O ex-CEO da FTX, Sam Bankman-Fried, afirmou em entrevista ao vivo ontem (30) para o The New York Times que o colapso de sua exchange de criptomoedas foi causado por vários erros de sua parte, e não por atividades fraudulentas. A FTX enfrenta alegações de que usou bilhões de dólares indevidamente em fundos de clientes em uma tentativa fracassada de sustentar sua empresa irmã Alameda Research.
Bankman-Fried reconheceu: “claramente não fiz um bom trabalho” como chefe da FTX. Ele disse que havia imensos erros contábeis que ele deveria ter detectado, mas insistiu que “nunca tentou cometer fraude” e ficou “chocado” com o colapso da bolsa no início deste mês.
Ele também negou que os laços da FTX com a Alameda Research eram inapropriados, insistindo que ele “não administrava a Alameda” e “não sabia exatamente o que estava acontecendo”, embora, como co-fundador, tivesse ligação com seus dirigentes. Bankman-Fried disse ter trabalhado como consultor da Alameda “envolvido em investimentos de risco”.
O ex-CEO também disse que “não foi cuidadoso o suficiente” ao avaliar o risco de emprestar para a Alameda, alegando que não percebeu a “perspectiva negativa extrema” da criptomoeda.
Ele disse que a empresa “falhou completamente” tanto no gerenciamento de risco quanto no “risco de conflito de interesses”, acrescentando que a FTX não tinha ninguém encarregado exclusivamente de examinar o risco assumido pelos clientes.
Bankman-Fried afirmou que a empresa estava gastando “uma quantidade enorme de energia em compliance” para obter licenças em diferentes jurisdições, embora o CEO recém-nomeado da FTX, John J. Ray, tenha dito no recente processo de falência que nunca viu em sua carreira “uma falha tão completa dos controles corporativos”.
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Bankman-Fried disse que não tinha uma explicação clara para a transferência suspeita de US$ 515 milhões em fundos da FTX após o pedido de falência, sugerindo que pode ter sido resultado de “acesso impróprio a ativos”.
Quando questionado sobre suas doações políticas, Bankman-Fried afirmou que eram provenientes de “lucros da empresa” e que ele doou a republicanos e democratas, principalmente para o que chamou de “prevenção pandêmica” (no ciclo eleitoral de 2022, Bankman-Fried foi um dos maiores doadores bilionários para campanhas e organizações democratas).
Bankman-Fried fez as declarações ontem em uma entrevista por videoconferência com o jornalista Andrew Ross Sorkin no Dealbook Summit do Times, em sua primeira longa declaração pública desde que a FTX pediu falência no início deste mês.
Ele disse que deu a entrevista contrariando a orientação de seus advogados, afirmando que acredita ter o “dever de explicar o que aconteceu” e não está “focando” em uma possível responsabilidade criminal.
Perto do final da entrevista, Bankman-Fried hesitou quando questionado sobre se ele estava sendo totalmente sincero sobre a FTX, dizendo por fim: “Não sei quantas vezes menti”, embora reconhecesse que às vezes agia como um “comerciante” e se concentrou desproporcionalmente nas vantagens da empresa, e não em suas desvantagens.
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Contradições de Bankman-Fried
Em várias ocasiões, Bankman-Fried insistiu que a FTX.US, sua bolsa de criptomoedas para clientes nos Estados Unidos, permanecia “totalmente solvente” e deveria ser capaz de lidar com saques de clientes, embora a bolsa dos EUA fizesse parte do pedido de falência da FTX.
“Eu estava animado com as perspectivas do FTX apenas um mês atrás”, disse ele.
Bankman-Fried rejeitou os rumores de que festas movidas a drogas dominavam a cultura dos funcionários da FTX, dizendo que reuniões com colegas de trabalho envolviam “convidar pessoas para jantar” e “jogos de tabuleiro”, quase sem bebida e sem uso de drogas ilegais. Ele disse que bebe apenas “talvez meio copo de álcool por ano”, embora nunca tenha sido questionado sobre isso.
O ex-CEO também disse que não tem “quase nada” em riqueza pessoal após o colapso da FTX porque reinvestiu seu dinheiro na empresa e repetiu uma afirmação que fez à Axios de que tudo o que tem agora é uma conta bancária com cerca de US$ 100 mil restantes.
A Forbes estima que a riqueza de Bankman-Fried atingiu um pico de cerca de US$ 26,5 bilhões, quase exclusivamente vinculada à FTX e ao token FTT.
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Contexto
Apenas alguns meses antes do colapso da FTX, Bankman-Fried foi saudado por alguns como líder na vanguarda de uma indústria que buscava revolucionar o mundo das finanças. Ele chefiou a bolsa de criptomoedas FTX, com sede nas Bahamas, que se tornou conhecida por seus acordos de endosso de alto nível que incluíam parcerias com celebridades de primeira linha e atletas superestrelas.
Mas o colapso nos preços das criptomoedas no início deste ano condenaria a FTX e sua empresa irmã, a Alameda Research, que supostamente usou a criptomoeda FTT da exchange como garantia para obter bilhões de dólares em empréstimos para comprar participações em startups.
A Alameda se viu com enormes lacunas de financiamento após o crash das criptomoedas, mas a FTX supostamente optou por resgatar a empresa em dificuldades, emprestando bilhões de dólares em ativos de clientes. Os extensos laços entre as duas empresas tornaram-se de conhecimento público em um relatório da CoinDesk de 2 de novembro, que revelou que grande parte do balanço da Alameda era composto pelo token FTT, que é emitido pela FTX.
As revelações bombásticas – e a decisão da exchange cripto Binance de vender sua posição FTT – alarmaram os clientes que correram para sacar dinheiro, levando a exchange a enfrentar a insolvência e declarar falência em 11 de novembro, e acarretou na renúncia de Bankman-Fried como CEO. John Ray, que foi nomeado CEO para supervisionar o processo de falência, chamou a situação financeira e a falta de controle da FTX de uma das piores que ele já viu em sua carreira. Ray liderou notavelmente a Enron depois que a empresa de energia com sede no Texas declarou falência em 2001.
A FTX está sob investigação do Departamento de Justiça e da SEC (Securities and Exchange Commission), a comissão de valores mobiliários dos EUA, de acordo com vários relatórios. US$ 3,1 bilhões é o quanto a FTX afirma que deve a seus 50 maiores credores, mas acredita-se que haja mais de 1 milhão de credores ao todo.