveis para realocar em lugares mais seguros, como os EUA e a Europa. Então houve uma desvalorização da moeda ante o dólar, e os produtos importados se tornaram mais caros, porque são pagos em moeda estrangeira.”
Outro fator levantado pelo analista é a quebra de safra, ou redução significativa no resultado de uma colheita, que aumentou os preços dos grãos e, consequentemente, dos alimentos vendidos e consumidos pela população.
Para completar o cenário, o Brasil passa por uma crise hídrica, com o esvaziamento dos reservatórios para a produção de energia hidrelétrica. Há, assim, a busca por outras fontes energéticas mais caras, como as usinas termelétricas, o que reforça a alta do preço da energia.
No mercado internacional, por sua vez, outras questões econômicas têm provocado incerteza, como o caso da incorporadora Evergrande, que possui uma dívida bilionária, ou o aumento dos juros nos Estados Unidos. “A perda da confiança no Brasil e a alta dos juros nos EUA estimulam a ida de dinheiro para lá, ao fazer isso, o real desvaloriza e os preços domésticos aumentam”, explica o economista.
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