As ações de tecnologia de empresas brasileiras acumularam alta de 111,4% ao longo de 2019 e 2020, antes de cair 32,2% em 2021, segundo dados da Teva Indices. Apesar de o setor ser uma fração do encontrado nos Estados Unidos, onde o valor combinado das big techs supera o do mercado europeu como um todo, analistas avaliam que as companhias de tecnologia brasileiras caminham para um nível de relevância cada vez maior.
Apostando nessa tendência, a Teva Indices lançou no mês passado o Índice de Ações Tech Brasil, pioneiro em destacar o desempenho do setor, e que deu origem ao ETF (fundo de índice) TECB11. Nele, estão incluídas empresas sediadas no país e companhias que apresentam parte relevante de seus negócios no país.
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Como explica Gabriel Verea, CEO da Teva Indices, “o mercado de capitais brasileiro é muito concentrado em empresas ligadas a commodities e ao setor bancário. Mas a tecnologia tem ganhado espaço, e foi responsável por mais de uma dezena de ofertas públicas iniciais desde 2019.” Um exemplo desse movimento é a abertura de capital da Locaweb (LWSA3), que movimentou R$ 2,7 bilhões em 2020.
A carteira teórica do índice é composta por 25 empresas locais e BDRs de companhias estrangeiras. Stone, Mercado Livre, PagSeguro e Magazine Luiza apresentam as maiores participações, respondendo por cerca de 20% juntas. O rebalanceamento ocorre trimestralmente e leva em consideração volume de negociação, capitalização de mercado, percentual de ações disponíveis para negociação em bolsa, e governança corporativa da empresa.
Verea afirma que são selecionadas companhias de diferentes áreas do setor de tecnologia, como serviços financeiros; produção e comercialização de software, hardware e equipamentos de tecnologia; e e-commerce. Este último foi um dos segmentos que apresentou melhor desempenho durante a pandemia, e que tem entre seus destaques o Mercado Livre.
Em seu balanço do terceiro trimestre, a companhia informou lucro líquido de US$ 126,1 milhões, demonstrando crescimento de 139,5% na comparação com o mesmo período do ano passado. Já a receita líquida foi de US$ 1,2 bilhão, um aumento de 69%. No início da semana passada, a empresa também fez uma captação de US$ 1,55 bilhão em seu primeiro follow-on em mais de dois anos.
Do início do ano passado até o fechamento da última sexta-feira (19), o BDR do Mercado Livre (MELI34) já havia acumulado alta de 234,12%. A grande valorização das ações de empresas de tecnologia, porém, também acende temores de que uma bolha tenha se formado e esteja prestes a estourar.
Avaliações complexas
Essa visão é corroborada por um levantamento realizado no mês passado pela Bloomberg Línea que incluiu 45 empresas de diferentes setores que abriram capital na B3 em 2021. Das dez empresas que apresentaram as maiores desvalorizações até setembro, considerando o período iniciado com a abertura de capital, sete são “novatas” do setor de tecnologia. É o caso da GetNinjas (NINJ3) e da Mosaico (MOSI3), que apresentaram recuos de 40,77% e 70,25%, respectivamente.
Alexandre Constantini, estrategista-chefe da Catarina Capital, porém, considera que esse movimento é uma correção de excessos: “Bolha, efetivamente, vimos no começo dos anos 2000, na febre das ‘ponto.com’. A diferença do momento atual para aquele pode ser sintetizada em três pontos cruciais: maturidade das empresas, tamanho do mercado e solidez dos modelos de negócio.”
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Segundo o estrategista, o que causa os excessos na precificação das ações de tecnologia é o fato de que essas são empresas que se reinventam e criam rapidamente novas verticais de negócios, gerando dificuldade de antecipar com precisão o valor correto de suas ações.
Sobre a queda acumulada em 2021 de 32,2% das ações das companhias brasileiras de tecnologia, Constantini afirma se tratar de um movimento de realização de lucros. “[Essa dinâmica] ganhou ainda mais intensidade com as expectativas de que, daqui para frente, devemos ver os diversos bancos centrais iniciando um ciclo de aperto monetário, com gradual aumento das taxas de juros e retirada de liquidez dos mercados.”
Ele explica que, em geral, as empresas de tecnologia costumam ser pressionadas por taxas de juros mais altas, uma vez que apresentam elevada dependência de financiamentos, e, muitas vezes, são deficitárias na geração de caixa operacional. Assim, as companhias passam a ser avaliadas com descontos maiores, o que pressiona o valor das ações.
O setor de tecnologia já apresentou grande expressividade no Ibovespa no passado. No fim da década de 1990, com a privatização do Sistema Telebrás, a área chegou a responder por mais de 50% da carteira do índice. Fusões, problemas societários, o superciclo de commodities e o boom imobiliário, junto com aberturas de capital de companhias de outros setores, contribuíram para que o setor se tornasse menos relevante.
“Há muito espaço para boas empresas de tecnologia lançarem ações na Bolsa nos próximos anos. Isso fica evidente pelo apetite de investidores por ativos de venture capital”, diz Constantini. “Certamente, também é fundamental que o cenário macroeconômico inspire confiança e estabilidade, atraindo e retendo investidores globais.”